Quem analisa a trajetória do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, logo percebe que existe algo de errado em permitir que ele ocupe posição de chefia em relação às mais importantes questões ambientais do país. Em 2018, por exemplo, ele foi condenado por fraude no plano de manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Tietê.
À época, Salles era secretário de Meio Ambiente de São Paulo e beneficiou empresas de mineração e filiadas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) em detrimento do meio ambiente. Ainda assim, foi nomeado como ministro.
Ministro atende interesses contrários ao meio ambiente
De lá pra cá, ele apenas confirmou a que veio, e um dos exemplos mais recentes foi anistiar durante a pandemia de coronavírus fazendeiros que destruíram porções de Áreas de Preservação Permanente (APPs) da Mata Atlântica. A medida culminou em cobrança da Justiça Federal do Espírito Santo para que ele “apresente suas razões”.
No ano passado, a pedido do Ministério da Infraestrutura, Salles assumiu compromisso de reduzir as unidades de conservação federais de 334 para 267. Ou seja, 67 a menos, o que é preocupante considerando que no país a lista de espécies ameaçadas de extinção aumentou em 716, de acordo com a mais recente edição do Livro Vermelho da Fauna, publicado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.
Ainda sobre o ICMBio, Salles anulou a autonomia do órgão e fez o mesmo com o Ibama. Hoje, os dois atuam com inúmeras restrições quanto à fiscalização. Como consequência, o percentual de multas ambientais caiu em 34%, embora o Brasil tenha registrado em 2019 a maior perda de cobertura florestal dos últimos 12 anos, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Perseguição de funcionários e recorde de queimadas
Em abril deste ano, o ministro foi acusado de promover perseguição de funcionários contrários ao relaxamento nas fiscalizações do Ibama, o que culminou na exoneração de dois coordenadores – Renê Luiz de Oliveira e Hugo Ferreira Netto Loss.
Também foi com o Ministério do Meio Ambiente sob comando de Salles que o país bateu recorde de focos de queimadas – com 3.383 e 1.702 em março e abril de 2019, elevando o risco de extinção de 265 espécies – 180 da fauna, segundo dados do Inpe e da organização Fundo Mundial Para a Natureza (WWF-Brasil).
Além disso, de 1º de janeiro a 30 de setembro de 2019, Amazônia, Cerrado e Pantanal somaram 123.326 focos de queimadas, afetando muitos animais silvestres que viviam na região.
Em 2020, a situação não melhorou. Os alertas de desmatamento na região já cresceram 29,9% em março em relação a fevereiro, conforme dados do Inpe – o que significa que o Ministério do Meio Ambiente não está cumprindo o seu papel. Já em comparação com o mesmo período de 2019, o aumento foi de 51%.
Recursos do Fundo Amazônia em benefício de fazendeiros
Nesse caminho, de acordo com o Observatório do Clima, a combinação entre desmatamento e mudança climática pode reconfigurar radicalmente o mapa da Amazônia em 2050. A riqueza total de espécies de árvore pode cair em 58%, com quase metade delas sob algum grau de ameaça de extinção.
Em 2019, Ricardo Salles anunciou ainda que faria modificação nas normas do Fundo Amazônia para que os recursos fossem destinados a indenizar fazendeiros por desapropriações de terras em áreas de proteção ambiental. Essa medida, associada ao aumento do desmatamento e das queimadas na região, motivou Alemanha e Noruega, países que subsidiavam o fundo bilionário, a cancelarem o envio de recursos.
O Ministério do Meio Ambiente também se recusou em abril do ano passado a assinar um acordo global proposto pela ONU para limitar o uso de plástico, indo na contramão do Plano de Ação Nacional de Combate ao Lixo no Mar. Medida era considerada importante porque o Brasil é o 4º maior produtor de lixo plástico do mundo e recicla apenas 1%.
A favor da caça e do plantio de cana na Amazônia e no Pantanal
Vale lembrar também que quando Ricardo Salles concorreu à eleição para deputado federal em 2018, não sendo eleito, uma de suas bandeiras foi a defesa da caça. Não por acaso, foi exatamente depois que ele assumiu a pasta que foi estabelecida uma portaria autorizando o uso de armas brancas e cães na caça de espécies de animais consideradas exóticas ou nocivas – o que pode ser confirmado pela Instrução Normativa nº 12, de 25 de março de 2019.
E a lista não para por aí. Atendendo a um pedido do Ministério da Agricultura, Salles suspendeu a divulgação da lista de espécies aquáticas ameaçadas de extinção e acolheu em dezembro de 2019 uma medida provisória que institui um sistema de autodeclaração de regularização fundiária em áreas desmatadas, permitindo que grileiros ganhem direito de propriedade.
Agora o Ministério do Meio Ambiente está sendo confrontado pelo Ministério Público Federal do Amazonas quanto à libertação do plantio de cana-de-açúcar na Amazônia e no Pantanal, autorizado pelo decreto 10.084, de 5 de novembro de 2019, assinado pelo presidente Jair Bolsonaro.
Como ministro, Ricardo Salles também endossa a portaria 91/2020, criada em 5 de fevereiro deste ano, que libera a pesca em unidades de conservação administradas pelo ICMBio.
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