Quando nós entramos no mundo dos chimpanzés há mais de uma década, nos deparamos com um sistema complexo no qual zoológicos e circos se confundiam e os primatas iam de um lugar para outro, ignorando seus sentimentos e as relações familiares entre eles.
Os circos usavam – e falamos “usavam” porque conseguimos, depois de dez anos, erradicar esta prática tirando todos os chimpanzés dos circos brasileiros – os bebês chimpanzés até os 6-7 anos de idade, quando ainda são “controláveis”. Alguns prolongavam seu uso, castrando-os, arrancando os dentes e submetendo-os pelo medo com violência. Após essa idade os cediam aos zoológicos, com um contrato de empréstimo, que era renovado continuamente. Nestes contratos havia uma cláusula que indicava que os bebês que por ventura nascessem, de um pai ou uma mãe emprestada, pertenceriam ao circo, o primeiro, e ao zoológico, o segundo, e assim repetidamente. Desta forma, o circo assegurava o fornecimento de bebês, que poderiam usar por vários anos, até que eles atingissem a idade adulta e fossem emprestados a algum outro zoológico.
Muitos zoológicos não se interessavam pelos bebês e os vendiam para os circos que emprestaram o reprodutor, para outros circos ou para comerciantes de animais que tivessem interesse. Os bebês eram tirados das mães recém-nascidos e criados por humanos já no circo de destino ou no cliente comprador. Conhecemos vários zoológicos que negociaram mais de meia dúzia de bebês chimpanzés desta forma. E tudo ilegalmente, já que o nascimento não era registrado ou era registrado como um bebê morto.
Infelizmente esta prática espúria entre circos, zoológicos e comerciantes de animais não era um privilégio brasileiro; existia em todos os países do mundo, especialmente naqueles mais desenvolvidos, onde havia muita gente disposta a pagar milhares de dólares por um bebê chimpanzé.
Outra prática comum dos zoológicos é o intercâmbio de animais entre eles, inclusive internacionalmente. Na Comunidade Europeia, por exemplo, a Associação de Zoológicos tem comitê de espécies, como por exemplo de gorilas, de chimpanzés, de girafas, de elefantes etc. A função desses comitês é garantir que os zoológicos não careçam de quaisquer espécie; se na Holanda morre um chimpanzé e Portugal tem vários, por exemplo, um é enviado para substituir o falecido. Isso significa que um bebê, ou um adolescente, é arrancado de seu núcleo familiar e enviado para integrar um grupo desconhecido.
Esta prática também é comum nos Estados Unidos. As relações familiares são destruídas diariamente para satisfazer as necessidades de exibições e divertimento das populações humanas que visitam os empreendimentos que se apresentam para o público como “centros de educação”, “protetores da biodiversidade”, “conservadores de espécies ameaçadas em extinção”. Quando são na verdade meros centros de divertimento humano, em que os animais são um objeto substituível e acessório.
Dias atrás em nosso Santuário de Sorocaba, uma chimpanzé de 50 anos de idade faleceu. Ela chegou para nós da Bolívia, de um zoológico em ruínas e ameaçada de ser eutanasiada pelo governo local, já que não havia recursos para alimentá-la e cuidá-la. A chimpanzé, de nome Quennie, e sua companheira, Francis, que ainda está conosco, foram capturadas ainda bebês na África e enviadas a um comerciante de animais de Miami que já tinha uma encomenda de um zoológico. Aqueles que dizem proteger espécies ameaçadas de extinção encomendam a caçadores e traficantes essas mesmas espécies, para arrancá-las de sua família e enriquecer sua coleção de animais e divertir o público. Quennie teve 3 filhos e Francis 7, e todos lhes foram tirados aos poucos meses de nascimento e enviados a outros zoológicos norte-americanos. O prêmio dado a elas, por terem sido tão prolíferas, quando já tinham mais de 40 anos de idade foi colocá-las em um avião de carga e enviá-las ao fim do mundo, em um zoológico em ruínas na Bolívia.
Os zoológicos como entretenimento da população devem terminar e suas instalações devem ser convertidas em Centros de Conservação de Espécies Ameaçadas, para encaminhar animais que hoje não têm destino apropriado. O governo em nosso país, como em todos os países do mundo, não tem centros próprios especializados para dar um destino decente e correto, que se assemelhe ao hábitat natural dos animais que são arrancados, pelas nossas próprias ações ou pela falta delas, de seu verdadeiro e natural espaço neste planeta, que é de todos nós, incluindo eles.