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ESPERANÇA

Trabalho de proteção ajuda a recuperar as palancas-negras-gigantes, espécie nacional da Angola

Quase extintas por conta da caça e de 27 anos de guerra, um projeto realizado desde 2003 ajuda a aumentar cada vez mais a população destes antílopes 

19 de setembro de 2024
Júlia Zanluchi
4 min. de leitura
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Foto: Pedro Vaz Pinto / Fundação Kissama

Apesar de raros, os avistamentos da palanca-negra-gigante representam um trabalho de recuperação de espécie que deu certo na Angola. O antílope é endêmico do país e está criticamente ameaçado, com uma população de apenas algumas centenas de indivíduos, mas sua história é um exemplo de sucesso na proteção, trazendo de volta à vida um animal que estava à beira da extinção.

De acordo com o biólogo angolano Pedro Vaz Pinto, a palanca-negra-gigante foi descoberta no início do século 20 e tornou-se o animal nacional da Angola. No entanto, devido aos seus impressionantes chifres, esses antílopes logo se tornaram alvo de caçadores.

Em 1975, tudo piorou quando uma guerra civil explodiu em Angola após a independência de Portugal. Nos 27 anos seguintes, o conflito devastou a fauna do país, incluindo a palanca-negra-gigante.

A guerra levou à caça intensiva pela carne e pelos chifres do animal. A perda de habitat e a falta de medidas de proteção agravaram a situação. “Inicialmente, ninguém sabia ao certo se a palanca-negra havia sobrevivido à guerra civil”, contou Vaz Pinto em entrevista à CNN.

Em 2003, após o fim da guerra, Vaz Pinto organizou uma pequena equipe para investigar se ainda havia palancas-negras. Eles pegaram uma van e dirigiram pelo Parque Nacional de Cangandala, no norte do país, onde moradores relataram avistamentos. Então a equipe instalou câmeras ao longo da área de 630 quilômetros quadrados.

Um ano depois, suas fotos provaram que existia uma pequena população. No entanto, como Vaz Pinto viria a descobrir, todas eram fêmeas. “Demorou um tempo até aceitar a realidade do que estava acontecendo; aquilo era uma extinção, um vórtice de extinção, acontecendo diante dos nossos olhos”, explicou o biólogo.

Logo depois, Vaz Pinto estabeleceu o Projeto de Conservação da Palanca-Negra Gigante para começar a proteger a espécie e aumentar sua população. Mas, para isso, precisavam de machos da espécie.

Apenas seguindo uma intuição, Vaz Pinto e sua equipe viajaram para a Reserva Natural Integral de Luando, um local mais afastado e biodiverso, conhecido habitat das palancas-negras-gigantes.

Em 2009, através de DNA coletado em amostras de fezes, eles identificaram que pelo menos um macho vivia na reserva. Vaz Pinto e sua equipe embarcaram em um helicóptero para iniciar a busca, decidindo focar onde a amostra foi coletada. “Enquanto nos aproximávamos do local, havia um macho de palanca-negra de pé exatamente no mesmo lugar”, ele recordou. “Foi como mágica, e nos dias seguintes encontramos mais seis machos.”

Um dos machos foi transportado de volta para Cangandala de helicóptero e colocado em um santuário cercado com as fêmeas para ajudar a reviver a população.

Situação atual

Hoje o santuário em Cangandala tem uma população de cerca de 100 animais, de acordo com Vaz Pinto, e ainda está crescendo. Sua equipe também monitora a população selvagem remanescente em Luando através de colares de GPS e drones.

“A área ainda sofre uma tremenda pressão de caça”, contou Vaz Pinto. “Temos cinco rebanhos de palancas, então tentamos mantê-los com um colar de GPS ativo o tempo todo para oferecer alguma proteção.”

Antes da independência de Angola, a população de palanca-negra-gigante era estimada entre 2.000 e 2.500 indivíduos. Restaurar essa quantidade levará tempo. “Acho que poderíamos estabelecer um objetivo de curto a médio prazo de trazer os animais de volta para 500, e talvez a médio e longo prazo para 1.000 ou 1.500”, pontuou Vaz Pinto.

O biólogo se orgulha de ter trazido o animal de volta da beira da extinção, mas permanece cautelosamente otimista sobre seu status. “É inegável que fizemos muito progresso, mas se pararmos, se não fizermos nada, tudo pode desmoronar.”

Vaz Pinto também é diretor da Fundação Kissama, uma ONG que foca na proteção da vida selvagem e na educação ambiental em todo o país. Seu colega Vladimir Russo diz que ensinar as pessoas locais e as gerações mais jovens sobre a importância da fauna é uma parte crucial para ajudar a proteger não só as palancas, mas todas as espécies.

“Realmente tentamos aumentar a conscientização por meio de workshops, trabalhar com as comunidades, diferentes instituições, e produzimos uma série de materiais, desde cartazes, folhetos, livros e jogos”, acrescentou Russo.

Olhando para o futuro, Vaz Pinto acredita que gestão, financiamento e treinamento são necessários para continuar restaurando a população da palanca-negra-gigante.

“É uma montanha-russa, com muitos contratempos, mas também muitos, muitos sucessos. Espero muito que o que estamos fazendo com a palanca-negra seja replicado em maior escala por todo o país”, finalizou o biólogo.

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