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O porquê de ser vegetariano

25 de junho de 2013
6 min. de leitura
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As dietas vegetarianas, que atendem às necessidades nutricionais de cada indivíduo, são adotadas em todos os ciclos da vida sem risco à saúde. O médico Eric Slywitch é mestre em Nutrição, especialista em Nutrologia e diretor do Departamento de Medicina da Sociedade Vegetariana Brasileira. Ele destaca que, segundo o Ibope, o vegetarianismo representa 8% da população brasileira. Leia abaixo entrevista com Slywitch:

É possível substituir os nutrientes presentes na carne com outros alimentos?

Sim, facilmente. Não há nenhum único nutriente que seja exclusivamente encontrado na carne. As leguminosas são o grupo alimentar que faz a substituição das carnes, especialmente com relação aos aminoácidos, ferro e demais minerais. Como leguminosas entendemos que são os feijões, mas também as ervilhas, lentilhas e grão-de-bico.

É disseminada a deficiência de vitamina B12 em função da ausência de carne na dieta. Há alimentos completos para a ingestão dessa vitamina?

As fontes de vitamina B12 são carnes, ovos, leite e laticínios. Assim, quando uma pessoa retira a carne da dieta, ele tem opções de consumo de alimentos ricos em B12. O problema desse nutriente é o fato de ele depender mais do nosso metabolismo do que da nossa ingestão, pois ele é reciclado diariamente no intestino. No Brasil, cerca de 50% das pessoas que comem carne têm níveis inadequados dessa vitamina, o que mostra que o consumo de carne não assegura seus bons níveis corporais.

E quanto a maior biodisponibilidade do ferro de origem animal diante do ferro de origem vegetal? Existem danos à saúde?

Nenhum dano por uma questão matemática simples. O Ministério da Saúde preconiza, para uma dieta onívora saudável (com carnes e demais alimentos), o consumo máximo de 100g de carne por dia. Se utilizarmos um corte rico, como o filé mignon, teremos, nessa quantidade de carne, 1,9mg de ferro e absorveremos 18% desse ferro. Assim, com o consumo máximo de carne preconizado, teremos absorvido 0,34mg de ferro. Se trocarmos as carnes pelos feijões, em mesma quantidade calórica (100g de carne = 7 colheres de sopa de feijões) estaremos ingerindo 4,2mg de ferro e absorveremos 10% dele (uma porcentagem menor do que a encontrada na carne). Dessa forma, absorveremos 0,42 mg de ferro, o que é um teor maior do que o obtido pelo consumo de carne. A menor biodisponibilidade de ferro dos feijões é compensada pelo maior teor desse mineral no grão. A prevalência de deficiência de ferro é igual a todas as pessoas que comem carne.

Há riscos no caso dos vegetarianos veganos cuja dieta não inclui carnes, ovos, leite e derivados?

A dieta vegetariana estrita é a melhor já feita para o controle da glicemia e diabetes, conforme demonstram vários estudos. É saudável e pode ser utilizada por gestantes, crianças, adultos, idosos e atletas, conforme endossado pelo CRN3. Veja o parecer final, que ressalta: “As dietas vegetarianas, quando atendem às necessidades nutricionais individuais, podem promover o crescimento, desenvolvimento e manutenção adequados e podem ser adotadas em qualquer ciclo da vida. A adequação nutricional da dieta vegetariana estrita (vegana) exige planejamento e orientação alimentar dos indivíduos, visando a promoção da saúde, respeitando as individualidades e opções pessoais quanto ao tipo de dieta. Aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais da relação entre o indivíduo e os alimentos devem sempre ser considerados no processo da atenção dietética”. Além disso, os estudos mostram que não há prejuízos devido à ausência de alimentos de origem animal. Pelo contrário, doenças crônicas não transmissíveis são prevenidas com uma dieta vegetariana estrita.

O vegano pode adquirir todos esses nutrientes por meio de outros alimentos?

Sim, com exceção da vitamina B12, já que a dieta vegetariana estrita exclui ovos e laticínios.

Como organizar a dieta?

É interessante que a pessoa que come ou não carne tenha um cardápio planejado. Isso inclui os grupos alimentares: cereais (arroz, milho, trigo, massas, pães); ricos em proteína, como as leguminosas de qualquer tipo, incluindo ervilha, grão-de-bico e lentilha (os onívoros usam a carne como o principal representante desse grupo alimentar); hortaliças (verduras e legumes); e frutas. Tudo facilmente encontrado no supermercado.

Há quem afirme que o ser humano é o único mamífero que continua bebendo leite, fator prejudicial à saúde. Afinal, o consumo de leite é recomendado?

O leite pode ser nocivo para as pessoas com intolerância à lactose (isso ocorre com cerca de 70% da população mundial), alergia à proteína e às pessoas que não devem ingerir gordura saturada em excesso. Isso leva à necessidade de avaliar com muita cautela o seu consumo, pois muitas pessoas podem ter problemas com ele.

É dito que injetam nitrato para conservar o aspecto vermelho da carne, fator consequente da causa de câncer. Isso é correto afirmar?

A conservação das carnes com nitrato, em contato com outra substância largamente encontrada nos alimentos (as aminas) forma no estômago nitrosaminas, que são potentes agentes carcinogênicos (os quais, por sua vez, podem estimular o desenvolvimento do câncer), especialmente do trato digestório. A vitamina C ingerida junto à refeição à base de carne ajuda a minimizar esse risco, pois inibe a formação das nitrosaminas.

Quem não come carne corre menos risco de sofrer de doenças do coração, desenvolver câncer e enfrentar problemas como obesidade, diabetes, hipertensão, além de estar livre de outras doenças relacionadas ao consumo de carne, como a doença da vaca louca e gripe aviária?

Todas essas doenças crônicas não transmissíveis (do coração, obesidade, diabetes e hipertensão) afetam em menor prevalência os indivíduos vegetarianos, mas isso não os torna imunes a elas.

Então é possível viver de forma saudável com uma dieta vegetariana?

Tendo os vegetarianos menor prevalência de todas as doenças crônicas não-transmissíveis, prevalência de anemia similar aos que comem carne e excelente ingestão de todos os aminoácidos essenciais, eu diria que é mais possível ser saudável seguindo uma dieta vegetariana do que uma com carne na quantidade que as pessoas habitualmente comem. Pergunto, já sabendo da resposta negativa: é possível viver de forma saudável com uma dieta com muita carne?

Ainda há uma ausência de profissionais especializados em dietas vegetarianas em alguns estados do País. A que fatores se deve isso?

Felizmente, isso está sendo corrigido. Lentamente, mas observamos mudanças. A formação profissional em muitas escolas traz um protocolo onde todos devem seguir uma quantidade de grupos alimentares que, por ignorância, não pode ser retirada a carne e demais alimentos de origem animal do cardápio. Com esse protocolo, tudo o que é diferente gera receio ao profissional de saúde. Além disso, algumas escolas ensinam que a proteína da carne é insubstituível, o que é um mito, pois as tabelas nutricionais (que infelizmente não temos em português) mostram que os vegetais contêm todos os aminoácidos essenciais em abundância. Em muitos cursos não são mostrados cálculos como o que fiz sobre ferro, por exemplo. Felizmente as novas gerações de profissionais, e muitos já antigos e estudiosos, têm conceitos mais atualizados. Isso torna cada vez mais possível entender o vegetariano que, segundo dados do Ibope, agrega cerca de 8% da população brasileira.

Menos diabetes, cardiopatias e obesidade

Conforme a socióloga Marly Winckler, presidente da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) e da União Vegetariana Internacional (IVU), a carne em geral (magra e vermelha) é dispensável na nossa alimentação e sua ausência gera benefícios à saúde.

“Entre outros benefícios, os vegetarianos têm 31% a menos de cardiopatias, 50% menos diabetes, vários tipos de cânceres a menos (54% a menos de câncer de próstata, 89% de câncer do intestino grosso, etc)”, pontua. Marly também destaca os impactos ambientais gerados pela pecuária e aos animais: “São criados em quantidades exorbitantes e em condições precárias, com enorme sofrimento, tanto na criação quanto na morte de milhares deles. São 67 bilhões por ano só de animais terrestres”, diz.

Fonte: Diário do Nordeste

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