O norte-americano Louie Psihoyos, diretor do filme ganhador do Oscar “The Cove”, considera a pesca de golfinhos no Brasil uma “tragédia de grandes proporções”.
O documentário denuncia o massacre de golfinhos em Taiji, cidade costeira do Japão. Mas o Brasil também tem experiências do gênero. O caso mais recente revelado no país é a matança de 83 desses animais no Amapá em 2007, denunciado pela ONG Instituto Sea Shepherd Brasil.
Os animais foram repassados a um navio de pesca em alto mar para ser usados como isca de tubarão, como admitiu o dono das embarcações em audiência em abril, afirma Cristiano Pacheco, diretor jurídico do instituto. “Conseguimos, por ordem judicial, apreender as duas embarcações do réu.”
Além desse caso, o ambientalista José Truda Palazzo, membro do Centro de Conservação Cetácea e representante do Brasil na Comissão Internacional da Baleia até 2009, cita “matanças de tucuxis (botos-cinzas) na costa norte, botos-vermelhos na Amazônia e o desaparecimento iminente da toninha no Sul do país”.
O diretor Psihoyos ironiza: “Dois anos atrás, golfinhos de água doce da China foram declarados extintos, e o Brasil pode ter a honra de assistir a outra extinção de espécies”.
Ocorre que, apesar de o Brasil ter uma “legislação de vanguarda” na proteção aos golfinhos, há uma “absoluta falta de fiscalização”, afirma o ex-comissário Palazzo. A Lei Federal de Cetáceos (7.643/97) proíbe tanto a captura como a perturbação deles — o que inclui baleias e golfinhos.
O diretor considera que o Brasil, onde “já esteve várias vezes”, é “um dos mais bonitos e complexos ecossistemas do mundo”, mas “corre o risco de se tornar uma gigantesca fazenda corporativa”.
SEM FILME NO BRASIL
O filme “The Cove” ainda não estreou em cinemas do Brasil ou América Latina, nem apareceu em festivais da região, apesar de a primeira exibição do filme em festival ter acontecido em abril de 2009 nos Estados Unidos. A obra também passou por Turquia e Eslovênia e estreou nos cinemas do Japão, em julho último, apesar da resistência de conservadores.
“Suponho que nenhum distribuidor no Brasil considere que este filme, que ganhou mais de 75 prêmios pelo mundo, seja de interesse para seu país”, declara Louie Psihoyos. “Não fomos convidados por nenhum festival de cinema aprovado por nosso distribuidor. Mas adoraríamos exibir o filme aí. Seria um lugar perfeito!”.
Carl Clifton, diretor da distribuidora do filme, The Works Internacional, aponta apenas que “documentários, com raras exceções, tendem a enfrentar dificuldades para vender ou se estabelecer na região”.
“EMBAIXADORES”
O diretor de “The Cove” nutre uma admiração especial pelos golfinhos. “Eles têm cérebros bem maiores que os nossos”, lembra Psihoyos. São também “os únicos animais selvagens conhecidos que resgatam humanos”.
Mas o ex-comissário Palazzo afirma que “os cetáceos acabam sendo os “embaixadores” do mar para que possamos perceber os problemas de conservação marinha como um todo”.
“Quando se fala em direito à vida”, não faz sentido excluir alguns por não serem por não serem ‘fofos'”, argumenta Cristiano Pacheco. “A tendência é que, aos poucos, vencendo paradigmas culturais e educacionais de nosso século, cada ser vivo passe a ser visto por seu valor em si, e não apenas para o ecossistema em que vivem.”
O próprio cineasta Psihoyos afirma não comer “animais que andam” há décadas. “Queremos começar um movimento para salvar o mundo natural da destruição humana”, diz ele.
Fonte: Folha de S. Paulo