Wilson Grassi
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Para mim e muitas outras pessoas é difícil não ficar indignado ao ver poodles tingidos de cor de rosa, tosas estilizadas e adereços inúteis, como os que pontuaram a edição paulistana do Pet Fashion Week, em sofisticado hotel da capital. Evento destinado, segundo os organizadores, a apresentar ao varejo seus produtos e inovações nos segmentos de moda, tosa e lifestyle (aliás, nem sei direito o que querem dizer com lifestyle).
Uma leitura mais atenta, porém, revela a violência que é a tentativa de humanização destes animais, visando apenas atender ao senso estético humano. Preencher o ego de algumas pessoas e os bolsos de outras. Nem a desculpa de que o evento angaria fundos para “instituição Cão Guia” me convence, mesmo porque também este tipo de exploração animal é bastante questionável.
A comparação do luxo versus o lixo fica chocante quando lembramos que para cada cão que tem acesso a um colar de pérolas, como os que desfilaram neste evento, milhões não tomam as vacinas básicas. E poucos se preocupam com isso.
Para cada cão que passou por uma tintura na pelagem, milhares morrem 12 anos antes da hora, atropelados, com viroses ou sacrificados nos centros de zoonoses municipais. Para cada cão que toma banho de ofurô, uma infinidade ainda não comeu hoje, pois não achou nada no lixo.
Outro ponto que tem de ser insistentemente lembrado é que não só os cães e gatos são animais. Isso, para que possamos ampliar este “amor”, também aos outros animais que são tratados como escravos, como os porcos, as vacas e as galinhas.
Não sou contra a tecnologia, muito menos contra o luxo, mas o verdadeiro desafio na questão dos cães e gatos não é fabricar aparelhos médicos mais potentes e modernos, nem acessórios mais caros e cravejados de brilhantes. O verdadeiro desafio, e onde deveriam estar concentrados nossos esforços – e quando digo nossos, digo veterinários, políticos, empresários do mercado de produtos animais, simpatizantes e amantes dos animais – é diminuir a população de cães e gatos em geral e, consequentemente, o números destes animais excluídos de qualquer tipo de cuidado. Resolver este quadro é o verdadeiro desafio. Começar falando sobre os problemas, em vez de enaltecer atitudes egocêntricas e mercantilistas, pode ser um bom ponto de partida.