Um cenário de descaso se desenrola na Quadra 26 do Park Way, no Distrito Federal, mostrando a realidade de milhares de animais abandonados na capital do país. Karênina Silveira, uma moradora local encontrou uma cadela e seus filhotes em um estado de extrema vulnerabilidade e perigo, e desde então, tem lutado incansavelmente para que o poder público cumpra seu dever de resgate, sem o menor sucesso.
A chocante história de abandono desta família canina não é um reflexo doloroso da falência das políticas públicas de proteção animal no Distrito Federal.
Diante da urgência e da clara evidência de crime de abandono e maus-tratos – previstos em lei –, Karênina iniciou uma verdadeira via crucis em busca de ajuda oficial.
As tentativas de contato com os órgãos que deveriam ser a linha de frente na proteção animal, esbarraram em negativas categóricas. A resposta desoladora foi sempre a mesma: “não fazemos resgate”. Uma postura insensível e inaceitável que demonstra desprezo pela vida dos animais, considerados apenas mais “um problema na rua”. A omissão, neste contexto de sofrimento visível, é também um ato de desrespeito à própria legislação de proteção animal.
A esperança, ainda que frágil, se voltou para a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SEMA) do Distrito Federal, que abriga a Subsecretaria de Proteção Animal (SUPAN). Este órgão é formalmente responsável por formular e implementar políticas públicas voltadas para o bem-estar da fauna doméstica. Contudo, a prática contradiz a teoria de forma brutal: “Pesquisamos o que faz a SEMA/SUPAN, mas não descobrimos como alguém vem à rua para resgatar um animal”, relata Karênina, evidenciando a inexistência de um protocolo claro, um canal efetivo ou uma equipe realmente operacional para resgatar animais em situação de risco iminente nas vias públicas.
Com a inércia estatal, o resgate e acolhimento recai, mais uma vez, sobre os ombros exaustos dos protetores de animais independentes e das poucas ONGs que resistem no DF. Esses seres humanos dedicados, movidos unicamente pelo amor e compaixão, atuam no limite do esgotamento físico, emocional e financeiro. Muitos não têm mais condições de acolher uma nova vida, pois seus abrigos estão superlotados e os recursos – dependentes majoritariamente de doações – são cada vez mais escassos, justamente pela ausência de um apoio institucional consistente e de políticas públicas eficazes de resgate e manutenção. Karênina tem buscado apoio desses protetores, mas a dificuldade é imensa devido à sobrecarga geral.
Um milhão de vidas invisíveis
Os números são estarrecedores e confirmam a urgência da situação. Segundo estimativas da Confederação Brasileira de Proteção Animal (CBPA), baseadas em dados do IBGE, mais de 1 milhão de animais vegetam nas ruas do Distrito Federal. Milhares de vítimas da indiferença, vivendo à mercê da fome, da sede, de doenças, atropelamentos, violência e das intempéries, invisíveis aos olhos da maioria e, lamentavelmente, aos olhos do poder público que deveria protegê-los.
As campanhas de castração são importantes e necessárias para o controle populacional a longo prazo, mas se tornam insuficientes e até cínicas quando a ponta mais cruel do problema – o resgate imediato e o acolhimento digno dos milhares que já sofrem nas ruas – é completamente ignorada. Sem uma política robusta e operacional de resgate e destinação (abrigos públicos adequados, programas de adoção massivos), os números de animais abandonados no DF continuarão a crescer exponencialmente, perpetuando o ciclo de crueldade.
Quem cobrar
A indignação de Karênina e de todos que testemunham essa realidade é um grito por justiça: “Quem devemos cobrar? Onde está o governador do Distrito Federal diante dessa calamidade? E os deputados distritais que se elegeram ou se posicionam como defensores da causa animal?”, questiona a moradora, visivelmente frustrada. “A negligência é evidente e cobra um preço alto em sofrimento animal.”
Enquanto cada cidadão consciente faz a sua parte, denunciando, auxiliando com doações e, quando possível, resgatando por conta própria, a solução estrutural e a ação emergencial em grande escala são deveres intransferíveis do Estado. A pergunta que ecoa nas ruas do Park Way, onde a cadela e seus filhotes lutam para sobreviver, é a mesma de milhares de outros animais abandonados em todo o DF: Quem virá resgatar? Até quando o poder público do Distrito Federal se omitirá diante de tanto sofrimento inocente?
A visibilidade deste caso, buscada por Karênina junto à imprensa, é um apelo desesperado para que a ação aconteça antes que seja tarde demais para esta e outras famílias de cães e gatos abandonados.
A Agência de Notícias de Direitos Animais – ANDA – continuará acompanhando este e outros casos de descaso e crueldade, cobrando das autoridades a ação que a lei, a ética e a compaixão exigem. A vida e a dignidade de mais de um milhão de animais abandonados no DF clamam por uma resposta imediata, eficaz e humana do Estado.