Tubarões-de-cabeça-chata, predadores no topo da cadeia alimentar, mostram preferências por certos indivíduos e evitam outros, de acordo com novas pesquisas sobre tubarões em Fiji.
Eles atingem 3,5 metros de comprimento, pesam mais de 200kg e são predadores do topo da cadeia. Mas até os predadores-ápice precisam de amigos. E, de acordo com novas pesquisas, tubarões-de-cabeça-chata podem ser capazes de fazer amizades.
Um estudo publicado recentemente em Fiji mostra que os tubarões-de-cabeça-chata desenvolvem relações de companhia – com alguns tubarões mostrando preferências por certos indivíduos e evitando outros.
Pesquisadores estudaram dados coletados em mais de 3.000 mergulhos com tubarões na Shark Reef Marine Reserve (SRMR – Reserva Marinha de Recifes de Tubarão), um dos destinos de mergulho mais procurados do mundo. Os mergulhos se estenderam por 13 anos e observaram o comportamento de 91 tubarões-de-cabeça-chata individualmente, claramente distinguíveis por características externas, como cicatrizes e barbatanas deformadas ou ausentes.
Usando uma série de abordagens estatísticas, os pesquisadores procuraram padrões de associações entre tubarões que pudessem ser explicados por algum fator que não fosse mero acaso. E, de fato, os cientistas encontraram evidências inequívocas de que ocorrem associações de longo prazo.
“Alguns tubarões-de-cabeça-chata parecem preferir alguns indivíduos para os acompanharem no longo prazo e evitar outros”, disse o Dr. Juerg Brunnschweiler, pesquisador independente de tubarões da Suíça, que projetou o estudo.
“Trabalhar com o grande conjunto de dados de Fiji foi realmente emocionante e cientificamente importante, uma vez que há uma carência significativa nas pesquisas sobre o comportamento social dos tubarões-de-cabeça-chata”, disse o Dr. Thibaut Bouveroux, pesquisador de pós-doutorado do Laboratório Marítimo da Ilha de Dauphin, nos Estados Unidos e autor principal do estudo.
Bouveroux geralmente investiga como e por que os mamíferos marinhos criam laços sociais. Para este estudo, ele usou suas habilidades de análise de estrutura social e as aplicou aos tubarões-de-cabeça-chata de Fiji.
“Os dados disponíveis, coletados no longo prazo, nos deram uma oportunidade real de entender melhor se os tubarões-de-cabeça-chata são capazes de desenvolver vínculos sociais em um local com provisões e como estas relações foram afetadas ao longo do tempo”, disse ele.
A área de proteção marinha ao largo da costa da maior ilha de Fiji, Viti Levu, abriga oito espécies de tubarões e centenas de peixes. Tubarões-de-cabeça-chata, animais grandes e curiosos, que podem atingir até 3,5 metros de comprimento, são uma das principais atrações.
Os dados dos 3.000 mergulhos com tubarões foram registrados pela Beqa Adventure Divers, um centro de mergulho voltado para conservação, que opera na Ilha do Pacífico Sul desde 2003.
“A Beqa Adventure Divers vem mantendo um banco de dados que contém informações sobre todas as espécies de tubarões, dados comportamentais e muitos outros parâmetros descobertos em cada mergulho. É uma fonte rica de todos os tipos de informação”, disse Brunnschweiler.
No entanto, o fato de os dados terem sido coletados em mergulhos utilizando iscas – aqueles nos quais as empresas de mergulho colocam ração no oceano para atrair tubarões para o local onde irão mergulhar – deve ser levado em consideração ao analisar os resultados, alertaram os pesquisadores.
“A presença de tubarões-de-cabeça-chata na SRMR [Reserva Marinha do Recife de Tubarão de Fiji] é impulsionada pela agregação territorial causada pela alimentação oferecida pelas equipes de mergulho, por isso precisamos ter muito cuidado ao interpretar nossos resultados”, disse.
Se os tubarões aparecem juntos porque “gostam” uns dos outros, se eles apenas vivem nas proximidades ou se compartilham traços de caráter, como ousadia e curiosidade, o que os leva ao local dos mergulhos, não está claro.
“A principal ressalva é que não temos um local para funcionar como ‘grupo controle’”, disse Brunnschweiler. “Por exemplo, se temos dois indivíduos que são observados juntos no SRMR com maior ou menor regularidade, e se eles também aparecerem juntos em outro local com frequência igual ou semelhante que no SRMR, então isso tornaria nossos resultados muito mais robustos. E indicaria que há, de fato, algum nível de socialização nesta espécie.”
Mas Brunnschweiler disse que o estudo forneceu um ponto de partida sólido para o trabalho futuro. Ele está planejando desenvolver mais estudos em cima deste conhecimento com análises adicionais.
“Estudos futuros terão que identificar traços de personalidade individuais de tubarões, determinar como traços particulares podem influenciar a formação de grupos, construir uma hierarquia de tubarões-de-cabeça-chata para determinar posições, níveis hierárquicos e, em seguida, examinar a estabilidade desta posição social, ao longo do tempo.”
Ambos os pesquisadores advertiram sobre o risco de se fazer uma interpretação excessiva das suas descobertas.
“Os tubarões-de-cabeça-chata não podem ser considerados uma espécie social como mamíferos marinhos ou outras espécies terrestres, como elefantes ou chimpanzés. No entanto, parece que alguns indivíduos são capazes de desenvolver co-ocorrências ou afinidades preferenciais (e “desafetos”) com alguns indivíduos”, disse Bouveroux.
E enquanto tubarões-de-cabeça-chata formam relações de companhia, Brunnschweiler não aprova o termo “amizades” sendo usado em relação aos tubarões.
“Amizade é uma relação de afeto mútuo entre as pessoas. Não animais”, disse ele. “Seria antropomórfico falar de amizades aqui.”