Enquanto a maioria dos moradores de Brisbane se preparava para a chegada do ciclone tropical Alfred, um grupo de entusiastas da natureza vivia um momento único: a oportunidade de observar aves marinhas raras, trazidas à costa pelos ventos intensos. No entanto, a emoção de ver de perto espécies que normalmente habitam o oceano foi acompanhada por um sentimento de tristeza, já que muitas dessas aves chegavam exaustas e em condições precárias.
Durante o fim de semana, observadores de pássaros se reuniram nas margens da Baía de Bramble, nos subúrbios de Shorncliffe, Sandgate e Redcliffe, equipados com telescópios e câmeras. A cena era incomum: aves marinhas, algumas incapazes de voar ou andar, caíam em quintais suburbanos, longe de seu habitat. Para muitos, foi um evento memorável, mas também um lembrete dos impactos devastadores que ciclones podem ter sobre a vida selvagem.
As aves marinhas, embora adaptadas a ambientes extremos, sofrem profundamente com tempestades como o ciclone Alfred. Incapazes de pousar ou encontrar alimento em meio ao oceano revolto, muitas ficam exaustas e são arrastadas para centenas de quilômetros no interior, onde raramente sobrevivem. Aquelas que têm sorte são resgatadas e encaminhadas para centros de reabilitação.
Um desses locais é o Twinnies Pelican And Seabird Rescue, gerido pelas gêmeas idênticas Paula e Bridgette Powers, na Sunshine Coast. Nas semanas seguintes ao ciclone, o centro recebeu dezenas de aves, incluindo espécies raras como o petrel-de-asas-pretas e o atobá-mascarado. “Estamos aliviadas por não termos sido diretamente atingidos, mas nos preocupamos muito com essas aves”, afirmam as irmãs, conhecidas por sua dedicação à vida selvagem.
As gêmeas, que completam as frases uma da outra e falam em uníssono, descrevem o desafio de reabilitar aves debilitadas. Um atobá-mascarado resgatado, por exemplo, chegou encharcado, tremendo e infestado de piolhos. “Sua impermeabilização estava comprometida”, explicam. “Quando perdem essa capacidade, leva tempo para recuperá-la.” As aves marinhas dependem de uma glândula de óleo na base da cauda para impermeabilizar suas penas, mas, em condições extremas, muitas não têm energia para realizar esse autocuidado.
Apesar dos esforços, nem todas as aves sobrevivem. “É difícil prever. Elas estão tão exaustas que qualquer coisa pode acontecer”, dizem as irmãs. “Mas pelo menos estão em um lugar seguro e quente, longe do oceano. Fazemos o possível para salvá-las.”
Uma janela para o oceano
Para o professor Richard Fuller, da Escola de Meio Ambiente da Universidade de Queensland, eventos como o ciclone Alfred oferecem uma rara oportunidade de estudar aves marinhas que normalmente permanecem distantes da costa. “Muitas espécies estão em declínio global, e esses eventos nos dão uma visão do que está acontecendo no oceano”, explica. “É uma chance única de coletar informações valiosas.”
Durante o ciclone, espécies raras como o albatroz-tímido e o petrel-de-tempestade-de-leach foram avistadas, este último registrado apenas uma vez antes em Queensland. “Tempestades são eventos naturais, e a mortalidade em massa faz parte da biologia das aves marinhas”, diz Fuller. “Mas também é uma oportunidade para observadores e cientistas.”
Uma experiência inesquecível
Para observadores de pássaros como Kye Turnbull, de 23 anos, o ciclone Alfred proporcionou uma experiência única. Ele passou o fim de semana inteiro em Bramble Bay, enfrentando ventos fortes e chuva torrencial para registrar as aves raras. “Foi o evento de observação de pássaros mais incrível que já vivenciei”, diz Turnbull. “Desde o ciclone Oswald, em 2013, eu esperava por algo assim. Finalmente aconteceu.”
No entanto, a experiência teve seu preço. Muitos equipamentos de fotografia foram danificados pelo clima extremo. “Vi muitas câmeras morrerem ontem”, brinca Turnbull.
Enquanto Brisbane se recupera do ciclone, a história das aves marinhas trazidas à costa serve como um lembrete da força da natureza e da resiliência da vida selvagem. Para alguns, foi um momento de fascínio; para outros, uma chamada à ação para proteger espécies vulneráveis em um mundo em constante mudança.