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PREOCUPAÇÃO

Tutores param de alimentar animais com produtos industrializados por medo de intoxicação

Grupos cobram informações sobre marcas que teriam usado substância tóxica; governo não sabe origem de contaminação

18 de setembro de 2022
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Foto: Arquivo Pessoal | Franklin Oliveira

Tutores de animais de diferentes regiões do país estão parando de dar alimentos industrializados aos animais por medo de intoxicação. A mudança de hábito passou a acontecer, principalmente, após a Record TV Minas revelar a morte de cães causada por uma substância contaminada em petiscos da marca Bassar Pet Food.

A analista de recursos humanos Dayany Ghiggi está na lista. Ela explica que a decisão ocorre pela “falta de informação”, já que os órgãos públicos ainda não esclareceram se outros fabricantes também usaram em suas linhas de produção os dois lotes de propilenoglicol contaminados, vendidos pela Tecno Clean. A empresa é a mesma fornecedora de matéria-prima da Bassar Pet Food.

“Temos medo pelos nossos animais e até mesmo por nossa saúde, pois sabemos que esse produto também pode ser usado em alimento para humanos”, desabafou a moradora de Itapema, cidade do litoral norte de Santa Catarina.

Dayany é tutora de dois cães e uma gata. Em agosto, Luna, sua shih-tzu de um ano e seis meses, morreu. O óbito aconteceu seis dias depois do animal consumir um snack da Bassar Pet Food. A analista de recursos humanos conta que os sintomas começaram um dia após a ingestão do produto. Ela só relacionou o seu caso com a possível intoxicação após assistir à reportagem sobre as outras mortes pelo Brasil.

“Ultimamente eu tenho feito comida e receitas de petiscos caseiros que aprendemos na internet”, explica a tutora.

Em Belo Horizonte, capital mineira, o ambientalista e ativista da causa animal Franklin Oliveira também tomou a mesma decisão. “Eu tenho dado aos cães e gatos comida natural e biscoito de água e sal”, contou.

Oliveira cuida de 42 animais, que são direcionados à adoção. Ele conta que idenficou em sua casa dois pontes com petiscos feitos com propilenoglicol. O ativista afirma que vai entregar o material à Polícia Civil. Até então, os cães e gatos eram alimentados com produtos doados por apoiadores da causa animal, mas a rotina mudou nos últimos dias.

“Agora estou conferindo todas as caixas. Por precaução, não vou dar nenhum alimento que contenha o propilenoglicol”, afirmou.

Um grupo de tutores de cães intoxicados está organizando uma petição que será enviada ao MPMG (Ministério Público de Minas Gerais) pedindo que o órgão cobre dos entes públicos e privados a lista de possíveis compradores da substância contaminada.

Foto: Arquivo Pessoal | Dayany Ghiggi

Órgãos oficiais

Apesar da preocupação levantada pelos tutores, o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), que está à frente das investigações, afirma que “não orientou a suspensão do uso de produtos que contenham propilenoglicol na sua formulação”.

A interdição aplicada pelo órgão é referente apenas aos lotes AD5053C22 e AD4055C21 de propilenoglicol vendidos pela Tecno Clean e aos produtos da Bassar, que foram todos recolhidos do mercado “cautelarmente”.

O Ministério, no entanto, não informou se outras fabricantes de alimento humano e animal compraram parte do carregamento contaminado.

“Até o momento, as investigações ainda não determinaram a origem do aditivo utilizado. O Mapa determinou que fabricantes de alimentos e mastigáveis indiquem os lotes de propilenoglicol existentes em seus estoques e seus respectivos fabricantes e importadores, e realizem análises em produtos que contenham o propilenoglicol em sua composição”, pontuou o órgão federal.

Abinpet (Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação) declarou que está apoiando o Mapa na divulgação do caso e está orientando seus associados a “rastrear os últimos lotes para verificar se as substâncias sob investigação foram utilizadas”. “Em caso de suspeita de contaminação, os lotes devem ser recolhidos”, completou.

A associação informou que as empresas devem fazer a notificação de possível contaminação diretamente no Ministério da Agricultura.

A associação foi perguntada sobre a orientação que dá aos tutores que temem contaminação com produtos de outras marcas. “Nossa recomendação é que os consumidores consultem o SAC das respectivas empresas, para saber mais informações sobre o respectivo lote do produto adquirido. E fiquem atentos às informações divulgadas tanto pela empresa quanto pelo Mapa”, declarou.

Impasse nas vendas

Procurada, a Tecno Clean LTDA também não esclareceu se houve outros compradores dos lotes contaminados. A empresa declarou que comprou o produto com outra empresa, a A&D Química, de Arujá, na região metropolitana de São Paulo.

“Caso fique comprovado que a contaminação vem de tal produto, a falha deve ser procurada e entendida entre o importador e o fabricante”, declarou nota da Tecno Clean.

A A&D Química esclareceu que é revendedora e não fabricante do produto, mas não informou o nome da empresa da qual comprou o estoque de propilenoglicol negociado com a Tecno Clean.

A companhia ainda ressaltou que seus produtos “não possuem nenhuma destinação alimentícia, sendo destinados exclusivamente a fabricação de itens para higiene e limpeza, inclusive o produto denominado propilenoglicol”.

A A&D Química não esclareceu se informou à cliente sobre a restrição de uso do produto. A Tecno Clean não respondeu mais às demandas da reportagem.

Intoxicações

O caso foi relevado pela Record TV Minas no dia 26 de agosto. Tutores estimam que já passa de 100 o número de cães mortos e doentes em função do consumo de petiscos da empresa Bassar Pet Food. A companhia informou que está dando apoio às vítimas.

De acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a suspeita é que o propilenoglicol vendido pela Tecno Clean à Bassar Pet Food esteja contaminado com monoetilenoglicol, um anticongelante tóxico que não pode ser usado em produtos alimentícios. A substância é a mesma que causou mortes de clientes da cervejaria Backer, em 2020.

Um laudo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) identificou que um dos cães foi vítima de problemas ocasionados pelo consumo de monoetilenoglicol. O produto causa falhas renais e motoras.

Já o propilenoglicol é um solvente, geralmente, usado para manter a textura dos produtos e evitar o ressecamento. Além de petiscos para cães, pães, biscoitos, massas para bolos e sopas para humanos podem levar o ingrediente.

“O Mapa ressalta que o propilenoglicol é um produto de uso permitido na alimentação animal, desde que seja adquirido de empresas registradas”, declarou o Mapa.

 

Fonte: R7

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