Existem pessoas e coisas magníficas no Brasil, mas isto deixemos para outro momento. O que tenho observado por estes dias é o empobrecimento da comunicação e falta de inteligência e bom senso onde deveria existir. Não é só entre o povo comum das ruas, percebemos nas lojas e nas escolas. Vemos nas faculdades e entre os professores mais ilustres. Estou procurando informações sobre linhas de mestrado e batendo de porta em porta em lugares aqui em Porto Alegre e o que tenho visto é a falta de conhecimento sobre assuntos relacionados à ética ligada aos animais.
Sou bióloga e sei das minhas limitações com relação a certos conhecimentos filosóficos e certas discussões atuais sobre este tema e confesso que ainda tenho muito o que ler e descobrir. Mas como não me espantar que em pessoas que deveriam dar esclarecimentos sobre isso, pois trabalham dentro da área da bioética ou diretamente com os animais, encontramos frases medianas e óbvias, mostrando que nesses assuntos poucos podem falar?
Nas escolas o problema é de fazer-nos chorar. Simplesmente é raro existir professores de Biologia e de Ética/Filosofia que abordem essa questão sem colocar seus preconceitos em cima do assunto para os pobres alunos que confiam nas palavras dos professores. E os conceitos distorcidos e mal planejados nascem aos montes, fazendo com que o conhecimento seja cada vez mais escamoteado e pisoteado, e o resultado é uma educação pobre e o Brasil empobrecendo no final das contas, pois sabemos que a educação nunca foi levada a sério aqui. As aulas são encaradas por muitos professores como um teatro que na vida real se desmonta, ou mesmo na sala de aula é desmontado. E encontramos colegas professores que debocham de nossas colocações, como se precisassem deixar claro que estamos no terceiro mundo e que não precisamos respeitar ninguém, que tudo é motivo de deboche e nada parece ser sério. E isso observamos há anos, sempre achando que são casos isolados e que a realidade deve ser mais amena, mas a cada dia que passa vamos percebendo que as pessoas não fazem esforço algum para aprimorarem-se, apegam-se ao pouco conhecimento que adquiriram e ali estacionam.
Tenho presenciado exemplos de conhecidos que assistiram a aulas de ética tão mal planejadas que seria inadmissível que professores assim continuassem a trabalhar se não fôssemos um país que tolera tudo. Um país que investe milhões no ensino privado filantrópico. Esses alunos irão lamentavelmente reproduzir o modelo ensinado, e assim temos um país que em geral desconhece as alternativas para o uso de animais em laboratório ou em aulas práticas, temos um país que pouco sabe e pouco quer saber sobre os direitos dos animais e temos profissionais da área da saúde, biólogos e cientistas desatualizados com relação a este assunto, mesmo que sejam brilhantes no que fazem.
Sem querer desmerecer pessoas excelentes que têm trabalhado a favor dos animais procurando alternativas ao seu uso ou questionando o atual modo de fazer pesquisa, incentivando que se criem novos modelos de experimentação e contribuindo para a ciência de maneira criativa. Esses pesquisadores, dentre os quais posso citar a Dra. Sonia Felipe, o professor Heron Santana e outros, trazem para nós o que existe de melhor na ciência, mais as suas ideias e palavras inspiradoras. O país ainda está no início de uma discussão sobre direitos dos animais, ética e animais e abolição do uso de animais em pesquisa e ensino, como em outros países já vem ocorrendo também ao longo dos anos. Mas esperamos novas ideias, confiamos que sempre haverá pessoas preocupadas com essa questão que realmente irão fazer algo efetivo e não apenas preocupar-se sem nada fazer.
“Só há uma nobreza que respeito: a do caráter.
E só há uma soberania a que me curvo: a do talento”
(Bocage, citado por Ezio Flávio Bazzo no livro
Os sapateiros da corte, Lilith Publicadora & Cia, 1999)