Por Ana Cardilho
em colaboração para a ANDA
Muita gente acalenta sonhos que podem se resumir em: deixar de ser sedentário, sentir-se útil, receber amor sem limites, dar amor incondicional, sentir que faz parte de um grupo, que é aceito com seus problemas e defeitos, abandonar a tristeza existencial, vencer a depressão. A lista é grande e eu poderia enumerar mais e mais itens. Soluções? terapia, sempre. Mas, quer sentir uma melhora geral e rápida? Adote um orelhudo.
Ele pode ser peludo ou não, pequeno ou grande. Pode ser sem raça definida ou trazer algum título de nobreza. Pode ser menino ou menina, gostar de latir ou ser discreto. Adote um cachorro e eu garanto que você vai acabar se mexendo, caminhando rotineiramente, porque não vai resistir aos olhos de pidão do seu novo amigo, implorando por um passeio lá fora… “só uma voltinha, vai?!”. E garanto que você, por mais que tenha vontade de parecer uma pessoa fria e calculista, vai se render às lambidas de um cãozinho beijoqueiro e vai se apaixonar, vai amá-lo incondicionalmente.
Também vai receber um amor fiel, persistente, que se renova o tempo todo. E você vai se sentir especial quando chegar em casa e seu cachorro fizer aquela superfesta, como se não o visse há um ano e você fosse a pessoa mais esperada do mundo. Aliás, existe uma piada que diz o seguinte: “feche seu marido ou esposa no porta-malas de um carro junto com seu cachorro por 2 horas. Quando você abrir o porta-malas, quem te receber com beijos e festas é que te ama de verdade…”.
Piadas à parte, o amor que podemos devotar e receber de um animal é sério “pra cachorro!” Falo por mim mesma. Experiência própria. Quando acordo com a visão turvada, com a sensação de que tudo saiu do lugar, e a tristeza quer devorar minha perna esquerda, e a angústia já comeu meu braço direito, e eu nem tenho vontade de olhar no espelho, Lua Maria Branquela e Zoe Cristina, do país das Cristinas, minhas duas joias raras, me olham nos olhos. Bem lá dentro, sabe? E elas pulam em mim, me dão beijos forçados, farejam minha depressão, lambem minha cara como se dissessem que não é nada, não, apenas uma sujeirinha e elas estão tirando o baixo-astral de cima de mim.
Em segundos já estou rindo, por cócegas ou por achar graça das duas pituquinhas, dos malabarismos que reconheço que elas fazem pra chamar minha atenção. Dos beijos e lambidas, elas passam a se embolar sobre a cama numa clássica cena de lutinha… como se me dissessem: “tá vendo, nada é tão sério assim…”. Em seguida, elas começam a disputar um brinquedo qualquer, um pinguim caolho de pelúcia ou um coelho do qual elas já comeram metade de uma orelha… e tudo fica engraçado, mais leve, fica possível. Elas me passam uma energia boa para começar o dia. Isso sem falar na ternura que meu coração sente, e fica mole, mole, quando eu vejo as duas enrodilhadas em si mesmas, cochilando. É como se elas me pedissem: “me cobre, vai… me dá beijinhos, deita aqui comigo, me esquenta…”. Como resistir?
Adotar um cachorro é fácil e barato. Há várias ONGs sérias que podem ser encontradas com um clique no Google. Ou então, vá à esquina da sua casa e procure pelo pet shop mais próximo. Um veterinário sempre terá uma dica de lugar confiável para adoção de cães. Ah, você não quer ter um cachorro porque um dia ele vai morrer e você vai sofrer? É. Vai sim. Vai sofrer feito um cão sem tutor. Porque quando chega a hora de irem embora, dói mesmo. Mas, ao lado dessa dor, que nunca passa, você também terá lembranças das peraltices do seu cachorro quando era filhote, e das meias que ele comeu, e de como ele suspirava antes de dormir.
Eu já perdi um amor assim… Mas a alegria que sinto com Lua e Zoe, voando baixo dos quartos para a sala, me dá a certeza de que o coração humano pode ser imenso e nele cabem vários amores. Cada um com seu jeito peculiar, com suas graças. Mas todos são sempre bênçãos na nossa vida. E aí? O que você está esperando para ir conhecer sua melhor companhia, seu amigão, seu amor que não vai querer discutir a relação de madrugada? Eles estão por aí… Esperando você chegar para a festa começar!!
Ana Cardilho é escritora e jornalista. Com um olho na realidade e outro na prosa imaginária conta com mais de 20 anos de experiência em rádio e TV, tendo feito reportagens, edição e fechamento de telejornais e programas, e é ficcionista.