Uma nova pesquisa, publicada hoje pela British Trust for Ornithology (BTO) e pela Universidade de Durham, sugere que muitas espécies de aves migratórias estão tendo dificuldades para se adaptar aos efeitos das mudanças climáticas.
As mudanças climáticas representam uma grande ameaça à biodiversidade, e aves migratórias como a andorinha-comum e o felosa-musical são particularmente vulneráveis, em parte devido à sua dependência de fontes confiáveis de alimento e habitats adequados em uma rede de locais em momentos específicos de seu ciclo de vida.
Com o declínio populacional registrado em todo o continente em muitas dessas aves migratórias de longa distância, os pesquisadores se propuseram a entender como as mudanças climáticas podem estar contribuindo para esses declínios.
Concentrando-se em mais de 30 espécies de aves que migram entre a África e a Europa, os cientistas analisaram a condição das aves em momentos-chave para avaliar sua capacidade de migrar por longas distâncias.
Antes de empreenderem longas e potencialmente perigosas jornadas pelo Mediterrâneo e, posteriormente, pelo Deserto do Saara, essas aves precisam aumentar significativamente seu peso para completar essas tarefas de notável resistência. Essa “reserva de energia migratória” garante que as aves possam voar milhares de quilômetros sobre ambientes hostis sem a necessidade de parar e “reabastecer”.
Tendo desenvolvido estratégias que permitem às aves aproveitar a disponibilidade sazonal de alimentos, essas espécies migratórias estabeleceram padrões tradicionais de movimento para coincidir com esses picos de disponibilidade de combustível.
Com as mudanças climáticas, os cronogramas migratórios tradicionais, planejados para coincidir com a disponibilidade de alimento durante a jornada, podem ter se tornado incompatíveis. As mudanças climáticas também podem reduzir a disponibilidade geral de alimento, por exemplo, aumentando a probabilidade de secas. Verões mais quentes têm se tornado mais evidentes com as mudanças climáticas, particularmente no sul da Europa. Logo após a reprodução, muitas aves migratórias precisam empreender as longas e perigosas jornadas rumo ao sul, para a África, o que exige que estejam em ótimas condições físicas.
Cientistas utilizaram dados de anilhamento de longo prazo de 33 espécies migratórias afro-paleárticas em 286 locais por toda a Europa para demonstrar, pela primeira vez, uma diminuição em larga escala na reserva de energia migratória durante o outono nos últimos 40 anos. O momento da reserva de energia no outono também mudou, ocorrendo mais cedo do que o registrado anteriormente para as aves que nidificam no norte e mais tarde para as que nidificam em locais mais ao sul.
Essas mudanças provavelmente resultarão de alterações no momento, na quantidade e na qualidade dos recursos alimentares disponíveis para a alimentação das aves migratórias na Europa e poderão ter sérios impactos sobre as aves canoras migratórias. Qualquer redução na reserva de energia migratória poderá significar que mais aves migratórias morrerão durante a migração, antes de chegarem aos seus locais de invernada na África, seja diretamente por subnutrição, seja indiretamente, pelo atraso na migração e pelo risco de mudanças climáticas sazonais potencialmente problemáticas.
Além disso, a análise relacionou essas reduções na reserva energética migratória ao aumento das temperaturas na Europa nas últimas quatro décadas, particularmente no sul. Temperaturas mais altas na região do Mediterrâneo aumentaram a frequência de secas e os cientistas esperam que isso reduza a qualidade e a quantidade de alimento nessa fase crítica, necessária para abastecer as aves em suas jornadas através do mar e do deserto.
A Dra. Jennifer Border, Ecologista Sênior de Pesquisa da BTO, afirma: “Coletar dados em larga escala e a longo prazo sobre a condição de animais individuais durante a migração é extremamente desafiador. Mas, no caso das aves migratórias, temos um sistema modelo já existente, no qual uma grande rede de anilhadores coleta dados individuais sobre tamanho e massa corporal, permitindo o rastreamento da variação na condição corporal. A quantidade de informações coletadas ao longo de quatro décadas, envolvendo milhões de aves, nos permitiu observar mudanças significativas no comportamento dessas aves.”
O professor Stephen Willis, do Grupo de Ecologia da Conservação da Universidade de Durham, afirma: “Para melhor compreendermos como as mudanças futuras, sejam elas climáticas ou no uso da terra, afetam as aves migratórias, precisamos primeiro determinar o que afeta sua condição corporal antes e durante a migração. A pesquisa atual é um passo importante para avançarmos nossa compreensão sobre o que afeta a reserva energética de uma ave antes de uma migração de longa distância.”
O professor James Pearce-Higgins, diretor de ciência da BTO (British Trust for Ornithology), afirma: “Este estudo revela um impacto até então desconhecido das mudanças climáticas sobre as espécies migratórias. A redução na condição física das aves em anos mais quentes pode diminuir a capacidade dos migrantes de completarem suas travessias pelas barreiras do Mediterrâneo e do Deserto do Saara, afetando sua sobrevivência e potencialmente contribuindo para o declínio populacional a longo prazo de muitas de nossas espécies mais queridas, como a andorinha.”
Traduzido de Inside Ecology.