Experimentação científica e acadêmica com animais sempre foi um assunto polêmico e muito triste para os animais.
Durante muitos anos, as pesquisas que utilizaram experimentos com animais não foram fortemente questionadas. Os progressos da ciência médica foram atribuídos às experimentações com animais, esquecendo que outros fatores sociais e higiênicos tiveram uma influência enorme nas questões ligadas à saúde. Estudos realizados na Europa e Estados Unidos indicam que noventa por cento dos fatores que determinaram a longevidade de uma pessoa devem-se ao estilo de vida, ao meio ambiente e à hereditariedade, e só dez por cento devem-se à assistência médica.
Na verdade os reais impactos da experimentação animal no desenvolvimento da pesquisa médica nunca foram cientificamente avaliados, e um número cada vez mais crescente de cientistas alega que a experimentação em animais tem pouco ou nenhum uso para a pesquisa científica. Por exemplo, Dr. Thomas Hartung, da Universidade John Hopkins – a escola de medicina mais prestigiada do mundo – defende a completa mudança de métodos para os testes no campo da toxicologia para o século XXI.
Ele argumenta que testes em animais são métodos tradicionais que contribuem de maneira muito pouco satisfatória para resultados científicos, mas continuam a ser usados porque são tão difundidos entre os cientistas, que muitos nem o questionam. A comunidade científica tem desenvolvido uma crença coletiva irracional, que acredita que os testes em animais são importantes e úteis, contudo Dr. Hartung argumenta que o papel dos cientistas do século XXI é desafiar esta crença errônea e colocar um fim nos tradicionais testes em animais, em favor de métodos mais éticos e cientificamente mais eficientes.
Grupos de proteção animal e cientistas estão crescentemente unindo forças para impulsionar mudanças políticas e legais para substituição do uso de animais em experimentos científicos e educativos.
A NAVS (Nacional Anti-Vivisection Society) faz campanhas para a completa abolição do uso de animais em experimentos, e junto com Lord Dowding Fund desenvolve intensas pesquisas para substituição animal nos laboratórios, e inúmeros avanços nessa área têm surgido. Animal Defenders International também faz campanhas em nível político, impulsionando mudanças legislativas para colocar um fim em testes em animais em todo o mundo.
A abolição dos testes em animais está dando pequenos, mas significantes passos. Como um exemplo recente, os membros do Parlamento do Reino Unido lançaram uma moção estadual dizendo que “a segurança dos remédios tem que ser estabelecida pelos métodos mais eficientes disponíveis, com o objetivo de reduzir o crescente número de sérias reações adversas causadas por medicamentos; e chama o Governo para iniciar uma comparação entre: os comumente utilizados testes em animais com uma sequência de testes biológicos baseados em humanos, para verificar o que é mais efetivo, predizendo o que é mais seguro sobre os remédios e os pacientes”. Em nível político, contudo, o mais recente e importante desenvolvimento é a nova Diretiva Europeia sobre testes em animais, que está pronta para receber o voto final do Parlamento Europeu em setembro.
A diretiva da União Europeia representa um avanço significativo com relação à proteção dos animais de laboratório. E tem como objetivo final substituir totalmente os procedimentos com animais vivos para fins científicos e educativos. A diretiva procura facilitar e promover o desenvolvimento de métodos substitutivos, com investimentos financeiros oriundos da União Europeia. A diretiva também providencia uma longa lista de padrões de bem-estar e regras para serem aplicadas em toda a Comunidade Europeia.
Pesquisadores, criadores e estabelecimentos terão a obrigação de obter uma licença para usar animais e seus funcionários terão quer submeter-se a treinamento especial para manusear estes animais. Na Comunidade Europeia, os Governos terão que reportar a quantidade de animais utilizados em experimentos em seus territórios, para que a Comissão possa priorizar áreas onde o uso de animais necessita ser reduzido.
O limite de dor e de sofrimento que um animal pode aguentar nestes experimentos também é levantado na diretiva. Esta assegura que os procedimentos que causem dor, sofrimento ou angústias sejam feitos por meio da utilização de anestesia geral ou local e que sejam utilizados analgésicos para reduzir ao máximo o sofrimento desses animais. Os procedimentos que impliquem em lesões graves e possam causar dor severa não podem ser efetuados sem anestesia. E por isso será proibida a realização de procedimentos que causem dores e que não exista possibilidade de serem aliviados.
Padrões de cuidado e acomodação para os animais protegidos por esta Diretiva (incluindo mamíferos, anfíbios, peixes, pássaros, rapteis, etc) terão o mesmo tratamento em toda a Europa. O uso de grandes primatas, espécies em extinção, animais capturados na selva e animais abandonados serão banidos ou muito restritos.
Para que as regras dessa diretiva sejam cumpridas deverão ser feitas inspeções periódicas aos criadores, fornecedores e utilizadores para avaliação do risco e sem aviso prévio, assim promovendo a transparência. Também serão avaliadas essas experimentações no ponto de vista de validade, utilidade e relevância científica ou educativa dos resultados.
É importante não subestimar a importância da nova Diretiva: ela colocará os padrões de proteção de animais de laboratório da União Europeia acima de qualquer outro no mundo. Se isto reduzirá eficientemente o grande número de animais usados anualmente na União Europeia (12 milhões por ano), irá depender da implementação da nova diretiva nos Estados Membros.
Mas infelizmente, esta Diretiva esta sendo construída com base no reconhecimento de que a experimentação animal é uma ferramenta útil, enquanto deveria estar começando do ponto em que a experimentação animal é duvidosa.
E isto se deve ao forte lobby das indústrias farmacêuticas e empresas que vendem animais para experimentação, pois mandam lobistas para atacar o Parlamento Europeu, e assim terem a certeza de que os seus interesses de curto prazo serão protegidos, e que eles continuarão a matar animais com o mínimo de restrições. A problemática é mais intensa com relação à utilização de primatas não humanos.
Todos os primatas não humanos mostram altos níveis de inteligência, comportam-se em comunidade e tem intensas redes e relações sociais com componentes culturais. Macacos Rhesus mostraram ter capacidade de aprender aritmética, pensar usando símbolos e têm mostrado que possuem percepção sobre eles mesmos. Os humanos dividem mais de 90% do DNA com a maioria dos primatas não humanos. Vários primatas não humanos têm expressado emoções como afeição, carinho, empatia, humor, raiva, tristeza, ciúme e cortejo para seu par, muito similar ao dos humanos. Muitas espécies de primatas aprendem por meio da observação do comportamento do outro. Todas essas afirmações são importantes para perceber que esses animais podem ser machucados não apenas fisicamente, mas também mental e emocionalmente. Esses danos podem advir da captura, do transporte ou do isolamento, entre outros fatores.
Apesar das similaridades que possuímos com relação aos primatas não humanos, entretanto, existem inúmeras diferenças com relação ao sistema celular, ao sistema genético e ao imunológico, e essas diferenças são muito importantes quando relacionadas aos resultados desses experimentos. Sabemos que as reações dos primatas não humanos aos produtos químicos e aos remédios são diferentes das nossas, mas mesmo assim sabemos que isso lhes causa sofrimento. Os chimpanzés são muito próximos de nós geneticamente, entretanto, comparações com seus genes e sistema imunológico têm mostrado que esta proximidade genética é insuficiente para nós humanos confiarmos nos resultados dos experimentos com chimpanzés.
Quem garante que o organismo humano irá reagir como o de um chimpanzé, cachorro, gato, camundongo ou coelho? Nenhum cientista do mundo garante isso! Porque nem eles sabem, na verdade, utilizam esses pobres animais envenenando-os e machucando-os diariamente, para no fim do projeto ter uma vaga noção do que aquele produto pode gerar no corpo de um ser vivo, mas nenhuma garantia para o corpo humano especificamente, pois isto só seria possível se fosse testado em um humano e não em um primata ou outro animal que não fosse o homem.
Uma das melhores ilustrações deste fato é o uso de chimpanzés para pesquisas sobre a AIDS nos EUA. Milhões de dólares foram gastos para testar vacinas contra a AIDS, às custas da enorme dor de milhares de chimpanzés. Aproximadamente 40 vacinas foram testadas em humanos sem nenhum resultado positivo.
As autoridades americanas pareceram perceber o seu erro e agora pararam com a criação de chimpanzés nos laboratórios, mas e se estes bilhões tivessem sido gastos com outros métodos científicos de pesquisa?
Outro exemplo muito famoso e que irá demonstrar bem esse fato é o do remédio experimental TGN1412, que foi experimentado em vários macacos e cachorros sem nenhuma notícia de efeitos colaterais negativos. Quando voluntários humanos foram testá-los em um hospital inglês, houve uma reação completamente inesperada e os voluntários quase chegaram a óbito, pois sofreram falência múltipla dos órgãos em poucos segundo após a injeção com a droga TGN1412.
Além de muitos testes em animais serem inúteis e desnecessários, existem estimativas da Associação Médica Americana de que, a cada ano, dois milhões de pessoas contraem doenças, e outras 106 mil morrem devido aos efeitos colaterais de medicamentos, a quarta causa óbito nos Estados Unidos. No Brasil, quinto país do mundo em consumo de medicamentos, a Fundação Oswaldo Cruz estima em 24 mil o número de mortes anuais por intoxicação medicamentosa. Isto mostra que a experimentação animal não é eficaz como os vivisseccionistas querem pregar.
Todavia, os laboratórios e indústrias farmacêuticas fazem uma campanha muito forte para a continuidade desses experimentos escabrosos, fazendo um tipo de chantagem indecente com o público e políticos dizendo que, se os testes não continuarem, muitas descobertas de curas serão paralisadas, como a descoberta da cura do Parkinson e Alzheimer.
Este tipo de apelo é feito ao público pela indústria farmacêutica, que possui imensos recursos para manipular os seus interesses, entretanto, por mais que a indústria farmacêutica seja forte, a opinião pública também é, e ninguém quer mais que este tipo de atrocidade continue acontecendo.
Não devemos nos render a essa chantagem, muitos cientistas são contra o uso de animais para a experimentação e utilizam métodos substitutivos. Portanto é possível desenvolver a ciência e a educação sem esses métodos de tortura contra animais inocentes.
Outra questão importante e cruel é que existe uma estimativa de que 10% dos primatas utilizados em laboratório na Europa ainda são capturados na selva, o que representa um sofrimento muito maior, pois animais de cativeiro já nasceram em quatro paredes, macacos selvagens não. Na Europa a maioria dos macacos usados nos laboratórios é importada da China, da Filipinas, do Vietnã, da Indonésia, do Quênia, de Israel e da Guiana. Os macacos viajam por longas jornadas em pequenas caixas, isolados e amedrontados. Mais de 10 mil primatas morrerão em laboratórios europeus todos os anos.
Por todo o exposto, percebe-se claramente que o caminho que a humanidade tem que escolher é a pesquisa sem animal, com incentivos e investimentos para pesquisas substitutivas, métodos que são muito mais civilizados, sofisticados e éticos.
Legislação Brasileira
O Brasil tem acompanhado os países de Primeiro Mundo no que se refere à problemática jurídico-normativa da experimentação animal. Entretanto, a legislação sobre a questão ainda é incipiente. A lei no Brasil é vaga e incompleta, e existem poucos questionamentos nos Tribunais a respeito da prática da vivissecção, o que permitiu que os vivisseccionistas continuassem a exercer sua profissão livremente, e sem obedecê-la. Por esse motivo, pode-se dizer que, mesmo que a intenção do legislador tenha sido a de melhorar a situação dos animais, contudo, tal objetivo jamais foi alcançado.
O problema é que as leis que regulamentam a atividade vivisseccionista, tanto no Brasil como no exterior, apoiam-se nos “3 R’s” (do inglês replacement, reduction e refinement, isto é, substituição, redução e refinamento) e têm como objetivo substituir por outros métodos sempre que existentes, reduzir o uso de animais e melhorar as técnicas vivisseccionistas para causar o menor sofrimento possível, e, dessa forma, determinam que todos os projetos de pesquisa envolvendo uso de animais de laboratório devem estar sujeitos a revisão para se determinar se sua proposta é ética e cientificamente justificada e, caso não o seja, a proposta deve ser rejeitada pelas comissões de ética.
Infelizmente, a função de tais comissões acaba se tornando, principalmente no Brasil, a de fornecer o aval necessário para que os cientistas publiquem seus trabalhos em periódicos que exijam aprovação, sendo que este fornecimento ocorre seja qual for o refinamento de técnica empregado na pesquisa.
A Lei 11.794 foi sancionada no dia 8 de outubro de 2008, regulamentando a vivissecção científica no Brasil. Esta lei é repleta de absurdos e desacordos éticos e fracassa totalmente na tentativa de, verdadeira ou não, assegurar algum tipo de bem-estar aos animais aprisionados nos biotérios e explorados nos laboratórios.
Infelizmente o Brasil vai totalmente contra a tendência mundial de se tentar extinguir esta prática cruel e desnecessária, dando total respaldo aos cientistas que querem continuar este tipo de ferramenta primitiva. Mas é claro que mais uma vez o Brasil servirá de palco para as grandes multinacionais que querem explorar nossos recursos, nossos animais.
Enquanto o cerco aperta na Europa, as milionárias empresas farmacêuticas, que lá possuem poder acima dos grandes bancos, já procuram países em desenvolvimento como a China, a Índia e o Brasil para continuar seu show de horror, espetando fios e aplicando ácidos mortais em animais vivos. Porque é muito mais simples economizar o dinheiro que seria investido no desenvolvimento de experiências biológicas substitutivas e livres de crueldade. Pois, afinal, em curto tempo é mais econômico explorar, ferir e matar do que seguir uma ciência ética.
E no Brasil existem leis que combatem os maus-tratos com os animais. A Lei nº 9.605 de 1998 (Lei dos Crimes Ambientais) traz como crime a experimentação animal, quando existirem recursos substitutivos.
O que também não foi respeitado com a vigência desta lei foram não apenas os pobres animais de laboratório, mas todas as pessoas no Brasil que não concordam com a experimentação animal. O Congresso Nacional não levou em conta um abaixo-assinado com 23 mil assinaturas. Este abaixo-assinado foi totalmente ignorado, e nenhum parlamentar se ofereceu para defender a vontade popular, e a aprovação da lei foi unânime no Senado.
Essa lei não protege de maneira nenhuma esses animais, e o mais estranho é que nela eles reconhecem que os animais podem sentir dor, mas, quando estão defendendo o direito de explorar indiscriminadamente esses animais, ignoram essa capacidade senciente, inerente a todos os seres vivos.
Outra questão de difícil entendimento é ver o Ministério da Ciência e Tecnologia participante do conselho que visa fiscalizar essa nova regulamentação. Esse Ministério deferia estar envolvido diretamente na busca incansável de métodos substitutivos e focado com a substituição destes sempre que possível, e não estar envolvido na fiscalização deste show de horrores.
É uma pena, pois animais inocentes aqui no Brasil ainda vão passar várias décadas sendo perfurados, envenenados, dissecados, aprisionados por uma ciência retrógrada que se nega a evoluir e questionar as tão antiquadas e cruéis práticas vivisseccionistas.