A Comissão de Meio Ambiente da Câmara cancelou ontem (14) a votação do projeto de lei que autoriza a caça esportiva de animais silvestres após uma forte pressão feita por ativistas em defesa dos direitos animais e parlamentares favoráveis à causa animal. A sessão, que avaliou 24 propostas, foi marcada por discussões e classificada como a “pauta do fim do mundo”.
O PL 5544/2020, de autoria do deputado federal Nilson F. Stainsack (PP-SC), recebeu várias críticas e foi obstruída pela oposição. O principal alvo das críticas foi a presidente da comissão, Carla Zambelli (PSL-SP), que foi massivamente citada nos últimos dias nas redes sociais por conta da influência do seu arbítrio na decisão da medida.
O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) fez questionamentos diretos à Zambelli. “Aqui a comissão (do Meio Ambiente) parece que virou comissão da defesa das causas daqueles que defendem Bolsonaro”, afirmou o deputado, que ainda disse que “nada do que foi votado aqui foi para proteger o meio ambiente”.
A presidente da comissão se defendeu dizendo que “em nenhum momento” falou em legalizar a caça e advertiu que os parlamentares estavam atrasando a apreciação dos outros projetos.
“Sejamos mais razoáveis, estou recebendo ameaça de morte em redes sociais porque estão dizendo que eu quero a caça de onça e pantera. Eu abomino a caça de certos animais”, disse Zambelli, menosprezando algumas espécies de animais.
“Vai caçar dentro de um parque urbano?”, gritou um deputado.
“Retira o projeto”, retrucou outro parlamentar.
“Vocês não querem votar nem os projetos que são bons?”, questionou a deputada com um ar irônico.
“Os senhores são irresponsáveis de colocar a minha foto no Twitter. Se alguma coisa acontecer comigo ou com o meu filho, que recebeu ameaça de morte, eu vou atrás de cada um dos senhores”, prometeu Carla, se referindo a uma publicação na internet.
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O relator e deputado Nelson Barbudo (PSL-MG) deu parecer favorável ao projeto, mas tirou a matéria da pauta do dia. Ele alegou que 90% dos países de primeiro mundo realizam legalmente a caça de animais e ironizou: “mas no Brasil não pode ter”. No Brasil, por lei, a caça só é permitida em casos de controles populacionais de espécies consideradas invasoras, como o javali europeu. No entanto, é importante frisar que esses animais chegaram ao país em razão da ação humana, eles não estão invadindo qualquer território, são apenas vítimas.
“Nós não estamos querendo liberar a caça seus hipócritas, nós queremos legalizar a caça”, exaltou Barbudo em uma insinuação de que só está faltando aprovar a lei para dar continuidade a uma prática já existente, que ocorre de forma indiscriminada e ceifa a vida de milhares de animais da fauna brasileira. Depois de um intenso debate, ele aceitou o acordo de seguir com os outros projetos da sessão “respeitando a democracia”.
O líder da oposição, o congressista Fred Costa (Patri-MG), alertou para as ofensas de Barbudo contra a deputada Tabata Amaral (PSB-SP). O ruralista pediu várias vezes para a representante calar a boca. “Eu pedi desculpa”, disse Barbudo.
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“Não a caça, não a matança”, contrapôs Costa. Tabata Amaral exigiu o respeito do relator. “Me manda ficar quietinha, pianinha. Eu, enquanto mulher, jovem, deputada federal, muito bem votada por sinal, exijo respeito e exijo que esse senhor se comporte melhor da próxima vez”, afirmou a deputada, destacando que a obstrução é legítima.
Após vários desentendimentos e deliberações de ambos os lados, a reunião foi suspensa e os deputados informaram que foi feito um acordo para programar a discussão para outra data. Haverá também uma audiência pública para discutir os impactos que essa medida provoca na fauna e flora brasileira. Dessa forma, a previsão é que a votação do PL aconteça em 2022, e irá depender de um novo presidente do colegiado para definir a pauta.
A proposta
O projeto de lei 5544 que permite a caça esportiva de animais silvestres, foi apresentada pelo parlamentar Nilson F. Stainsack (PP-SC) no ano passado. Conforme apresenta o projeto, para se licenciar e atuar como caçador esportivo, o cidadão deve ter mais de 21 anos e ser registrado como Colecionador, Atirador e Caçador (CAC).
Uma reportagem do jornal O Globo realizada em 2020, aponta que nos últimos dez anos a comunidade Colecionador, Atirador e Caçador aumentou 737%, evidenciando um súbito aumento a partir da gestão de Bolsonaro, em 2019.
A medida prevê uma taxa de licença no valor mínimo de R$250, e presume que os recursos captados com o licenciamento da caça, ironicamente, serão utilizados para fomentar programas de conservação das espécies em risco de extinção. Pecuaristas também podem solicitar a permissão para praticar a caça contra animais de fazenda dentro das propriedades rurais, contanto que apresentem o certificado de registro de posse da arma de fogo.
O projeto deixa em aberto a relação das espécies que poderão ser caçadas, criando uma brecha para que animais em perigo de extinção componham a lista. Uma pesquisa realizada em 2019 pelo IBOPE, apontou que 93% da população brasileira é contra a legalização da caça, evidenciando que a proposta não só vai em direção contrária dos interesses do povo, como também veio para beneficiar uma minoria presunçosa que tem o apoio federal para desmontar a pauta do meio ambiente e sobrepor seus interesses pessoais ao bem-estar animal e a preservação da natureza brasileira.