Frequentemente digo que não me importo em ver uma pessoa comendo carne na minha frente, mas só faço isso para evitar constrangimentos à mesa.
Como adoro o veganismo tanto quanto uma boa conversa e, na grande da maioria das vezes, estou circundada de onívoros, prefiro engolir tomates a ter que incorporar a Dona Chata do Contra ou o Seu Estraga Prazer da Silva. Por mais que minha opção alimentar seja louvável, ninguém quer ser criticado pelo bifão.
Uma boa tática é não olhar em direção à pessoa ou ao seu prato enquanto ela se lambuza com qualquer carne – do bife ao coração de galinha e a todos os pedaços no meio disso aí. Ainda que eu finja indiferença, é difícil não pensar no que aconteceu até aquela carne chegar à mesa.
É verdade que, com exceção de algumas crianças desorientadas, ninguém é totalmente ingênuo a ponto de achar que a “carninha” vem da geladeira do supermercado. Todo mundo sabe o que acontece com bois, vacas, galinhas e porcos, mas, como eu (ainda) tenho fé na humanidade, prefiro pensar que o que falta pra esse pessoal do Ocidente começar a reduzir o consumo de carne é informação independente.
Não é possível que somente um grupo pequeno de pessoas se sinta profundamente indignado com aindústria da carne a ponto de deixar de financiar esse mercado de horrores.
Uma boa fonte de informações cruas e de peso são os vídeos com imagens do funcionamento dos abatedouros, que, pessoalmente, me deixam nauseada. Ou então os livros.
Esse fim de semana comprei um, recém-lançado na Itália, chamado Os senhores da comida – Viagem na indústria alimentar que está destruindo o planeta (I signori del cibo, sem tradução para o português). Bastaram poucas páginas para que eu me indignasse (de novo) com os bastidores da produção de carne.
Muito pragmático na sua narrativa, o jornalista investigativo Stefano Liberti detalha a fileira de produção de quatro produtos: a carne de porco, a soja, o atum de lata e o tomate concentrado. Em uma passagem, o escritor, que não é vegetariano, descreve a morte de porcos dentro de um abatedouro industrial:
O animal é primeiro aturdido mediante gás ou uma descarga elétrica, depois, recebe um corte na altura da jugular e então é imerso em um tanque de água fervente, para limpar o sangue. O corpo sem vida é esfolado, ulteriormente lavado e colocado em uma máquina especial. A cabeça é definitivamente cortada e o grande corpo, pendurado em um gancho que o manda para a fase sucessiva (onde todas as partes do seu corpo serão separadas).
Essas passagens são padronizadas, realizadas por homens que repetem gestos sempre iguais: um atordoa o animal, o outro corta a jugular, outro aciona a correia transportadora que mergulha o animal na água fervente. Mas o momento da morte não consegue ser asséptico: frequentemente o animal se agita e se revolta contra seu destino – às vezes, ele não é suficientemente atordoado pelo gás ou não morre com o corte na jugular e grita de dor quando é cozido vivo no grande tanque. Não é permitido assistir a essas cenas. O futuro consumidor não deve ver, porque ele não deve associar aquilo que tem no prato com a dor de um animal senciente.