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ARTIGO

Tráfico de fauna no Brasil: “menor potencial ofensivo”, pouca investigação e raros presos

5 de dezembro de 2024
Dimas Marques
3 min. de leitura
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Foto: Ilustração | Freepik

A classificação das condutas ilícitas que formam o tráfico de fauna – já que o delito não está tipificado na legislação brasileira – como crime de “menor potencial ofensivo” é uma afronta ao combate a essa crueldade. O problema não se restringe ao grave fato de que os infratores, ainda que detidos em flagrante, sejam beneficiados com a possibilidade da transação penal – acordo feito com o Ministério Público em que o suspeito paga uma multa ou cumpre algum tipo de serviço social para que não seja aberto processo judicial.

A impunidade por si só já é grave. Afinal, o baixo risco de punição com perda de liberdade torna-se um incentivo ao criminoso.

Quando se classifica um crime na categoria dos de “menor potencial ofensivo” – que de acordo com a Lei nº 9.099/1995 são os que tem pena de detenção inferior a dois anos –, o delito não é investigado. Explico: se a autoridade policial interpretar o caso como um delito que se enquadra nesses casos, será elaborado um termo circunstanciado de ocorrência (TCO). Nesse documento, registram-se as declarações do suspeito, que serão analisadas pelo Ministério Público que, no caso de concordar com a interpretação da Polícia, oferece a transação penal.

Repare que não há investigação no caso. É bem diferente dos crimes em que a polícia judiciária (Polícia Civil e Polícia Federal) registra um boletim de ocorrência e instaura um inquérito para investigar o delito.

E o combate ao tráfico de animais no Brasil sofre com esse problema. O fato de a pena prevista ser inferior a dois anos de detenção (artigo 29 da Lei nº 9.605/1998), a maioria dos policiais ainda registra o caso por meio e TCOs – há exceções, como a Polícia Federal do Rio de Janeiro. Veja o que aconteceu, por exemplo, com o resgate de quatro macacos-prego (três deles filhotes) em na noite de 30 de outubro, em Pìraí (RJ), por uma equipe da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

O resgate 

De acordo com o registro da PRF, os policiais pararam um Grand Siena na altura do km 233 da BR-116 para uma fiscalização de rotina. Durante a checagem, um macaco adulto foi encontrado em uma caixa de transportes de animais no banco traseiro do veículo. No porta-malas, havia outros três primatas, todos filhotes.

Um dos três ocupantes do veículo teria afirmado haver comprado os animais de um homem chamado Danilo, vulgo Gordão. Os filhotes foram adquiridos por R$ 2.500 e o macaco adulto por R$ 1 mil. Sua intenção seria revendê-los no Rio de Janeiro (RJ) pelo valor de R$ 5 mil cada.

Os policiais elaboraram um TCO com base no artigo 29 da Lei nº 9.605/1998 e apreendeu somente os animais. Os suspeitos foram liberados com o veículo utilizado na prática criminosa (que não foi retido). A PRF informou que as informações seriam posteriormente passadas ao Ministério Público e ao Poder Judiciário.

Haverá investigação? Pouco provável. Será mais um caso em que ocorrerá transação penal.

E olha que há elementos que permitem o início de uma investigação, como o nome e o município onde o tal Danilo, vulgo Gordão, atua.

Quando fui informado sobre esse caso, havia ainda informações extra oficiais indicando que a equipe da PRF chegou a levar a ocorrência até a Delegacia de Piraí, onde o delegado de plantão não registrou o crime. A Polícia Civil do Rio de Janeiro foi questionada pelo Fauna News para saber se o delito chegou até a unidade policial, mas não houve resposta aos questionamentos. A PRF também não confirmou se a equipe que apreendeu os macacos chegou a encaminhar o caso até a delegacia.

No final de tudo isso, resta mais um crime sem investigação, com suspeitos de tráfico de fauna livres e podendo continuar comercializando ilegalmente animais silvestres.

Restam também legislação e procedimentos policiais que precisam ser melhorados.

Fonte: Fauna News

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