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DESMATAMENTO

Berço das águas no país, Cerrado perdeu quase 28 milhões de campos de futebol em vegetação nativa desde 1985

Outro estudo divulgado hoje pela TNC Brasil mostra que o Cerrado tem atualmente 23% de sua área em situação crítica, com menos de 20% da vegetação natural

20 de setembro de 2022
4 min. de leitura
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Foto: Getty Images

Neste 11 de setembro se celebra o Dia do Cerrado. Mas na prática, há mais motivos para alertas do que festejo. O bioma de árvores de raízes profundas está em 15 estados brasileiros, em 22% do território nacional e alimenta oito das 12 grandes bacias hidrográficas brasileiras — não à toa é considerado o “berço das águas” no país.

Mas apesar de ser estratégico para a segurança hídrica no Brasil, o bioma está cada vez mais ameaçado pelo avanço dos desmatamento, culturas agrícolas como a soja e mudanças climáticas. Entre 1985 e 2021, o Cerrado perdeu o equivalente a 27,9 milhões de campos de futebol em área de vegetação nativa, segundo dados do Mapbiomas divulgados neste do domingo.

Em 37 anos, as atividades agrícolas expandiram-se 508% no bioma, passando de 4 milhões de hectares para quase 25 milhões de hectares. Do total, 20 milhões são de soja, cultura que na última década avançou sobretudo em áreas de vegetação nativa nos estados do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Juntos, eles respondem por 80% da conversão direta de vegetação nativa para sojicultura entre 2011 e 2021.

“O Cerrado está passando por dois processos simultâneos de transformação. Por um lado, áreas já antropizadas, de pastagens, convertem-se em lavouras. Por outro, no entanto, vemos as lavouras entrarem diretamente sobre a vegetação nativa. Isso indica que o aumento de produção no bioma não está se dando graças a melhores práticas e manejo de solo, mas pela abertura de novas áreas de cultivo”, explica Dhemerson Conciani, pesquisador do IPAM e que faz parte da equipe do Cerrado no MapBiomas.

A segurança hídrica no Brasil começa pela proteção do Cerrado, nosso “Berço das Águas” — Foto: Divulgação/TNC

A substituição de pastagens pelo cultivo de grãos ocorre com mais intensidade ao Sul e Sudeste do bioma, nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. Os pesquisadores alertam para o efeito negativo da perda de áreas verdes sobre o clima da região e a capacidade do bioma continuar sendo um grande produtor de água no país. Artigo publicado por pesquisadores brasileiros concluiu que a conversão de áreas nativas do Cerrado para pastagens e agricultura já tornou o clima e toda a região quase 1°C mais quente e 10% mais seco, em média.

A vegetação do Cerrado — marcada por uma diversidade de espécies, como atobá, araticum, buritis, ipês — absorve a água da chuva e a deposita em reservas subterrâneas, os aquíferos. Além disso, o bioma tem uma enorme capacidade para absorver dióxido de carbono e manter significativos estoques de carbono na vegetação e no solo e, com isso, contribuir com a regulação do clima, minimizando os efeitos do aquecimento global. A perda de vegetação nativa põe tudo isso em risco.

“Mudanças climáticas globais ainda podem agravar esse cenário de aumento de temperatura e redução de chuvas, trazendo prejuízos para a agricultura, o abastecimento de água das cidades e a produção energética do país”, diz Julia Shimbo, pesquisadora do IPAM e coordenadora científica do MapBiomas. Em algumas partes do bioma, o desmatamento fez com que a temperatura média subisse até 3,5°C nos últimos 15 anos, além de deixar a região mais seca com uma queda de cerca de 27% na umidade média anual.

Outro estudo divulgado hoje pela TNC Brasil mostra que o Cerrado tem atualmente 23% de sua área em situação crítica, com menos de 20% da vegetação natural. A perda de vegetação natural fragmenta as paisagens e faz com que os remanescentes percam gradualmente sua capacidade de prover benefícios ecossistêmicos.

Como reverter essa história

Ainda é possível conservar o Cerrado com ações como a restauração de ecossistemas, que ajudam a mitigar os danos causados com a perda da cobertura vegetal. Priorizar a melhor ocupação das terras já abertas também ajuda a diminuir a necessidade de novos desmatamentos., segundo a TNC Brasil, que tem trabalhado para conciliar a conservação do bioma sem prejuízo das atividades econômicas — afinal é do Cerrado que vem boa parte da produção de grãos do país, incluindo a soja.

A difusão de boas práticas agrícolas e pecuárias é essencial aqui. Na região do Vale do Araguaia, por exemplo, a TNC fomenta sistemas integrados de produção por pequenos e médios produtores, aliando o cultivo agrícola aliadas à conservação dos ecossistemas, proteção da biodiversidade e restauração de vegetação em áreas essenciais para rios e nascentes.

Na Bacia do Rio Araguaia, que abriga um dos principais rios do país e engloba importantes pontos agrícolas de Mato Grosso, Goiás e Tocantins, a organização ambiental e parceiros estão trabalhando com pecuaristas, agricultores e outras partes interessadas para garantir uma produção lucrativa sem desmatamento adicional.

Para além de sua vocação hídrica, o Cerrado é o habitat natural para milhares de espécies de plantas e animais que correspondem a 30% da biodiversidade brasileira e 5% da biodiversidade global. O bioma abriga mais de 12 mil espécies de plantas, sendo 44% endêmicas, mais de 830 espécies de aves, 199 de mamíferos, 1.200 de peixes além de uma grande variedade de répteis e anfíbios.

Fonte: Um só planeta

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