Enquanto o Brasil se prepara para receber líderes mundiais para a COP30, em Belém, onde irão discutir estratégias e negociar esforços para conter as mudanças climáticas, é importante considerar os impactos das desigualdades sociais na crise climática. É o que mostra o relatório divulgado pela Oxfam nesta quarta-feira, cujos dados indicam que as emissões de gases de efeito estufa estão diretamente ligadas à renda: o 0,1% mais rico do planeta emite mais CO₂ em um dia do que metade da população em um ano.
Isso porque, enquanto os 50% mais pobres do mundo emitiram apenas 0,8 toneladas de carbono no ano de 2023, o 0,1% mais rico foi responsável por 298 toneladas emitidas. Isso significa que uma pessoa pertencente a esse grupo lançou mais de 800 kg de CO₂ na atmosfera por dia, contra 2 kg das classes mais baixas.
Com isso, o relatório mostra que o estilo de vida poluente dos super-ricos está contribuindo para esgotar o limite de emissões de CO₂ que a humanidade ainda pode liberar sem ultrapassar o aquecimento global máximo considerado seguro para o planeta. Se toda a população mundial emitisse como o 0,1% mais rico, o orçamento de carbono seria esgotado em menos de três semanas.
Os dados indicam ainda que esse número está aumentando nas últimas décadas. Desde 1990, a percentagem das emissões do 0,1% de super-ricos subiram 32%, enquanto a liberação desses gases entre os 50% mais pobres diminuiu 3%.
“A crise climática é uma crise de desigualdade. Os indivíduos mais ricos do planeta financiam e lucram com a destruição do clima, enquanto a maioria da população mundial paga o preço das consequências fatais do seu poder sem controle”, afirma Amitabh Behar, diretor-executivo da Oxfam Internacional.
As emissões ligadas aos bilionários aumentam ainda mais quando se considera que muitos deles investem em companhias altamente poluentes, que mantêm a dependência mundial de combustíveis fósseis. A Oxfam estima que os investimentos de um bilionário médio resultam em 1,9 milhão de toneladas de CO₂ por ano — volume de emissões equivalente ao de quase 10 mil voltas ao redor do mundo em um jato particular.
Além disso, quase 60% dos investimentos dos bilionários estão concentrados em setores com alto impacto climático, como petróleo, gás e mineração. Com isso, emitem, em média, duas vezes e meia mais carbono do que os investimentos incluídos no índice S&P Global 1.200. Somadas, as emissões das carteiras de apenas 308 bilionários superam as de 118 países juntos.
Crise climática no mundo
A Oxfam também demostrou que o lançamento de gases na atmosfera não é distribuído de forma igualitária entre os países. Em seu relatório, a organização cita um estudo realizado em 2020 por Jason Hickel que mostra que os Estados Unidos saem em disparada como maiores emissores, sendo responsáveis por 40% da crise climática.
Na sequência, vem a União Europeia, com 29% de responsabilidade pela emissão dos gases, seguida pelo resto da Europa (13%) e o resto do norte global (10%), enquanto o sul global fica com apenas 8%.
Não é a toa que maioria (86%) dos 0,1% mais ricos vive no norte global e produzem 6% de todas as emissões do mundo. Mas a pesquisa destaca que os super-ricos que vivem em países mais pobres também são responsáveis. No Brasil, a crise climática também pode ser relacionada à desigualdade.
“Os mais ricos, muitos deles ligados a setores poluentes, como o agronegócio, e à extração de recursos, emitem centenas de vezes mais do que a maioria da população, enquanto comunidades periféricas, indígenas, quilombolas e lideradas por mulheres negras arcam com as piores consequências. São elas que enfrentam enchentes, calor extremo e falta de serviços básicos, num claro exemplo de racismo ambiental”, destaca Viviana Santiago, diretora-executiva da Oxfam Brasil.
Como consequência, o relatório estima que as emissões do 1% mais rico do mundo devem causar 1,3 milhão de mortes relacionadas ao calor até o fim do século, além de gerar US$ 44 trilhões em danos econômicos a países de baixa e média renda até 2050. Com isso, populações que estão entre as que menos contribuíram para a crise climática serão mais impactados pelos seus efeitos.
A Oxfam calcula que, para que o aquecimento global não ultrapasse o limite máximo de 1,5 °C, o 1% mais rico da população mundial precisaria reduzir suas emissões per capita em 97% até 2030 — e o 0,1% mais rico, em 99%.
Para isso, Behar destaca a importância de combater o lobby em importantes conferências como a COP 30. Na COP 29, que aconteceu no Azerbaijão, em 2024, foram concedidas 1.773 credenciais a lobistas dos setores de carvão, petróleo e gás, segundo a Oxfam — mais do que o número total de representantes dos 10 países mais vulneráveis ao clima.
“Precisamos quebrar o controle dos super-ricos sobre a política climática: taxar suas fortunas, proibir seu lobby e colocar as populações mais afetadas no centro das decisões”, concluiu o diretor-executivo da Oxfam Internacional.
Fonte: O Globo