Por Patricia Tai (da Redação)
Todo ano, cerca de 150 cavalos são lançados na água na ilha de Assateague, uma pequena barreira insular e refúgio de vida selvagem que faz parte de Maryland e também de Virginia (EUA). Voluntários chamados “Saltwater Cowboys” acompanham de barco enquanto os animais nadam ao longo do canal para a outra ilha, que se chama Chincoteague e que pertence inteiramente à Virginia. Quando os pôneis chegam, participam de um “desfile” e então são leiloados em um evento beneficente para favorecer o departamento de bombeiros voluntários. As informações são do Huffington Post.
Lendas tentam contar como os pôneis chegaram pela primeira vez na ilha de Assateague. Há uma teoria de que eles tenham chegado através de um navio naufragado no final do século 18 ou início do século 19. Outros supõem que piratas atraídos para a ilha tenham abandonado os animais, há séculos atrás. E a teoria mais provável é que os agricultores em tempos coloniais usaram a ilha como local de pastagem para evitar pagar impostos sobre a terra, e lá criaram estes animais.
2013 marcou o 88º ano do evento que é chamado de Chincoteague Pony Swim. Um incêndio em 1925 trouxe o caráter beneficente a este evento anual, que também já foi documentado no romance “Misty of Chincoteague”de Marguerite Henry de 1947. No entanto, as práticas contidas no evento são totalmente contrárias ao que regem as concepções básicas dos direitos animais.
Segundo a reportagem do Huffington Post, na manhã de tempestade do dia 24 de julho, os pôneis entraram na água fria às 11h17 da manhã e levaram 5 minutos e 20 segundos para cruzar o canal. O DelawareBeaches.com descreveu as condições climáticas do dia em que se deu o ocorrido como “violentas e perigosas”.
“Os pôneis chegaram em terra esta manhã enquanto uma tempestade traiçoeira arrebatava Chincoteague com uma chuva ofuscante, fortes trovões e relâmpagos, que fizeram com que os organizadores pedissem aos espectadores que baixassem os seus guarda-chuvas e descessem das árvores”, conta o DelawareBeaches.
O leilão ocorre no dia seguinte à chegada dos animais. Em 2012, foram levantados aproximadamente 100 mil dólares em leilão. Organizadores dizem que, além de levantar fundos para os bombeiros, “a venda também ajuda a controlar o tamanho da população de pôneis de Assateague”.
No terceiro dia do evento, os pôneis adultos e potros que não são vendidos – juntamente com aqueles que tiveram sua liberdade comprada – são devolvidos à ilha de Assateague, com outro mergulho.
Riscos envolvidos
Uma edição de novembro de 2008 do Jornal da Associação de Medicina Veterinária Americana (JAVMA – Journal of the American Veterinary Medical Association) faz desencadear novos pensamentos sobre essa tradição de travessia marítima dos cavalos de Chincoteague.
A matéria traz observações do veterinário Dr. Charles Cameron, que passou a dar assistência aos animais explorados no evento após duas éguas terem morrido durante mergulho em 1989. No ano seguinte, o Dr. Cameron descobriu que a causa da morte tinha sido um distúrbio chamado hipocalcemia.
Ele conta que é uma ocorrência rara, “mas não rara nesta situação”. Trata-se de um desequilíbrio eletrolítico que traz ameaça de morte, em que os músculos do animal passam a disparar fora de controle.
“É fácil de tratar” disse o veterinário, “se diagnosticada a tempo”. Ele informou que a hipocalcemia geralmente afeta éguas em fase de lactação, com potros em idades tenras, e que o calor do verão pode acelerar a crise da doença.
Antes do mergulho, o Dr. Cameron diz avaliar cuidadosamente o rebanho e selecionar as éguas em final de gestação e jovens potros, que não são recomendados a participar do mergulho. Estes animais são rebocados ao longo do canal para participar dos “desfiles”, deixando-se que os potros mais velhos, outras éguas e garanhões sejam levados para a água.
“Potros têm um bom desempenho se não forem separados de suas mães, pois se separados, ficam confusos. Um potro, certa vez, parou no meio do percurso e então decidiu voltar”, afirmou o Dr. Cameron, que também contou que “foi forçado a trazer o potro em seu barco”.
Esta é, aliás, cena comum, a dos barcos que acompanham os cavalos nadadores terem que resgatar éguas, presumivelmente injetando cálcio em seus corpos. Potros confusos são içados da água a bordo dos barcos.
Mas os organizadores do evento acham que tudo é contornável. “Eles são bons nadadores. Os únicos problemas que temos são alguns cortes que podem ser causados por conchas de ostras e mariscos”, disse o veterinário, que também participa dos leilões. Conforme a reportagem, assim que cada potro é apresentado, o Dr. Cameron examina e estima sua idade para o leiloeiro. Cerca de 70 potros são leiloados anualmente.
Nota da Redação: Embora o artigo do jornal científico em questão não tenha viés abolicionista, ele não consegue evitar que fiquem claros os diversos riscos que correm esses animais ao fazer a travessia do canal a nado.
E, pelo que se conhece da natureza intrínseca e do temperamento dos cavalos, o fato de serem forçados a nadar em águas tempestuosas certamente deve ser motivo causador de grande stress por si só – totalmente desnecessário, diga-se de passagem.
E por último mas não menos importante e grave é o que subjaz a todo esse cenário de exploração – mais um, dentre tantos – em que os animais passam por tudo isso para simplesmente serem vendidos, “leiloados”, como objetos.