O Supremo Tribunal Federal (STF) colocou sob julgamento o Recurso Extraordinário (RE) 1.430.827, que vai definir se os estados brasileiros têm competência para autorizar a caça de espécies exóticas.
A discussão gira em torno da Lei estadual de São Paulo 17.295/2020, que autoriza o “controle populacional”, eufemismo frequentemente usado para a caça, de animais como búfalo, javali, javaporcos, tilápia, saguis e tambaquis. A justificativa apresentada é de que essas espécies representam riscos ao meio ambiente, à agricultura e à saúde pública.
Transformar o “controle populacional” em pretexto para legalizar a caça é extremamente perigoso. O problema das espécies invasoras é, antes de tudo, uma consequência direta da ação humana. Os responsáveis por retirar essas espécies de seus habitats naturais e introduzi-las de forma irresponsável nos ecossistemas brasileiros, agora quer ‘solucionar’ o problema com balas, armadilhas e mais violência.
O relator do caso no STF, ministro Flávio Dino, destacou a relevância do tema, citando estudos que apontam o risco dessas espécies à biodiversidade. O que fica em segundo plano na discussão jurídica é o reconhecimento de que a verdadeira “invasão” partiu de atividades humanas, como o tráfico de animais, a criação comercial mal planejada e a falha em controlar híbridos como o javaporco.
Chamar um animal de ‘invasor’ é ocultar a responsabilidade humana. Esses indivíduos são vítimas de um sistema que os tratou como mercadoria e depois os descartou no ambiente. Agora, são demonizados por tentarem sobreviver em um habitat que não é o seu. A caça é uma resposta simplista, cruel e que falha em abordar a causa raiz. É uma declaração de que nossa única ferramenta para a gestão ambiental é a matança.
Alternativas éticas e eficientes
O controle populacional deve ser realizado por meio de métodos não letais. A esterilização, o resgate e a realocação para santuários, e a criação de barreiras físicas são apontadas como soluções mais complexas, porém mais éticas e sustentáveis a longo prazo.
A caça, além de ser moralmente repugnante, pode ser ecologicamente contraproducente. Ela desequilibra ainda mais o ecossistema e não garante uma redução populacional eficiente, podendo até fragmentar grupos e aumentar as taxas de reprodução.
O julgamento no STF definirá os limites dos estados em uma política que, se autorizada, institucionalizará a matança de animais como resposta a um desequilíbrio ambiental. Para o movimento de direitos animais, a Corte tem a oportunidade de rejeitar a visão retrógrada da caça como ferramenta de manejo e forçar o poder público a investir em ciência, ética e compaixão para resolver um problema que ele mesmo criou.