Diante de situações como essa, a orientação inicial é a tentativa de diálogo e mediação, com esclarecimento das normas vigentes. Persistindo a proibição, o caso pode e deve ser comunicado às autoridades competentes, como a Polícia Civil, o Ministério Público ou o Judiciário. O que a lei não admite é que relações de poder sejam usadas para normalizar a fome e a sede de animais abandonados, transformando o sofrimento em regra e o cuidado em infração.
Impedir a oferta de comida e água a animais em situação de abandono pode ir além de uma decisão administrativa e configurar violação da lei. A legislação brasileira reconhece a proteção à vida e ao bem-estar animal como dever constitucional e assegura que cidadãos não sejam impedidos de prestar cuidados básicos, o que coloca empregadores que proíbem a alimentação de animais comunitários em enquadramento por maus-tratos e até por constrangimento ilegal.
O artigo 225 da Constituição Federal determina que práticas que submetam animais à crueldade são vedadas, atribuindo ao poder público e à coletividade a responsabilidade por sua proteção. Esse comando não se limita a agressões diretas e inclui condutas que provoquem sofrimento por omissão, como a privação de alimento e água. A norma constitucional é reforçada por leis infraconstitucionais que tratam os maus-tratos como crime, com penas de reclusão e multa, reconhecendo que a dor causada pela negligência também fere o ordenamento jurídico.
A definição de crueldade adotada pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária deixa claro que qualquer ato capaz de gerar sofrimento evitável viola princípios básicos de bem-estar. Ao impedir que trabalhadores alimentem animais que já vivem e circulam no local, o empregador contribui diretamente para a deterioração da saúde desses indivíduos, ampliando riscos de desnutrição, doenças e morte. Trata-se de uma conduta que extrapola a gestão do espaço e atinge direitos assegurados por lei.
Em alguns estados, como Minas Gerais, a legislação avança ao garantir expressamente o direito de cidadãos fornecerem alimento a animais em situação de rua. Nesses casos, a proibição não apenas afronta normas de proteção animal como também interfere na liberdade de terceiros praticarem um ato lícito. É nesse ponto que surge o possível enquadramento por constrangimento ilegal, já que a ordem impede a realização de uma ação permitida e incentivada pelo próprio sistema jurídico.
Animais comunitários, embora não tenham responsáveis individuais, são reconhecidos pela convivência contínua com pessoas e pela dependência de cuidados mínimos. Negar esses cuidados equivale a romper um vínculo já estabelecido e agravar um quadro de vulnerabilidade que a legislação busca justamente evitar.