Trinta quilômetros separam Viena da pequena cidade de Gänserndorf, em direção à fronteira tcheca. A paisagem é de planície, chata como uma mão. É lá que mais de 40 macacos, os chimpanzés de Gänserndorf, que eram animais de laboratórios, agora são abrigados para sentirem-se em casa. O lugar é uma antiga reserva de animais selvagens a qual faliu há cinco anos. Agora não se encontra nada além dos macacos, cujo cuidado é financiado pela sociedade farmacêutica amerciana Baxter. Lá, a natureza parece ter recuperado seus direitos, uma vegetação invade os prédios abandonados. No meio do parque, encontram-se duas construções de madeira. É necessário vestir um macacão de plástico, luvas de proteção, capacete e um óculos de plástico. Os macacos são perigosos e estão machucados e perturbados. Além do mais, o cuidado deve ser reforçado pois são também portadores de doenças como AIDS e hepatite.
O visitante desconcertado se aproxima da primeira gaiola exclamando: “Bom dia!”. Sabemos que essas familiaridades não são apreciadas pelos chimpanzés. O primeiro destes pega uma maçã e a bate violentamente contra as barras. Seu vizinho tenta fazer uma vara e pode passá-la através das grades. “Distancie-se das grades!” ordena a cuidadora. “E sobretudo não interaja com eles, não tente fazer carinho, senão você poderá dizer adeus à sua mão.”
No vasto alto edifício de hangar, os gritos estridentes soam como uma declaração de guerra. Os chimpanzés de Gänserndorf odeiam os homens, e com razão. Estes macacos eram escravos da empresa Immuno, que os deixarou presos em jaulas apertadas durante anos. Foram então isolados na selva, e não querem mais ver homens portando vestimentas de proteção.
Os raios de sol jamais chegaram até eles, e nenhuma gota de chuva caiu sobre seus pelos. Eles viveram em um inferno elaborado por um próximo parente, o homem, cujos genes são 98,7% de parentesco. Porque os chimpanzés não são somente animais, mas também primatas, como nós, que têm consciência de si, se reconhecem em um espelho, possuem enormes capacidades de aprendizagem, conhecem a alegria e a dor, e até mesmo a guerra. Eles conhecem igualmente as formas de prostituição. Em poucas palavras: gente como nós.
Nós os veremos dentro dos zoológicos e eles nos farão rir. Porque o homem civilizado tem dificuldade em aceitar a fera selvagem que há dentro dele.
Em 2002, os chimpanzés deixaram o laboratório pela reserva de Gänserndorf. Eles vivem em grandes celas equipadas, feitas estruturalmente de troncos, palhas, cordas, pneus e baloiços. Eles aprenderam a viver em grupos, mas têm direito à uma apresentação individual: “Isidor, nascido em 1978 na África. Macaco de laboratório na Áustria de 1979 a 1999. Participou de duas campanhas de pesquisa sobre hepatite. Rói as unhas e treme em situações estressantes”, descreve uma ficha. Ou ainda: “Pumuckl, nascido em cativeiro no dia 10 de abril de 1982. Macaco de laboratório na Áustria de 1984 a 1999. Infectado pelo HIV no quadro das pesquisas.”
As cuidadoras que se ocupam deles não são rejeitadas pelos macacos. Elas os conhecem e vice-versa. Além disso, se um visitante se aventurar a encostar no ombro de uma cuidadora, o grupo fica furioso. Os macacos se jogam sobre a vitrine blindada, mostram os dentes e uivam assustadoramente no intuito de defender sua cuidadora. “Entre os chimpanzés, explica ela, ao contrário dos outros macacos mais pacíficos, o humor podese alterar em um segundo do calmo ao agressivo”.
Do lado de fora, caixas estão sendo construídas para que os chimpanzés possam ver o sol e respirar o ar fresco. O pinhal está sendo replantado e os campos se tornarão, em breve, um parque de lazer.
“Estes macacos deram sua vida ao homem. Hoje, nós temos o dever de os ajudar a envelhecer com dignidade”, afirma o site do projeto
Fonte: Courrier