A decisão de um comitê científico de classificar a coruja-das-neves como espécie ameaçada é mais um sinal preocupante das mudanças que estão moldando o Ártico canadense, segundo dois especialistas.
O Comitê sobre o Status da Vida Selvagem em Perigo no Canadá (COSEWIC), um órgão consultivo do governo federal, anunciou no início deste mês que está recomendando a mudança de status da emblemática espécie do norte, que também é a ave oficial do Quebec.
Essa recomendação foi encaminhada ao governo federal, que decidirá se incluirá a coruja-das-neves como espécie ameaçada sob a Lei de Espécies em Risco (Species at Risk Act).
Louise Blight, copresidente do subcomitê responsável pelas aves, afirmou que as observações da coruja-das-neves diminuíram cerca de 40% ao longo das últimas três gerações, ou 24 anos. Ela atribui essa queda às mudanças climáticas — além de ameaças diretas como atropelamentos e envenenamento.
“Essa espécie não apenas nidifica numa região com um dos climas que mais mudam no planeta, mas, quando migra para o sul no inverno, enfrenta ameaças adicionais — colisões, eletrocussões, envenenamento por rodenticidas e doenças como a gripe aviária”, escreveu Blight em um comunicado.
Blight, que também é professora associada adjunta na Escola de Estudos Ambientais da Universidade de Victoria, afirmou em entrevista por telefone que as mudanças climáticas estão reduzindo o gelo marinho, que as aves usam para descansar e caçar. Além disso, levaram ao aumento da cobertura de arbustos na tundra aberta onde a coruja se reproduz, e há indícios de que os ciclos populacionais dos lemingues — sua principal presa — também estão sendo afetados.
Ela disse que é difícil medir os impactos específicos das mudanças climáticas sobre as corujas, em parte porque as alterações no habitat estão ocorrendo muito rapidamente.
“Conversei com uma colega há alguns anos que trabalha no Ártico… e ela comentou: ‘o Ártico está mudando tão rápido que nem conseguimos acompanhar’”, disse Blight.
A coruja, segundo ela, é apenas uma entre muitas espécies que estão em declínio em “ritmos realmente preocupantes”, por diversos motivos, incluindo a alteração de habitat, espécies invasoras e mudanças climáticas.
“Considero todos esses fatores alarmantes em relação ao estado da natureza”, afirmou.
David Rodrigue, biólogo e diretor executivo do Zoológico Ecomuseum, a oeste de Montreal, disse que a recomendação do comitê deveria ser um “grito de alerta” para acelerar os esforços de proteção da biodiversidade no Canadá.
Ele afirma que o Quebec ainda não iniciou seu próprio processo formal de avaliação do status da ave oficial da província.
Rodrigue diz que uma decisão governamental de designar a espécie como ameaçada acionaria medidas para ajudá-la, incluindo a obrigação de criar um plano de recuperação e proteger parte de seu habitat.
Ele acrescentou que também é possível fazer mais para ajudar as corujas quando migram para o sul, como limitar o uso de certos venenos para roedores.
No Canadá, “ameaçada” significa que uma espécie provavelmente se tornará em perigo de extinção se nada for feito para reverter os fatores que estão levando ao seu desaparecimento.
Rodrigue disse que o Ecomuseum já cuidou de corujas-das-neves, e que os visitantes sempre se encantam com as belas aves brancas como a neve, que ganharam fama mundial após aparecerem na franquia “Harry Potter”.
“Elas são extremamente impressionantes”, comentou.
Rodrigue acredita que o declínio da população da coruja-das-neves envia um “sinal enorme” sobre a vulnerabilidade do Ártico, e que todos deveriam prestar atenção.
“O Ártico, de muitas maneiras, é extremamente importante, literalmente, para a sobrevivência humana também”, disse ele. “E nós não vemos o que está acontecendo lá. As pessoas não percebem que a situação está tão grave a ponto de espécies como essa estarem entrando em colapso.”
Traduzido Rocky Mountain Outlook.
