Pela primeira vez no mundo, pererecas comedoras de frutos, Xenohyla truntaca, foram flagradas se alimentando de flores e até do pólen de bromélias no Brasil. O flagrante inédito aponta uma interação nunca antes vista entre anfíbios e flores.
O registro inédito foi feito pelo biólogo e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) Henrique Cardoso. O feito foi publicado na revista científica internacional Elsevier.
🐸🌺O que a descoberta inédita aponta?
Por se alimentar na maior parte das vezes de vegetais, as espécies de pererecas comedoras de frutos, como são popularmente chamadas, também podem ser nomeadas de “pererecas veganas”, como comenta o pesquisador Henrique Nogueira.
O flagrante inédito mostra uma interação nunca vista antes: a de anfíbios com flores. Até então, a alimentação das “pererecas veganas” se davam pelos frutos, o que pode apontar uma mudança com a nova descoberta.
O especialista em biologia animal explica que a importância da descoberta se dá no possível potencial polinizador da espécie que está ameaçada de extinção.
“A descoberta é uma nova possibilidade de interação entre anfíbios e plantas. Abre margem para uma espécie ameaçada ser uma única espécie de anfíbio polinizadora. Essa possibilidade por si só é surpreendente. A ‘perereca vegana’ é um animal que talvez carregue uma interação única entre anfíbios e flores. Se o animal desaparecer, talvez podemos perder esta interação ecológica”, destaca o pesquisador.
Essa rã, até então, era conhecida como a única espécie de anfíbio que se alimenta com frutas.
“Antes desse trabalho, muitas pessoas acreditavam que essa alimentação de frutas era para complementar a dieta ou ao acaso. As observações da equipe identificaram que esse animal vai atrás dessas frutas também, ele não só come as frutas. O animal procura o néctar que está nas flores também. E quando entra nessas flores, o pólen entra na pele da Xenohyla”, comenta o orientador de Henrique, o professor Diego Santana.
🐸🏝️Em que local a ‘perereca vegana’ foi encontrada?
A espécie de “perereca vegana” ocorre em áreas de restinga, que são locais litorâneos com bastante presença de sal e areia no solo. As rãs comedoras de frutos foram flagradas no litoral do Rio de Janeiro.
Henrique relembra que a ida a campo foi despretensiosa. O especialista sabia que poderia ter a possibilidade de ver a espécie, mas não de forma tão diferenciada. O biólogo flagrou cerca de 10 rãs em uma verdadeira disputa pelas bromélias na região litoral do Rio de Janeiro.
“Foi uma sensação indescritível. Primeiro por ver um bicho ameaçado de extinção, depois por realmente ver os animais. Ver a rã desempenhando o movimento alimentar e, isso ser uma coisa nova, foi um cenário inimaginável. Consegui ver as rãs com o pólen por todo a estrutura. Os animais disputavam a entrada das flores, foi fantástico. Todas as rãs demostravam o movimento de subir na árvore, se alimentar das flores e disputar pela entrada. Os animais saiam com grânulos de pólen”, relembra Henrique.
🐸🛣️Quais caminhos são após a descoberta inédita?
A descoberta da “perereca vegana” mostra a importância da preservação ecológica da área onde foi encontrada, como Henrique pondera.
Já que o animal apresenta potencial polinizador, a espécie pode ser classificada como agente para polinização e dispersão de sementes na área de restinga do litoral do Rio de Janeiro. “Essa descoberta mostra a importância da preservação desta área. Toda história de vida dessa espécie está ligada a restinga. Tem muita fragmentação de vegetação nesta área de restinga, o que mostra a importância de preservação da espécie e da região”.
Diante das observações e do avanço do aquecimento global, os pesquisadores apontaram possíveis causas para o declínio da “perereca vegana”. “É ainda mais importante preservar a população Xenohyla, pois o papel ecológico da espécie é único e distinto de todos os outros anfíbios vivos, perder a espécie de perereca também implicaria a extinção de um anfíbio único interação vegetal”, conclui o artigo.
Além de pesquisadores da UFMS, cientistas da Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e das Universidades Federais do Paraná e Rio de Janeiro (UFPR e UFRJ) assinaram o registro inédito.
Fonte: G1