Após duas tentativas frustradas de reintegração de peixes-boi à natureza, uma equipe da Associação de Amigos do Peixe-Boi (Ampa) concluiu que os ambientes de várzea – áreas às margens de rios que são inundadas em períodos de cheias – são mais apropriados para a adaptação da espécie. Em entrevista ao G1, o veterinário do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Anselmo D’Affonseca, afirmou que esses locais têm mais opções de alimentos, o que evita um dos principais problemas que o animal enfrenta atualmente: o estresse.
“Verificamos que muitos peixes-boi chegam aqui com o psicológico afetado e isso gera outras consequências. O animal emagrece, fica com a imunidade baixa e isso abre a porta para uma série de doenças”, apontou D´Affonseca, responsável pela adaptação dos animais no Inpa, junto a uma equipe de três pesquisadores, dois técnicos, seis tratadores e um grupo de alunos de mestrado e doutorado.
Desde outubro do ano passado, a Ampa mantém alguns animais em um estágio de “pré-soltura” no município de Manacapuru, a 168km de distância de Manaus. “A espécie tem praticamente todas as condições para se adaptar aquele ambiente natural. Posteriormente, eles serão recapturados e veremos quais as condições deles”, explicou o especialista.
A experiência, acredita o veterinário, terá um saldo mais positivo que as realizadas em 2008 e 2009 na região do Cuieiras, no Rio Negro. “Foram quatro animais que não se adaptaram bem – dois vieram a óbito, um foi resgatado e o outro desapareceu”, contou D’Affonseca. “Reformulamos os planos e decidimos soltar na várzea, que é um ambiente muito mais rico em alimentos para a espécie. Nós vamos coletar plantas aquáticas em áreas de Iranduba [município a 27km da capital amazonense] para dar ao animal um condicionamento físico e ensiná-lo a se alimentar naquele ambiente”, completou.
Nesse sentido, a “pré-soltura” em Manacapuru é a principal mudança para que o peixe-boi aprenda a se adaptar. Atualmente, o Inpa conta com 56 animais da espécie. Todos os anos, pelo menos sete filhotes são resgatados e levados para a equipe da Ampa. De acordo com o veterinário, muitos animais ainda chegam debilitados e morrem cedo. No entanto, esse número tem diminuído.
“Hoje, 70% dos filhotes recuperados sobrevivem. Há uns cinco anos, a média era de 50%. A recuperação diferencia para cada animal. Alguns não aceitam a mamadeira e precisam se alimentar com sonda, o que dificulta no início”, resumiu.
Entre animais recuperados e apreendidos, a maioria dos mamíferos no Inpa faz parte do primeiro grupo. Segundo D’Affonseca, os índices de apreensões estão em queda no estado. “Está próximo de zero, porque as pessoas têm consciência de que manter essa espécie em cativeiro é ilegal e que pode render punições por danos ambientais ou por maus-tratos a animais”, disse.
Os maus-tratos, porém, ainda preocupam a equipe do Ampa. “Muitos chegam com peso abaixo do normal e marcas pelo corpo. Ainda bem que essa é uma condição cada vez mais rara. A grande parte dos animais que chega aqui é encontrada; 99% deles são filhotes”, completou.
Fonte: G1