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Quando o dever é a defesa dos animais, não pode haver censura

14 de março de 2011
8 min. de leitura
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Elisabete de Mello
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Recentemente, a proteção animal tomou conhecimento da existência de medida indenizatória proposta por parte da promotora da Festa do Peão do Boiadeiro em Rodeios em face da PEA – PROJETO ESPERANÇA ANIMAL.

Sinto-me à vontade para comentar o assunto, inclusive, com fundamento no Código de Processo Civil que autoriza ao Estado e a toda coletividade, não só a comentar ou tratar do tema, mas, a intervir diretamente na referida ação judicial, ¨verbis¨:

Art. 50. Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no processo para assisti-la.

Parágrafo único. A assistência tem lugar em qualquer dos tipos de procedimento e em todos os graus da jurisdição; mas o assistente recebe o processo no estado em que se encontra.

O interesse é o dever de proteção dos animais por parte de toda a coletividade (Art. 225, CF).

O litígio em questão pode ser abordado sob o prisma de diversos dispositivos legais e constitucionais que estão presentes em nosso ordenamento jurídico e todos nos levarão a conclusão da existência de crueldade nas arenas de rodeios.

Vejamos;

O interesse público

Tenho teclado esta nota ao estudar a questão pertinente à falha governamental que se traduz na substituição de organizações não governamentais, ativistas ou ambientalistas no papel que o Estado tem de cumprir de proteção da fauna e da flora.

A PEA  (PROJETO ESPERANÇA ANIMAL) tem a qualificação de uma sociedade de interesse público, cujo certificado foi fornecido pelo Ministério da Justiça (OSCIP).

Mas, ainda que assim não o fosse, autorizado na CF, Artigo 225, caput, indiscutível que seus objetivos culminam com uma organização deste escalão. Em seu sítio na internet, constatar-se-á que a PEA tem como causa a ¨proteção ao meio ambiente e a biodiversidade¨, como objetivo ¨contribuir para propiciar harmonia entre os seres humanos e as diversas espécies do planeta¨,
adotando como missão ¨transformar o cruel tratamento que os animais e o ambiente recebem nos dias de hoje¨.

Entenda o caso;

A sentença

Resumidamente, segundo consta na sentença judicial que está disponibilizada no Portal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, sucintamente, que a promotora de evento titulado por rodeios ¨aduz que é responsável pela maior e mais importante Festa do Peão de Boiadeiro do Brasil e a ré tem enviado diversas mensagens e e-mails aos patrocinadores do evento afirmando que há a prática de maus-tratos aos animais. Alega que a ré tenta coagir as empresas à não patrocinarem os rodeios. Acrescenta que o réu tem enviado e-mail com imagens de rodeios, que não foram feitas em Barretos e provavelmente foram gravadas nos Estados Unidos, atribuindo tais imagens à Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, com o objetivo de vincular tal festa aos maus-tratos de animais, o que não ocorre na Festa de Barretos¨.

Em defesa a PEA – PROJETO ESPERANÇA ANIMAL, ¨apresentou contestação (fls. 131/159), aduzindo que se dedica à defesa da fauna brasileira, sem finalidade lucrativa e que não enviou mensagem de conteúdo ilícito, nem praticou qualquer ato tendente a inviabilizar o evento promovido pelo autor. Alega que apoia eventos culturais, inclusive a Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, porém não compactua, tolera ou admite maus-tratos a animais. Ressalta que não divulgou qualquer notícia específica ou dirigida ao autor ou ao evento por ele promovido. Acrescenta que se refere genericamente a todos os rodeios que usam apetrechos para provocar o animal e utiliza a imagem de rodeios internacionais para exemplificar a crueldade¨.

Nenhuma das partes produziu perícia técnica (CPC, Artigo 333, parágrafo único, incisos I e II), cuidando de que fosse realizada durante a realização do evento ou na seqüência da utilização do animal, tão logo terminem as modalidades competitivas.

Conseqüência, embora não tenha tido acesso direto à documentação anexada nos autos (laudos), pelo que se compreende da leitura da sentença, o laudo apresentado pelos OS INDEPENDENTES não sustentaria as alegações tecidas em sua petição inicial e contraria o que a própria divulga em seu portal na internet (CPC, Artigo 333, inciso I).

A magistrada de primeiro grau declarou a procedência da ação condenando a PEA ¨a pagar ao autor clube OS INDEPENDENTES uma indenização por danos morais que fixo em R$ 1.245,00 (mil duzentos e quarenta e cinco reais), corrigida monetariamente de acordo com a Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, desde a publicação desta sentença, crescida de juros de mora de 1% ao mês, contados desde o evento, e condeno ainda a retirar a Festa do Peão de Barretos do rol de festejos que pratica crueldade contra animais, com proibição de notícias generalizadas sobre o assunto, salvo se houver expressa referência quanto a posição adotada pelo autor; além de proibir a divulgação dos patrocinadores da festa, passada ou futura, bem como o de manter contatos com propósito de desestimular o incentivo. Em caso de descumprimento da obrigação, fixo multa diária no importe de R$5.000,00 (cinco mil reais). Condeno ainda o réu ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$2.000,00 (dois mil reais), nos termos do artigo 20, § 4º do Código de Processo Civil¨.

O acórdão

Nenhuma das partes se mostrou satisfeita com o resultado da sentença e ambas apelaram da decisão.

A ementa: Colisão de direitos fundamentais – Entidade não governamental que atua na proteção dos animais versus promotor de tradicional rodeio (Festa do Peão de Barretes) – Conflito que surge em razão de publicações sobre crueldades que se praticariam na arena, seguidas de abordagens diretas aos patrocinadores do evento com o propósito de persuadi-los ao cancelamento da parceria – Inadmissibilidade – Exercício abusivo do direito de agir em favor dos animais – Intervenção necessária do Judiciário para adequar pronunciamentos da entidade à verdade, evitando que seu site se transforme em instrumento de opressão e de boicote de uma atividade que transformou a festa em cultura popular e polo da economia municipal – Dano moral in re ipsa – Provimento, em parte, dos recursos (Desembargador Relator Enio Zuliani).

Indicarei alguns pontos do acórdão, pois, a decisão de segundo grau, ao elevar a pena aplicada à PEA, equiparando a atividade da organização à função de imprensa, se fundamenta em posta divulgação através da internet de ¨falsa impressão de o tradicional rodeio do interior paulista organizado pelo autor corporificar o ícone da prática de crueldade contra animais que são utilizados na festa e nas competições de montaria¨.

Consta também na contraditória decisão que ¨não existem indícios que favoreçam a tese de presunção de atrocidades ou crueldades, porque o rodeio é naturalmente bruto e causa ferimentos nos animais e nos peões , tanto que, freqüentemente, são relatados acidentes fatais. Há uma violência inerente à própria essência do que começou como brincadeira e ganhou status de esporte de gosto internacional, e não seria permitido, a pretexto de proteger o ser humano do perigo de certas atividades esportivas ou de entretenimento, impedir a participação deles. Os animais figuram nesse espetáculo como coadjuvantes, e basta a aquiescência dos donos deles para regularizar-lhes o ingresso nas arenas. Não há como impedir isso, salvo se for demonstrada uma crueldade que repugna os instintos dos que possuem sensibilidade normal para com os direitos dos animais¨.

Que ¨não se provou que o sedém que é manuseado no local, embora possa provocar a ira que dá ares acrobáticos ao show de montaria, não machuca o animal ou lhe causa dano irreparável¨.

Além de contraditório, demonstrando uma indiscutível suspeição em relação aos direitos dos animais, pois, coloca o interesse econômico acima da proteção estabelecida no Artigo 225, da CF, o Desembargador Relator do recurso questiona: ¨O que o PEA deseja: que se receba o boi com flores e afagos?¨

O Desembargador reconhece a existência de atrocidades ou crueldades para com todos os que atuam na arena dos rodeios (peões e animais), mas, ampara a violência, o que é inadmissível e retrata uma lamentável decisão.

Para convencer a todos, então, sob o prisma da decisão proferida no Tribunal de Justiça, dos maus-tratos a que expostos, basta que nos lembremos de um touro se investindo com toda a sua fúria contra um toureiro para agir em defesa própria em razão das provocações que recebe na arena: vencer ou morrer.

Se os membros do Tribunal de Justiça amparam a visível violência existente nas arenas de rodeios, então, o Judiciário nos coloca em um campo de batalha, diante de um grave litígio, resultando em que a violência permanecerá impune e poderá ser praticada também fora das arenas, de que estamos diante de uma guerra em que a premissa maior é vencer ou morrer.

Notícias no Supremo Tribunal Federal

E a Corte Maior noticiou que OS INDEPENDENTES, “embora sem negar o uso de animais e de artefato que os fazem corcovear, postulou que a Justiça impusesse um ‘cala boca’ pelo mero exercício do direito de crítica, impedindo-a de exercer sua atividade” (Notícias do STF de 22/02/2011).

A liminar concedida pelo Ministro Joaquim Barbosa

Objetivando suspender os efeitos da decisão que lhe é desfavorável, a PEA distribuiu reclamação que levou o número 11292 no Supremo Tribunal Federal, obtendo a concessão da almejada tutela:

¨Em julgamento monocrático sujeito à confirmação do Plenário, parece-me que o acórdão reclamado proibiu que uma determinada opinião fosse veiculada e, ao fazê-lo, violou o entendimento exposto por esta Corte na ADPF 130.

Mais: ao proibir a divulgação de opinião, o acórdão evidentemente prejudica toda a coletividade, criando véu de silêncio sobre prática social cujo questionamento é legítimo (ver, em contexto assemelhado, utilizado aqui apenas como exemplo, o caso farra do boi: RE 153.531, rel. min. Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ 13.03.1998).

A medida liminar justifica-se diante do dano difuso que a censura provoca.

Ante o exposto, defiro a liminar para suspender os efeitos do acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo nos autos da apelação 994.09.335664-7¨.

Quero te convencer que isto é cruel.

Não compre ingressos de rodeios.

Não patrocine evento violento.

| Assista | http://espanol.video.yahoo.com/watch/4280099/11500296 |.

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