“Um cão morrendo à míngua no portão do seu tutor / Prediz a ruína do estado” (William Blake)
Reza a lenda que o presidente norte-americano Abraham Lincoln ouviu uma resposta debochada de um interlocutor ao defender a criação de um ministério dedicado à agricultura: “E depois faremos um ministério para as indústrias também?”. Um século e meio depois, a ideia de Lincoln não apenas se provou correta, mas também essencial. E não há notícia de um único governo de país civilizado que não conte com uma pasta voltada à produção agrícola.
As novas instituições – como, aliás, as novidades em geral – causam estranheza num primeiro momento. Mas, ao longo do tempo, se bem planejadas e corretamente implementadas, conquistam um lugar de respeito junto à sociedade e ao estamento político.
No mundo do ano 2025, um novo ente pede para nascer: um sistema público nacional de saúde animal. Num futuro próximo, em alguma nação do mundo, essa ideia se materializará. Quem sabe os suecos apresentem a fórmula pioneira? Talvez, o governo da Inglaterra mostre ao mundo o que fazer e como. Pode ser que os turcos, os japoneses ou os australianos deem o primeiro passo. E por que não o Brasil tomar a iniciativa e liderar o processo? Preenchemos todos os requisitos necessários: possuímos e amamos milhões de animais (cerca de 160 milhões de animais domésticos ou pouco mais de três pets para cada quatro pessoas); somos dotados de uma população aberta a boas práticas e solidária e temos, sobretudo, disposição para inovações.
No campo da saúde pública, nos orgulhamos do Sistema Único de Saúde (SUS), que é referência mundial e cuja origem pode, guardadas as devidas proporções, servir de inspiração para uma iniciativa que se encarregue de socorrer os milhões de animais carentes que padecem Brasil afora sem ter a quem recorrer.
A 8.ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília no ano de 1986, lançou as linhas gerais do nosso Sistema Único de Saúde, numa convenção que reuniu médicos, ativistas, acadêmicos e sociedade civil organizada. Um evento semelhante, que envolva os atores técnicos e políticos, com ampla participação popular, poderia ser o ponto de partida para a criação de um sistema de saúde para os animais.
Organizado em grupos temáticos, transparentes e democráticos, o encontro pode ser o ponto de partida para o fim da dor silenciosa de cães e gatos que sofrem sozinhos ou sob os olhares de tutores humildes, impotentes diante do martírio dos seus animais. O desafio, sabemos, não é pequeno. Trata-se, obviamente, de um problema complexo, de difícil e custosa solução. Mas estamos à altura de resolvê-lo com a união das nossas melhores cabeças e grandes corações. Não podemos mais faltar aos animais do nosso país.