Essa análise é especialmente preocupante neste momento em que a humanidade se prepara para um novo El Niño, que deve se confirmar ainda este ano e apresenta chances de ser do tipo intenso.
A chegada de um El Niño intenso em um mundo já bastante aquecido aumenta o risco de que o planeta passe do aquecimento de 1,5°C, que é a meta de segurança do Acordo de Paris, ainda que temporariamente já nos próximos anos.
O novo estudo foi publicado na revista Nature Ecology & Evolution. Pesquisadores de quatro universidades participaram da análise: UCL, do Reino Unido; Universidade da Cidade do Cabo, da África do Sul; Universidade de Connecticut e Universidade de Buffalo, ambas dos EUA. O estudo teve o apoio ainda da NASA, da Royal Society, da Academia Africana de Ciências, do Natural Environment Research Council e da National Science Foundation, dos Estados Unidos.
Os autores analisaram dados de cerca de 35.000 espécie de animais (incluindo mamíferos, anfíbios, répteis, aves, corais, peixes, baleias e plâncton) e ervas marinhas de todos os continentes e bacias oceânicas, no contexto de quatro projeções climáticas futuras diferentes. A equipe constatou que, uma vez ultrapassado o limite de exposição térmica, pode haver uma perda abrupta de habitat para diferentes espécies devido às futuras mudanças climáticas. E uma tendência consistente para muitos animais é que o limite de exposição térmica será ultrapassado em grande parte de sua área geográfica ao mesmo tempo.
Isso é particularmente preocupante, pois o relatório de síntese do IPCC (publicado em março de 2023) constatou que as políticas atuais colocam o mundo no rumo do aquecimento global de 3,2 °C até 2100.
O autor principal da pesquisa, Alex Pigot, professor do Centro de Biodiversidade e Pesquisa Ambiental da UCL, explica que para muitos animais, é provável que grandes extensões de sua área geográfica se tornem estranhamente quentes em um curto espaço de tempo.
“Nossas descobertas sugerem que, uma vez que começamos a perceber que uma espécie está sofrendo sob condições desconhecidas, pode haver muito pouco tempo até que a maior parte de sua área de distribuição se torne inóspita, por isso é importante identificarmos antecipadamente quais espécies podem estar em risco nas próximas décadas.”
Pigot acrescentou: “Nosso estudo é mais um exemplo de por que precisamos reduzir urgentemente as emissões de carbono para mitigar os efeitos nocivos que a mudança climática está tendo sobre animais e plantas e evitar uma crise de extinção em massa”.
O coautor do estudo Christopher Trisos, pesquisador da Iniciativa Africana de Clima e Desenvolvimento da Universidade da Cidade do Cabo, destacou as consequências desastrosas de deixar a mudança climática continuar sem controle.
“No passado, tínhamos fotos instantâneas para mostrar o impacto da mudança climática, mas aqui estamos apresentando os dados mais como um filme, em que é possível ver as mudanças se desdobrarem ao longo do tempo. Isso mostra que, para muitas espécies, o risco é mais parecido com tudo, em todos os lugares, de uma só vez. Ao mostrar esse processo em movimento, esperamos ajudar a direcionar os esforços de conservação antes que seja tarde demais.”
Os pesquisadores explicam que esse padrão de exposição abrupta pode ser uma característica inevitável da vida em um planeta redondo. Devido ao formato da Terra, há mais área disponível para as espécies em ambientes próximos ao extremo quente do que estão acostumadas, como em áreas tropicais ou próximas ao equador.
Um estudo anterior realizado pelos mesmos autores constatou que, mesmo se interrompermos a mudança climática para que as temperaturas globais atinjam o pico e comecem a diminuir, os riscos para a biodiversidade poderão persistir por décadas depois do aquecimento excessivo.
E em outra análise semelhante ao estudo atual, cientistas constataram que muitas espécies que enfrentam temperaturas desconhecidas viverão ao lado de outros animais que sofrem choques de temperatura semelhantes, o que pode representar graves riscos para a função de ecossistemas locais.
Os pesquisadores esperam que seu estudo possa ajudar a direcionar os esforços de conservação, já que seus dados fornecem um sistema de alerta antecipado que mostra quando e onde determinados animais provavelmente estarão em risco.
Fonte: Clima Tempo