O rio da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Piagaçu-Purus corre pelas margens dos municípios de Beruri, Codajás, Coari, Tapauá e Anori, no Amazonas. E lá vivem os tracajás, uma espécie de tartaruga de água doce, em mais de 1 milhão de hectares.
Divulgada no dia (23), uma pesquisa realizada no local identificou que as tartarugas têm baixos níveis de mercúrio e, por isso, a área de proteção ambiental tem cumprido com seu papel: proteger a vida do ecossistema.
A pesquisa é resultado da dissertação de mestrado de Ândrocles Oliveira Borges, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), em parceria com Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).
Segundo Fabíola Domingos Moreira, pesquisadora do INPA e coordenadora do estudo, “nosso objetivo era verificar como estava a saúde desses animais e o quanto isso poderia estar sendo bom ou de repente muito ruim para as populações humanas que estão utilizando esses recursos”.
Ao verificar a saúde das tartarugas através da análise de níveis de mercúrio no organismo desses animais, a equipe constatou, em paralelo, a importância de áreas de preservação ambiental para a saúde de um ecossistema. “Nossa expectativa era que estivesse tudo bem e que a gente tivesse dados de base”, relata Fabíola, entusiasmada com os resultados.
Em comparação ao universo de pesquisas sobre o tema, a pesquisadora explica que grande parte dos estudos com tartarugas no mundo são com as espécies marinhas. Nesse sentido, Fabíola aponta aspectos inovadores na pesquisa de sua equipe que, além de investigar níveis de mercúrio em água doce, avaliou aspectos de saúde de tartarugas de vida livre e em ambiente natural. “É muito difícil de encontrar esse tipo de informação”, explica.
O estudo que analisou o material genético dos tracajás, levou em consideração a resposta do animal quando exposto a metais e outros poluentes, que é o ‘estresse oxidativo’, quando o organismo fica exposto a uma alta carga de poluentes, causando problemas na saúde do animal. A partir disso, a equipe investigou se havia danos em proteínas e no DNA das tartarugas e encontraram níveis muito baixos.
“Aparentemente, pelos parâmetros que a gente avaliou, as tartarugas estão com uma boa saúde e não há nenhum motivo de preocupação para as pessoas que se alimentam ali. Está tudo dentro da normalidade”, comenta Fabíola.
Mineração na Bacia Amazônica avança sobre rios, solo e gente
A Bacia Amazônica é uma região de grande impacto de atividades mineradoras e de geração de energia. Um estudo recente da Rede Ambiental Media constatou que 20% da água do território sofre impactos socioambientais negativos dessas atividades, com consequências para o meio ambiente e para os povos tradicionais, principalmente.
Para Fabíola, “já tem bastante estudo na literatura feito com reservatórios que mostra que tende a ocorrer um aumento, por exemplo, nas concentrações de mercúrio dentro desses ambientes”. Isso porque em locais com intervenção humana, através da construção de barragens e reservatórios, “têm um impacto grande no ecossistema, então toda a dinâmica daquele rio que estava correndo, que estava fluindo, é alterado, o rio para de correr constantemente, então forma um lago, e tudo fica completamente diferente do que era”.
Protegida por ser um tipo de Unidade de Conservação (UC), não há atividades identificadas de garimpo na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Piagaçu-Purus e, para Fabíola, esse é um dos motivos pelo qual foram constatados resultados positivos em relação à saúde daquele ecossistema. “As áreas protegidas realmente são muito importantes para a manutenção das áreas preservadas, que vão ficar íntegras, que não poderão ser alteradas, toda a fauna, toda a flora, as interações, os fluxos de água, sendo preservados para manter ambientes representativos de cada bioma”.
A pesquisadora lembra que a região é rica em minerais e, por isso, existe o mercúrio que é natural dos próprios solos da região. “Então a gente tem o que é natural e aquilo o que é produzido pelo homem, e isso vai chegando ao ambiente”.
Próximos passos
Os resultados da pesquisa foram tão importantes para o banco de dados do INPA que a equipe já vislumbra novos passos para aprofundar o estudo. Para isso, os pesquisadores têm como objetivo analisar um ambiente onde tem impacto humano, nas águas onde está localizada a Usina Hidrelétrica de Balbina.
Para fazer uma comparação mais precisa, Fabíola comenta que na região também vivem as tartarugas tracajás, em bioma de água doce, mas com a diferença de que é um ambiente alterado por ação humana. “Vamos coletar dados das tartarugas tracajá e da Amazônia para poder comparar com os dados da reserva e avaliar a saúde dos animais da hidrelétrica”.
As expedições para realizar estudos como esse custam cerca de R$30 mil. Segundo Fabíola, “o investimento na ciência realmente é fundamental”, pois é através de pesquisas como essa que a população tem conhecimento sobre os impactos socioambientais gerados pela atividade humana e a importância da preservação ambiental. Para a pesquisadora, os resultados de pesquisa científica são importantes “para que as pessoas consigam compreender que a floresta vale mais em pé do que no chão”.
Fonte: Ecoa