Os rinocerontes têm sido dizimados pela caça. Na África do Sul, que abriga quase 80% dos rinocerontes de todo o mundo, mais de mil foram mortos anualmente nos últimos quatro anos.
Isso é mais do que 8000% na comparação com uma década atrás, em 2007. Em 2016, os guardas-florestais do Kruger National Park foram chamados para acabar com mais de 2.800 incursões de caçadores, aproximadamente oito a cada dia.
De maneira geral, acreditava-se que o Vietnã era o principal mercado de chifres de rinoceronte, embora existissem poucas informações sobre os traficantes e seus vínculos com os países de origem e trânsito.
O relatório da EAL confirma que grande parte dos chifres chega à Ásia, mas que a China, e não o Vietnã, é o principal país do mercado negro.
A investigação da EAL, realizada de Agosto de 2016 a Junho de 2017, envolveu pesquisas fora do local, análise de inteligência e múltiplas missões de campo secretas para os principais locais do tráfico no Vietnã e em toda a China, especialmente nas províncias do Sul da fronteira: Guangxi, Guangdong e Yunnan, bem como Henan, Fujian e a capital, Pequim.
A confirmação de que o chifre de rinoceronte é onipresente na China mostra como é urgente que o país adote medidas para acabar com o esse comércio, da mesma forma que planejou iniciativas para acabar com o comércio de marfim de elefantes.
“Como no caso dos elefantes, o futuro do rinoceronte está nas mãos da China e sua vontade de cumprir a lei e nas mãos da comunidade internacional para pressionar que a China e o Vietnã impeçam essa loucura”, declarou Andrea Crosta, diretora da EAL e autora do relatório.
“Ao contrário do comércio de marfim, no qual para lucrar você tem que traficar ou vender centenas de quilos de marfim, no caso do rinoceronte, com um preço por atacado de chifre bruto de cerca de 40 vezes mais por quilograma do que o marfim bruto, você precisa de muito menos para ter ganhos financeiros”, disse Crosta.
“Em geral, o volume do comércio de chifres de rinoceronte em termos de quantidade pura é muito menor do que o de marfim, mas os lucros para os comerciantes são muito maiores”, acrescentou.
O relatório cita inúmeras conversas que oferecem informações sobre as mentes dos traficantes de rinocerontes. De acordo com a reportagem da National Geographic, a EAL detalha uma rede de traficantes, transportadores, atacadistas e comerciantes cuja complexidade revela por que é tão difícil acabar com a prática.
Os pesquisadores descobriram que os revendedores na China geralmente não possuem um inventário, mas o fornecem quando há demanda para evitar a prisão. Os traficantes também usam o WeChat para se conectar com compradores e o Alipay para processar pagamentos.
Os nomes dos principais suspeitos e outras provas foram entregues às autoridades. “Eles não podem prender essas pessoas apenas porque estão em nosso relatório, mas é mais do que o suficiente para instigar sua própria investigação”, continuou Crosta.
Segundo os ativistas, o comércio de rinocerontes é ilegal na China desde 1993, mas isso não coíbe em nada a prática. “É chocante ver o quão generalizado e fácil é de encontrar”, afirmou Crosta.
Tendo em vista a enorme população da China e o fato de que restam menos de 30 mil rinocerontes no mundo, isso representa uma séria ameaça à sobrevivência dos animais na natureza.
A China parece ser a maior consumidora de chifres de rinoceronte e o Vietnã possui um papel fundamental nisso. Embora ninguém saiba com certeza, Crosta estima que “vários centenas de chifres de rinoceronte vão do Vietnã para a China todos os anos – o que pode representar até metade do comércio total”.
Esse mercado negro é estável e forte no país. “Não é um mercado que está diminuindo”, adicionou.
Isso contrasta com a investigação feita pela ONG sobre o comércio de marfim, que revelou que os comerciantes chineses não queriam que seus filhos atuassem com isso porque estava prestes a acabar.
Uma das rotas mais importantes para o tráfico atravessa as montanhas do Vietnã para o Sul da China. É uma localidade que as autoridades podem alcançar. Muitas vezes, os chifres são traficados do Vietnã para as províncias de Guangxi ou Yunnan, depois vão para os mercados primários de varejo nas cidades das províncias de Guangdong, Fujian, Zhejiang ou em Pequim. Os traficantes costumam contratar indivíduos, incluindo crianças, para transportar os chifres pela fronteira porque podem evitar o flagrante ou a inspeção.
Regularmente, esses criminosos também comercializam outros produtos da vida selvagem – principalmente o marfim de elefantes e escamas de pangolins.
Os ativistas também encontraram grandes quantidades de partes de tigres (dentes, peles e ossos), assim como patas, bile e vesículas biliares de ursos, cascos de tartaruga, bicos das aves helmeted hornbill, peles de leopardo-da-neve, civetas, cobras, peles e dentes de lobos e corais.
“A China ainda é o maior mercado de produtos da vida selvagem e isso ficou claro em quase todos os locais investigados pela equipe da EAL. O Vietnã não está muito atrasado – provavelmente só porque é um país menor”, diz a investigação.
Com base nas descobertas, Crosta acredita que as atuais campanhas de conscientização sobre rinocerontes não têm sensibilizado o público: “Comerciantes e compradores estão preocupados com apenas um fator: a aplicação da lei. Nada mais”, frisou.
Ele sugere uma campanha focada na aplicação da lei que diga “Se você comprar ou vender chifre de rinoceronte, irá para a prisão”, acompanhada das ações adequadas.
A EAL entregou um relatório confidencial de 200 páginas de informações aos oficiais d China, do Vietnã, da Interpol e dos Estados Unidos. O resumo contém arquivos de casos de 55 traficantes e comerciantes de chifres de rinoceronte na China e inclui vídeos e outras evidências.
“Esta é a conclusão mais importante desta investigação. Não estamos falando de um indivíduo que vende uma pulseira ou copo, mas comerciantes de alto nível – pessoas capazes de importar e vender muitos chifres e produtos brutos”, concluiu Crosta.