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Por que a esquerda libertária precisa abraçar os Direitos Animais (Parte 3 de 3)

3 de julho de 2013
6 min. de leitura
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Aqui seguem as últimas das 13 razões que fazem do abolicionismo animal uma bandeira a ser segurada pela esquerda política.

 

10. Os DA são anticonservadores, no sentido de rejeitar a conservação ou o retrocesso do status quo

Como exposto no item anterior, a esquerda vive em permanente conflito com a direita. Quando embandeirada próxima da completude, é anticonservadora por excelência, no que tange a rejeitar a conservação ou o retrocesso dos valores morais que regem a sociedade.

Tópicos do pensamento conservador, como a perpetuação das mesmas normas morais, a demonização da homoafetividade, a aversão a atitudes de liberação sexual, a restrição da vida da mulher ao espaço doméstico, a oposição incondicional ao aborto, a subvalorização dos Direitos Humanos, a oposição à “desordem” mesmo quando esta significa mobilizações sociais legitimamente democráticas etc., são pensados de maneira exatamente oposta no caso de grande parte da esquerda.

Esta pretende, respectivamente, fazer a normatividade moral se adaptar a cada época; defender e reconhecer a dignidade do amor e da conjugação homoafetivos; a liberdade sexual; a libertação feminina em todos os espaços públicos e privados; a liberação do aborto, ainda que geralmente condicionada à idade do embrião; a sacralidade dos DH e o valor democrático dos protestos de rua.

Da mesma maneira, o abolicionismo aparece opondo-se ao pensamento conservador do especismo. Enquanto o último pensa que os animais não humanos não merecem ter seus direitos equiparados aos humanos e estes são livres para explorá-los como quiser, o primeiro defende que os animais, humanos e não humanos, merecem sim ter seus direitos nivelados por cima e que as pessoas não têm qualquer prerrogativa para explorar os outros animais.

Os DA, assim como a esquerda política, rejeitam a conservação da ordem vigente, baseada em hierarquização moral, exploração, opressão, discriminação e violência, e reagem com força a toda e qualquer tentativa de retroceder a legislação de proteção animal e anular os seus avanços.

 

11. Os DA são radicais ao exigir a mudança do atual estado de coisas

Assim como a esquerda distante do centro do espectro político, o abolicionismo é radical em sua demanda por uma realidade modificada em promoção da justiça, da igualdade e do reconhecimento universal da dignidade de todos os seres sencientes. Não admite meio termo entre a libertação animal e a manutenção da escravidão dos animais, assim como a esquerda convicta, distinta da centro-esquerda, não admite o reformismo como meio de tornar a sociedade mais justa e igualitária, defendendo a revolução como meio de derrubar o sistema opressor. É de se ressaltar, inclusive, que a libertação animal é ela própria uma revolução na relação entre os seres humanos e os demais animais, assim como na interação da humanidade com a Natureza não humana.

 

12. Os DA se fundamentam pela ética evoluinte, ao contrário do conservadorismo, que se escora numa moral estacionária

DA e esquerda compartilham do pensamento de que a moral, junto com a cultura, muda com o tempo, de acordo com a assimilação de novos valores e o abandono daqueles que se tornam obsoletos. Opõem-se assim à crença conservadora de que a sociedade precisa manter ad aeternum os mesmos valores e normas morais para não desmoronar numa situação de caos.

Partilham também a convicção de que o ser humano precisa se guiar por princípios éticos que podem evoluir e se adaptar às mudanças sociais, e não por um conjunto de valores morais estanques que tenta reprimi-las.

O abolicionismo se arvora nesses princípios para introduzir, baseado numa ética supra-humanista, o valor do respeito incondicional aos animais e a norma cultural, dela derivada, do não consumo de produtos, alimentícios ou não, de origem animal e/ou fabricados por empresas que os testam em animais. Passa-os por cima de moralidades e costumes milenares como o especismo, o utilitarismo das intenções humanas para com os demais animais e o consumo de produtos extraídos dos seus corpos.

Se os DA fossem conservadores, não seriam abolicionistas, e sim bem-estaristas. Defenderiam a conservação perpétua da submissão da humanidade à moral antropocêntrica, e não a regência dela por uma ética supra-humanista. Pregariam não a abolição da escravidão animal, mas sim a mera reforma da pecuária para substituir métodos obviamente cruéis por meios mais “bonzinhos” e sutis de explorar os animais, de modo a conservar o costume do consumo despreocupado de produtos não veganos.

 

13. Os DA pretendem mudar o mundo, trazendo no lugar da cultura de violência e desigualdadeuma nova pautada pela paz, pela alteridade e pela igualdade de direitos

A esquerda libertária contemporânea tem a pretensão de transformar a atual cultura baseada na violência, no individualismo egoísta e no controle disciplinar pela lei numa pautada no pacifismo, na solidariedade e na alteridade e autossuficientemente orientada pela consciência ética. Todos esses valores ideais também são defendidos pelo abolicionismo.

Essa cultura ideal, defendida por vertentes como as anarcopacifistas, passa inexoravelmente pela pacificação das relações unilaterais dos seres humanos com os demais animais, da mesma forma que tem como prerrequisito a abolição das hierarquias morais que justificam violências e opressões. Não faria sentido, nem teria qualquer coerência, uma sociedade que fosse pura paz entre seres humanos mas tratasse com a mesma violência e escravidão de hoje outros seres que são tão sencientes e desejosos de vida e integridade física quanto eles.

 

Considerações finais

A variedade de pontos que o abolicionismo animal compartilha com a esquerda política e suas causas contemporâneas, assim como a forte consistência desse compartilhamento, o torna, em todos os sentidos, uma bandeira esquerdista. Porém hoje ainda há muito preconceito e resistência da parte dos militantes não veganos dessa região do espectro político em relação aos Direitos Animais e às mudanças de hábito que eles implicam.

Muitos ainda seguem cegamente crenças como que “defender os animais não humanos implica deixar de lado os humanos”, “o veganismo é uma práxis reacionária e anti-humanista”, “defender os animais é tão absurdo e inviável quanto defender direitos para plantas e micróbios”, entre outras.

Cometem assim os mesmos equívocos de diversos iluministas do século 18, que defendiam liberdade e dignidade máxima para “os homens” – com uma alegada, mas falsa, neutralidade de gênero na palavra “homem” – enquanto negligenciavam a situação das mulheres e a urgência da necessidade delas de terem seus direitos equiparados aos deles.

Também incidem num erro parecido com o de muitos socialistas do século 19, que, ao mesmo tempo em que pregavam a revolução socialista nas sociedades modernas, acreditavam no evolucionismo cultural, que considerava “bárbaros” e “atrasados” os povos ditos “primitivos” e defendia sua “evolução” à “civilização”, não lhes reconhecendo os direitos à identidade cultural e à integridade étnica.

Convém, portanto, estender aos eventos que visam a remodelação e fortalecimento da esquerda brasileira e internacional o debate sobre em que realmente consistem os Direitos Animais, seus princípios e suas práticas. Vencendo-se os preconceitos sobre o abolicionismo,  veremos esse ideário ser finalmente reconhecido como aquilo que é em toda a sua essência: uma causa libertária que precisa ser assimilada por todos os movimentos de esquerda.

 

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