Em 1843, o pedagogo e filósofo estadunidense Amos Bronson Alcott, um homem bastante influente em seu tempo, tanto que entre seus amigos e admiradores estavam personalidades como Herman Melville, Walt Whitman, Nathaniel Hawthorne, Henry David Thoreau, Ralph Waldo Emerson e Margaret Fuller, fundou em Harvard, Massachusetts, uma comunidade “vegana” chamada Fruitlands, que se situava em uma área de 90 acres, o equivalente a 360 mil metros quadrados. A propriedade foi comprada em parceria com o reformador educacional inglês Charles Lane.
De acordo com informações do Fruitlands Museum e do site oficial sobre a vida de Bronson Alcott, pai da escritora Louisa May Alcott, importante nome da literatura juvenil, nenhum tipo de alimento de origem animal era consumido na comunidade. “Eles não usavam nada de origem animal; nem lã, mel, cera ou esterco. Nem mesmo trabalho animal. Os fundadores sentiram que os seres humanos não deveriam tirar nada dos animais”, informam.
Idealista, Alcott sonhava com o dia em que os animais seriam livrados do trabalho árduo da mão de obra agrícola e da degradação do abate. O seu desejo com a criação da Fruitlands era de que as pessoas aprendessem mais sobre a importância de viver em harmonia com os animais, além de serem estimuladas a se desenvolverem intelectualmente e espiritualmente. Sua crença era a de que Fruitlands poderia ser uma iniciativa que se espalhasse por outras regiões dos Estados Unidos e para outros países.
A vida na comunidade também evidenciava a importância da relação com a terra. Todo o trabalho era feito por humanos. “Sem animais, é claro, recusando-se a usar cavalos em qualquer tipo de transporte. Não havia nem tratores naquela época”, escreveu John Davis no artigo “Bronson Alcott – American Pioneer Vegan”, publicado em 22 de março de 2011, destacando que mesmo com todas as adversidades, Alcott fez o possível para seguir adiante.
Com 11 anos, Anna Alcott, filha de Amos Bronson disse que nós, enquanto seres humanos, temos o poder de pensar e sentir, enquanto os animais, que estão em desvantagem em relação a nós, devem ter permissão para viverem em paz, sem serem usados em trabalho pesados ou reduzidos a alimento. “Como alguém pode comer carne quando há frutos tão suculentos?”, questionou a criança em citação do artigo “Fruitlands”, publicado no site oficial sobre a vida Bronson Alcott.
Embora o termo vegan tenha surgido somente em 1944, 100 anos antes a Família Alcott e os moradores de Fruitlands já defendiam uma filosofia de vida que mais tarde receberia o nome de veganismo. Reflexo disso é que muitos a consideram a primeira comunidade “vegana” dos Estados Unidos. Toda a alimentação dos moradores era proveniente das plantações da comunidade que funcionava sob um sistema de autossuficiência. Porém, depois de sete meses a comunidade começou a ruir porque muitas pessoas que se juntaram a eles não contribuíam efetivamente com o trabalho que era desenvolvido lá dentro. Havia aqueles que não queriam trabalhar, mas somente comer, dormir e descansar sob as sombras das macieiras.
Como Amos Bronson Alcott, Charles Lane e outros idealizadores costumavam viajar para divulgar a Fruitlands, na tentativa de conquistar novas parcerias, colaboradores e pessoas dispostas a colocarem em prática um projeto semelhante, muitas vezes o trabalho dentro da comunidade contava apenas com a força das mulheres e crianças das famílias Alcott e Lane, além de um homem conhecido como Palmer.
O que aparentemente fez a Fruitlands sucumbir em menos de um ano foram as divergências de opiniões entre os idealizadores. Outro agravante era a necessidade de capital para investir na propriedade, que acabou escasseando, já que eles não viviam para gerar lucro. “Quando foram forçados a escolher entre medidas práticas para o sucesso ou viver espiritualmente, eles optaram pela última”, segundo o artigo “Fruitlands”, que integra os arquivos do museu da comunidade. Alcott preferiu desistir do que dar continuidade, mas tendo que ir contra seus princípios. Em 1873, a escritora Louisa May Alcott publicou uma prosa satírica intitulada “Transcendental Wild Oats”, baseada em memórias de infância em Fruitlands.
Mesmo que o projeto não tenha durado muito tempo, Amos Bronson jamais deixou de acreditar no modelo de comunidade que idealizou junto com Charles Lane. Segundo registros de suas memórias que constam em seu site oficial, ele apenas se deu conta de que talvez o ser humano não tenha realmente aptidão para viver no Éden. Quem for a Harvard, no Condado de Worcester, em Massachusetts, pode visitar o Fruitlands Museum e conhecer a história da comunidade “vegana” do século 19.
Amos Bronson Alcott se tornou vegetariano em 1835
Amos Bronson Alcott se tornou vegetariano em 1835 e acredita-se que por influência dos pensamentos do filósofo grego Pitágoras. Mais tarde, a sua crença no vegetarianismo como uma filosofia de vida a ser seguida pela humanidade foi fortalecida após ele participar de palestras do reformador e ministro presbiteriano Sylvester Graham, defensor do vegetarianismo que viajava pelos estados Unidos criticando o consumo de alimentos de origem animal.
Em 1843, Alcott escreveu uma carta em que manifestou a sua crença de que o mundo seria um lugar muito melhor sem a exploração de animais:
“Calcula-se que, se nenhum alimento animal fosse consumido, um quarto da terra agora usada seria suficiente para o sustento humano. E os vastos caminhos agora apropriados pelas pastagens, cortes e outros modos de provisão para animais poderiam ser aproveitados de forma mais inteligente e afetuosa.”
Além de defender o abolicionismo animal quando ainda não existia formalmente a teoria dos direitos animais, Alcott lutava pelo fim da escravidão humana nos Estados Unidos, até por entender que não se pode lutar pelo fim de um tipo de exploração e ao mesmo tempo endossar ou ignorar outro.
Defendeu ainda os direitos das mulheres, e acredita-se, segundo John Davis, que ele se tornou “vegano” aos 42 anos em 1842: “Ele expandiu seus pontos de vista antiescravidão, incluindo animais não humanos.” Logo após o seu regresso aos Estados Unidos, surgiu o anseio de fundar uma comunidade livre da exploração animal.
Referências
Maurer, Donna. Amos Bronson Alcott: Idealist, Tanscendentalist, Vegetarian. Vegan Handbook. The Vegetarian Resource Group.
Davis, John. Bronson Alcott – American Pioneer Vegan. Veg Source (22 de março de 2011).
http://www.alcott.net