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AVE NATIVA

Proteger espécies é proteger ecossistemas: conheça o caso do bicudo

10 de fevereiro de 2025
Juliana Perdigão
3 min. de leitura
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Foto: Flávio Ubaid

Ele nunca conseguiu esconder sua presença: pousava nas veredas e entoava seu canto raríssimo, flauteado, numa melodia perfeita, que passeava livre e solta por 32 notas. Pois foi essa música natural que tornou a espécie um alvo. Os bicudos foram sumindo do seu habitat na Bahia, no Centro Oeste e em Minas Gerais por serem valiosos em torneios de canto. Essas competições existem de forma regularizada por todo o país.

Em Minas, os últimos grandes grupos foram vistos lá pelos anos de 1980 nas regiões de Cerrado, como me contaram os moradores que vivem perto do Parque Grande Sertão Veredas. Os bicudos foram capturados para se tornarem pássaros de cativeiro, em criatórios legalizados, até desapareceram da natureza.

Essa história começou a mudar com iniciativas como o Projeto Bicudo, que tem como lar uma unidade de conservação particular em Januária, no norte de Minas Gerais. Nessa reserva, biólogos, veterinários e outros pesquisadores recebem os pássaros, acompanham a reprodução e fazem a reintrodução da espécie na natureza. Mas para isso, é preciso haver um bioma preservado.

O Projeto Bicudo no sertão de Minas Gerais

O bicudo gosta das áreas úmidas do Cerrado. O território dele é nos arredores de brejos, de veredas do sertão, porque é nesses locais que ele tem o alimento preferido: as sementes do capim navalha. Algumas regiões foram testadas para abrigar o Projeto Bicudo, até encontrarem a RPPN Porto Cajueiro, uma Reserva Particular de Patrimônio Natural em Januária. Além das veredas, a unidade de conservação da Usina Coruripe é grande, com difícil acesso, o que possibilita mais segurança para os pássaros.

Conversando com o biólogo Gustavo Malacco, um dos coordenadores do projeto, ele contou que os bicudos chegam à unidade vindos das apreensões feitas pela polícia ou pelas doações de parceiros que criam de forma legalizada. Os pássaros passam por uma bateria de exames, depois por um período de adaptação dentro dos viveiros e, por fim, são levados para o pareamento dos casais.

A parceria com os criadores legalizados é fundamental. Ao doar os casais de aves eles possibilitam que os bicudos possam ser vistos na natureza de novo. Se os viveiros do projeto tiverem apenas fêmeas, não há como fazer a soltura na natureza. É preciso esperar a doação de bicudos machos para que sejam soltos juntos e se reproduzam.

Os bicudos ainda estão na lista de pássaros ameaçados de extinção porque a maior parte está nos cativeiros. Cerca de 180 mil estão em criatórios legalizados. É um trabalho de resiliência e paciência, mas que já celebra vitórias.

Minas se tornou um dos únicos locais no Brasil onde o bicudo voltou a voar livre na natureza. Nos últimos dois anos, 120 bicudos foram soltos na reserva, 15 filhotes já nasceram no cativeiro do projeto de conservação e, em breve, vão voar pelo Cerrado.

Proteger espécies é proteger ecossistemas porque todas têm um papel na teia da vida. Quando salvamos uma espécie, salvamos rios, matas, todas as formas de vida, incluindo nós mesmos.

Fonte: Diário do Comércio

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