Pedimos que, de maneira cordial e respeitosa, manifestem -se junto ao Excelentíssimo Senhor Procurador Geral de Justiça Dr. Fernando Grella Vieira ( [email protected] ) e ao Conselho Superior do Ministério Público ([email protected]) , solicitando que seja constituído o grupo especial de promotores de justiça para atuar na defesa animal.
Essa seria uma importante medida para garantir uma proteção mais célere e efetiva aos animais, já que o grupo teria também atribuição cível , e não apenas penal.
Em ofícios encaminhados ao Procurador Geral de Justiça, nos últimos dois anos, a UIPA tem se queixado do indeferimento sistemático de representações sobre maus-tratos pela Promotoria do Meio Ambiente, que é cível.
Remetida à esfera penal, com simples determinação de que seja instaurado inquérito policial, a representação acaba por não produzir efeito eficaz, à medida que :
a) as autoridades não se valem das ferramentas que possuem para a salvaguarda do animal, como por exemplo, representar ao juiz, pleiteando a busca e apreensão para evitar padecimento e morte no curso do inquérito;
b) casos de maus-tratos chegam ao JECRIM -Juizado Especial Criminal- anos após a notícia do fato, quando já se deu a prescrição e, por vezes, a morte do animal;
Meios mais céleres podem ser utilizados pela promotoria do meio ambiente como, por exemplo, a celebração de um TAC – termo de acordo, pelo qual o infrator compromete-se a obrigações determinadas pelo Ministério Público, em conjunto com a associação protetora.
Ao receber a notícia da prática de maus-tratos, a entidade envia carta elucidativa de que a conduta pode, em tese, configurar crime ambiental, oportunidade em que orienta o responsável a respeito dos cuidados que devem ser ministrados ao animal.
Casos há, entretanto, que a entidade não tem acesso ao local para que averigue a veracidade da denúncia. Muitas vezes, constata-se maus-tratos, e o infrator não se propõe à alteração de cuidados, o que obriga a entidade a encaminhar o caso às autoridades competentes.
É preciso esclarecer que a coleta de provas necessárias à efetiva apuração da prática de maus-tratos só pode ocorrer em sede de inquérito, civil ou policial, já que as autoridades dispõem de ferramentas que uma associação civil não possui, tais como a notificação para tomada de depoimentos que elucidem o caso, requisição de informações e perícias, determinação de vistoria no local dos fatos, dentre outras diligências de cunho investigatório, todas elas coercitivas, cujo desacato implica em crime de desobediência (artigo 330 do Código Penal) e em outras sanções legais (artigo 10 da Lei 7347/85).
Por sua complexidade, a questão demanda uma atuação conjunta entre as autoridades e as associações protetoras.
Não deixem de se manifestar, ainda que de forma muito simples. É preciso demonstrar que a sociedade também clama pela solução dos casos de maus-tratos.
A leitura do artigo que segue abaixo possibilitará um entendimento mais aprofundado sobre a problemática enfrentada pela UIPA na averiguação de denúncias.
Maus-tratos com Animais e as Autoridades – Dilema enfrentado pelas Associações Protetoras – Vanice Teixeira Orlandi
Representações versando sobre maus-tratos com animais, em sua maioria, são indeferidas pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, indicando tratar-se de um posicionamento do Ministério Público frente à questão, e não do entendimento de alguns de seus representantes sobre casos concretos e específicos.
Embora sob vigência de farta legislação protetiva, são frequentes os casos de maus-tratos. Basta dizer que à UIPA, União Internacional Protetora dos Animais, não chegam menos de quinze denúncias por dia, o que também se presta a evidenciar o clamor público pela causa.
Assim, vale abordar o tema, expondo o dilema enfrentado pela entidade, que ao encaminhar as denúncias de maus-tratos às autoridades competentes, acaba por testemunhar, impotente, a piora do quadro denunciado.
Alguns indeferimentos referem-se à possibilidade de a própria entidade valer-se do Poder Judiciário para a solução dos casos de maus-tratos. Com todas as vênias, nada mais equivocado, pois a prática de maus-tratos com animais configura crime, tipificado na Lei dos Crimes Ambientais, cuja apuração e persecução penal são de atribuição do Ministério Público, e não de uma associação civil.
Com efeito, a coleta de provas necessárias à efetiva apuração do fato investigado só pode ocorrer em sede de inquérito, civil ou policial, já que todos os atos de natureza instrutória são próprios à atividade inquisitiva como a notificação para a oitiva de depoimentos que elucidem o caso, requisição de informações e perícias, determinação de vistoria no local dos fatos, dentre outras diligências de cunho investigatório, todas elas coercitivas, cujo desacato implica em crime de desobediência (artigo 330 do Código Penal) e em outras sanções legais (artigo 10 da Lei 7347/85).
E a UIPA, como associação civil protetiva, possui atuação limitada na área. Ao receber a notícia da suposta prática de maus-tratos, a entidade intervém, enviando carta elucidativa de que a conduta pode, em tese, configurar crime ambiental, oportunidade em que também orienta o responsável a respeito dos cuidados que devem ser ministrados concernentes à alimentação, à assistência veterinária, às condições de alojamento, à necessidade de exercícios, de afeto, de atenção, entre outras recomendações.
Casos há, entretanto, em que o responsável nem sequer permite o acesso ao local onde vive o animal para que se averigue a veracidade da denúncia. Muitas vezes, constata-se maus-tratos, mas o infrator resiste a qualquer pretensão da UIPA.
Assim, a opção de ajuizamento de ação pela própria entidade mostra-se impraticável na maioria dos casos, não só por ser o Ministério Público o titular da ação penal, em sede da qual se apura o crime de maus-tratos, mas porque, mesmo na área cível, medidas gravosas como a busca e apreensão não são deferidas pelo Judiciário sem a apresentação de provas robustas, impossível, legalmente, de serem colhidas por uma associação civil.
Tratando-se de prática de crime, incumbe ao Poder Público, por suas autoridades, apurar e punir as condutas que coloquem em risco a vida e a integridade física dos animais, seres tutelado pelo Estado, inclusive por norma constitucional( artigo 225,§1º, inciso VII).
Muitas representações são indeferidas sob a alegação de que a tutela aos animais dá-se na esfera penal, e não na cível, o que é questionável, já que a Promotoria Cível dispõe de meios céleres para solucionar os casos de maus-tratos.
Ocorre que não se pode aplicar o mesmo procedimento a todas as denúncias de maus-tratos. Se o animal já foi a óbito, ou se já está sob a guarda de uma associação protetora, resta apenas a possibilidade de punição do infrator, ainda que sob as brandas penas apontadas pela vigente legislação processual penal. Mas se o animal ainda encontra-se em poder do denunciado, a tutela mais adequada dá-se na área cível, que dispõe da possibilidade de colher provas e propor ao infrator a celebração de um termo de compromisso de ajustamento de conduta para forçá-lo a ministrar ao animal os cuidados necessários, ou entregá-lo para adoção, o que parece bem mais razoável, e eficaz, do que permitir que lhe sobrevenha o pior para, posteriormente, dar início à persecução penal do autor do malfeito.
Por vezes, ao indeferir a representação, a Promotoria do Meio Ambiente determina que seja instaurado inquérito policial. Tal medida, entretanto, só se mostra acertada se o animal não mais encontrar-se em sofrimento. Vale dizer que a efetiva defesa, real propósito das normas protetivas, não se verifica sem o livramento da situação aflitiva à que estão expostos os animais vitimados por sevícias. Como a integridade física e mental do animal não resiste à morosidade com que são conduzidos os raros inquéritos policiais instaurados para apurar práticas de maus-tratos, é forçoso concluir que desatende-se à legislação vigente.
Prova disso é o fato de a UIPA ser oficiada pelo JECRIM -Juizado Especial Criminal- cerca de dois anos após ter noticiado o caso de maus-tratos às autoridades. Ora, as denúncias relatam casos graves como submissão a espancamentos, privação de alimento, de abrigo das intempéries e de assistência veterinária. Por óbvio que animal algum resistirá a dois anos em tal situação!
Punir o suposto infrator, que já se sabe, será beneficiado pela transação penal, não efetiva a proteção do animal, que constitui o verdadeiro espírito da lei; é preciso salvaguardá-lo por outros meios.
Também entende a Promotoria de Justiça do Meio Ambiente que não há interesse de agir nos casos de maus-tratos, o que só se verificaria diante da ocorrência de dano ambiental, cuja proporção atinja interesses difusos e coletivos, e não apenas de um espécime, individualmente considerado. Em tais casos, segundo esse órgão, a competência seria criminal. Esse entendimento, contudo, limita ao oferecimento de denúncias criminais a atuação do Ministério Público da Capital, cuja atribuição é bem mais ampla, inclusive nas áreas administrativa e cível, à medida que pode expedir notificações, instaurar inquérito civil e propor ação civil pública, como prevê o artigo 129 da Constituição da República.
É de cunho constitucional, vale lembrar, a atribuição do Ministério Público de proteger o meio ambiente, do qual faz parte a fauna, inclusive a doméstica.
Diga-se o mesmo quanto à obtenção de mandado judicial para busca e apreensão do animal, pois muito embora uma associação civil detenha legitimidade processual para propor certas demandas, a maioria dos casos reclama procedimentos investigatórios e colheita de provas possíveis apenas em sede de inquérito, civil ou policial.
Mediante a notícia de maus-tratos com animal, salvo honrosas exceções, as autoridades não se valem das ferramentas que possuem para salvaguardá-lo, como por exemplo, representar ao juiz, pleiteando a busca e apreensão para evitar o padecimento e morte do animal no curso do inquérito.
Ainda há outra questão. Com muita freqüência, a UIPA é avisada da permanência de animal em situação de perigo ou de maus-tratos, em casa abandonada, ou fechada, cujo morador está ausente, em virtude de viagem, de prisão ou de mudança.
Trata-se de animais em situação de abandono, sob privação de água, de alimento e de cuidados de higiene, quando não expostos a situações ainda mais gritantes de perigo concreto. Mas os agentes públicos, como policiais civis e militares ou agentes vistores do Centro de Controle de Zoonoses, recusam-se a invadir a casa, permitindo que os animais sofram morte agônica, sem socorro algum. Nega-se vigência à Constituição da República, que em seu artigo 5º, inciso XI, enuncia:
“A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.”
Nem se diga que a invasão está autorizada para prestar socorro a humanos, e não a animais porque não é dado à autoridade restringir texto constitucional, sobretudo se tal restrição vem em detrimento dos animais, já tutelados pela mesma Constituição, em outra norma, que consigna, justamente, a incumbência do Poder Público de vedar as práticas que os submetam à crueldade. Se a norma não distingue, não pode o intérprete distingui-la.
A invasão não ocorre nem mesmo diante da constatação de tratar-se de casa abandonada, apesar de não configurar invasão de domicílio adentrar casa abandonada.
Por sua complexidade, a questão demanda uma atuação conjunta entre entidades protetoras e autoridades.
Pelo interesse público da sociedade que clama pela defesa dos animais, em virtude da legislação pertinente que lhes deveria garantir a proteção e pelo repúdio moral que merece a sujeição de animais a sofrimento, o quadro aqui delineado aconselha uma reconsideração do Ministério Público frente à questão, de forma a permitir uma execução mais efetiva e célere das normas vigentes.
É o que se espera do insigne órgão que atua como fiscal da lei e curador do meio ambiente.