Por Loren Claire Canales (da Redação)
“Na nação basca, a nossa comida e a nossa dieta são elaboradas em torno do consumo de carne. Mas não é fácil entender que qualquer ser tem o direito a não ser torturado, explorado… nem a ser assassinado para em seguida terminar como uma costeleta em uma prateleira de supermercado. Para mim não é difícil nem explicar e nem fazer com que me entendam. As pessoas que não querem compreender esse fato são as que desconectam alguma parte do seu cérebro quando exponho essas razões”, diz com um argumento contundente e bem fundado Eneko Pérez, bilbaino vegano e ativista em defesa dos direitos dos animais, que se encontra mergulhado em uma viagem por 21 cidades espanholas para expor a sua causa. As informações são do site basco Deia.
É certo que o País Basco, o país do Label (tipo de certificado de produto tradicionalmente basco), das sidreras e da costeleta, é uma terra de carnívoros por excelência, e pode ser o pior lugar para promover uma comida saudável, verde e macrobiótica, isenta de ‘suculentas’ carnes.
“ No país das churrascarias, temos que lutar em dobro”, reconhece o cozinheiro Gorka Gereño, do restaurante Makrobiotika Elkartea, em Donostia. “As pessoas buscam sabores e se então têm problemas é outra história. A pessoa que se propõe a provar essas opções nota a diferença. Muitas pessoas têm dores no estômago ou não vão ao banheiro durante 3 dias, e não se importam com esses problemas, mas isso não é bom. A comida é uma questão de educação”, conclui o chef Gereño.
‘Tofu a maneira basca’
Menus verdes nas Ikastolas (escolas em que se ensina a língua basca- o Euskara)
Se os vegetarianos são uma raridade no País Basco, ainda que sejam poucos, eles existem; veganos, que buscam a coerência entre a comida saudável e o respeito aos animais, decidem sair do armário. O veganismo é uma prática mais restrita, que consiste em abster-se do consumo e do uso de produtos de origem animal e abrange uma filosofia que vai além de uma simples dieta. Os veganos evitam matar, prejudicar e explorar os animais. Não se vestem com lãs, com couro, nem com qualquer tipo de pele de animais; não caçam nem pescam, e são capazes de fazer um omelete sem ovos e um queijo sem leite.
Não existem dados sobre o número de veganos que há na Espanha nem no País Basco, mas as ONGs de proteção aos animais aparecem em segundo lugar entre as “simpatias da população”, ficando atrás dos direitos humanos. Além disso, 93% dos cidadãos declaram repudiar as condições como são criados e mortos os animais nas granjas industriais, ainda que não tenham problema em ver a carne somente na embalagem que pegam no supermercado e poucos optam pelo tofu a maneira basca. Olhos que não veem, coração que não sente.
No entanto, os amantes do verde vão se agarrando a pequenas conquistas sociais. De fato, o departamento de Educação enviou o ano passado uma circular interna aos diretores das ikastolas (escolas em que se ensina a língua basca) para que sirvam nas cantinas escolares um menu vegetariano as crianças que o solicitem. Isso aconteceu após uma reclamação em que Victor Goñi e sua companheira, Aintzane Larretxi, pais de uma criança de 3 anos em Gasteiz, solicitaram formalmente ao departamento de Educação um menu para a sua filha que não tivesse incluso nem a carne, nem o peixe.
A iniciativa de comer verde acontece também no país dos hamburgueres. Los Angeles acaba de instaurar em mais de um milhão de colégios a campanha ‘segunda-feira sem carne’ (Meatless Mondays), que consiste em oferecer um menu estritamente vegetariano. Nos Estados Unidos, um crescente número de cidadãos opta por reduzir o consumo de carne por razões que vão do cuidado da saúde até a defesa do meio ambiente, passando pela rejeição à morte dos animais. E cada vez mais cidadãos – um total de sete milhões e meio- adotam a dieta vegana, um dígito que duplicou desde 2009.
Me diga o que você come…
Uma dieta com prós e contras?
Jorge García Pérez, um treinador pessoal vegano residente em Valencia, incide em que “o veganismo não é contraditório com a prática de esportes. De fato, se pode ser um atleta com um alto rendimento”. Cita como exemplo a atleta Fiona Oakes, vegana desde os 6 anos, que acaba de ganhar a maratona do Polo Norte, onde os atletas competem em temperaturas de até 30 graus negativos. Ou ainda a ciclista britânica Lizzie Armitstead, que é vegetariana e conquistou uma medalha de prata em Londres 2012 no ciclismo de estrada.
Os preconceitos contra esta dieta são frequentes, mas isto já foi superado há anos no âmbito científico. Não em vão, a Associação Dietética Americana, a maior em seu ramo de atuação, recomenda a dieta vegana em qualquer ciclo da vida porque os seus consumidores apresentam níveis de colesterol mais baixos, uma pressão arterial mais baixa e têm uma tendência menor para sofrer de doenças cardíacas.
O único déficit que pode ocorrer é a carência de vitamina B12, já que não se pode encontrar nos vegetais, ainda que a sua origem não esteja relacionada aos animais, mas nas bactérias. “Praticamos uma dieta saudável, e comprovadamente equilibrada para as crianças, grávidas, esportistas… Há milhões de pessoas que vivem de maneira vegana e estão em perfeito estado. Além disso, nós tomamos a vitamina B12 de maneira artificial. Eu fiquei muito tempo sem tomá-la e não tive nenhum problema, mas tenho lido coisas sobre a carência dela no organismo que me parecem razoáveis e para me prevenir, agora tenho ingerido a vitamina”, declara Eneko Pérez, com conhecimento de causa.
“ Comemos muito mais que dois tipos de ervas e quatro folhas de alface”
Envolvido no movimento vegano e de direitos dos animais, Eneko Pérez faz do veganismo sua luta diária e uma questão de responsabilidade e respeito aos animais, pois está convencido de que se trata da postura mais ética e justa a ser tomada.
Vegano há 15 anos, Eneko Pérez crê que é possível viver sem explorar os animais, sem amontoá-los em granjas ou em jaulas e sem transformar seus úberes em ordenhadores industriais. Para ele não é uma dieta, é uma forma de ver a vida. “Eu não como nem carne, nem peixe, nem ovos, nem leite, mas também não utilizo artigos em couro, nem assisto a ‘espetáculos’ com animais”, declara.
É fácil seguir uma dieta vegana?
Hoje em dia, no Ocidente, no País Basco, ser vegano é fácil. Muitos restaurantes têm adaptado parte de seus menus ao veganismo, a única diferença é que, quando comemos fora há menos opções.
É uma filosofia de vida.
Sim, por um lado se refere a dieta livre de produtos provenientes da exploração animal, isto pode ser consequência de um ideal de saúde ou de respeito aos animais, e também é uma questão de não vestir-se com produtos de origem animal ou de não ir a espetáculos onde humilham os animais, como acontece no Sanfermines (festa dedicada ao santo de Pamplona, onde é realizado diariamente durante as festividades, o ‘encierro’, que consiste numa corrida de touros por 3 ruas do centro histórico da cidade), em circos, zoos, etc.
Não consumir produtos farmacêuticos que tenham sido experimentados em animais.
Também. Mas se a pessoa está doente e existe um medicamento deste tipo que pode curá-la, toma-se o medicamento e ponto. E nem por isso deixa de ser vegano. As vezes é como se o veganismo buscasse uma pureza em um mundo quase impossível.
Você tem sido acusado de ser radical?
Muitíssimas vezes. É uma palavra utilizada com abuso.Efetivamente somos radicais porque vamos direto a raiz do problema. É preciso atuar contra a opressão que sofrem os animais, por isso temos que deixar de consumi-los, de utilizá-los em experimentos e deixar de assistir a espetáculos onde eles são oprimidos.
Você gosta de carne?
Eu sempre gostei de carne, de linguiça… mas não consumo, pois é um ato de irresponsabilidade moral contra os animais. Junto a ONG da qual sou ativista, Igualdade Animal (Igualdad Animal), entramos em granjas com câmeras de vídeo para gravar como vivem estes animais e para mostrar o que os criadores de gado escondem do consumidor.
Você está acostumado a escutar absurdos sobre o seu tipo de vida?
Estamos muito acostumados a ouvir discursos de pessoas sem conhecimento algum em nutrição. Os veganos preocupam-se em buscar informações sobre quais alimentos têm mais ou menos proteínas, vitaminas e hidratos. Uma ideia muito enraizada é que temos que comer de tudo. Isso nos garante comer bem, mas o que temos que comer são os nutrientes que o organismo necessita.
É chato comer como você?
Quando a pessoa come de maneira vegana, ela se interessa por diferentes modos de cozinhar os alimentos e te garanto que há uma grande variedade de cremes, de saladas, de cozidos, de legumes, de guisados, de cereais, de novos produtos mais econômicos e baratos que nunca são utilizados porque as pessoas levam uma dieta cheia de preconceitos. É mentira que os veganos só comem dois tipos de ervas e quatro folhas de alface. Há uma incrível e enorme variedade de verduras, hortaliças e vegetais muito diversificada. Não existe nenhum problema neste sentido.