No final dos anos 70, quando ainda não havia trabalhos de conservação da vida marinha no Brasil, as tartarugas marinhas integravam a lista das espécies ameaçadas de extinção. O ciclo de vida complexo e longo, associado à pesca e à captura de fêmeas e ovos de tartaruga fazia com que as populações das cinco espécies encontradas no Brasil sofressem uma diminuição drástica.
Em comemoração aos 30 anos do Projeto Tamar no Brasil, as 23 bases de pesquisa existentes em nove Estados brasileiros farão, no próximo sábado, 10, às 16h30, a soltura simultânea de filhotes e de tartarugas adultas resgatadas e tratadas nas bases do projeto.
Este é o caso do Ceará, que é uma área que as tartarugas buscam para alimentação e desenvolvimento. Na base localizada na Praia de Almofala (município de Itarema) será solta uma tartaruga que, há quatro meses, ficou encalhada na Praia do Futuro, em Fortaleza. “A tartaruga foi recolhida pelo Centro de Triagem de Animais Silvestres do Ibama, que repassou a tartaruga para tratamento e reabilitação em nossa base. O Ceará é uma área que recebe tartarugas marinhas vindas da América Central e da África, onde ficam de dois a três anos para se desenvolver”, explica Eduardo Lima, engenheiro de pesca e coordenador regional do Projeto Tamar no Ceará.
Iniciado em 1980 no Rio Grande do Sul, o Tamar alcançou, entre 2009 e 2010, a marca de 10 milhões de filhotes nascidos sob a proteção do projeto. Um fato interessante é que, como as tartarugas atingem a maturidade sexual por volta dos 30 anos, os filhotes nascidos este ano fazem parte da segunda geração, filhos dos primeiros filhotes cujo ciclo foi garantido pela intervenção do Tamar, que hoje possui bases nos Estados da Bahia, Sergipe, Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina.
Educação ambiental
Além de trabalhar com pesquisa, conservação e manejo das cinco espécies de tartarugas marinhas que ocorrem no Brasil, o Tamar busca promover a conscientização ambiental. O resultado é que, a cada ano, cerca de 20 mil ninhos são protegidos, gerando aproximadamente um milhão de filhotes ao ano. Desde o início, as ações de conservação promovem também o envolvimento das comunidades litorâneas. Para tanto, foi decisivo o fomento de alternativas econômicas sustentáveis que gerassem renda e serviços diretos para cerca de 1.300 pessoas das populações costeiras, proporcionando melhorias na qualidade de vida. Com isso, os pescadores, que antes concorriam para o desaparecimento dessas espécies, passam a atuar também como agentes de preservação, ajudando as equipes a preservar os locais de desova e alertando quando uma tartaruga fica encalhada na praia.
Mas, apesar dos êxitos conquistados, ainda há preocupação quanto ao futuro dessas espécies. Atualmente, as principais ameaças à tartaruga marinha são a pesca, o consumo de tartarugas e seus ovos na alimentação e a poluição nos mares. Além disso, a ocupação desordenada da costa brasileira ameaça as áreas de desova e alimentação dessas espécies, comprometendo seu ciclo de vida.
O coordenador do Tamar no Ceará relata que os tratamentos de uma tartaruga resgatada podem durar dias ou meses, com acompanhamento de um veterinário. “E mesmo com todo o cuidado e carinho das equipes, não há garantia de que a tartaruga se recupere”, admite.
“O que se percebe no litoral brasileiro é que o número de encalhes vem crescendo. Apesar de marinha, a tartaruga tem respiração pulmonar e precisa subir à superfície. Assim, ela acaba morrendo quando fica presa em anzóis ou redes de pesca”, diz Eduardo Lima.
Outro problema apontado por ele é o lixo jogado no mar, principalmente o plástico, que é confundido pela tartaruga com comida. “O lixo que ela ingere acaba perfurando o sistema digestivo, causando constipação. Mesmo quando conseguimos resgatar um animal que ingeriu lixo, dificilmente ele sobrevive. Este é um dos maiores problemas encontrados quando há encalhe de tartaruga marinhas no litoral brasileiro”, adverte.
Litoral cearense favorece ciclo de vida
Criada em 1992, a base do Projeto Tamar no Ceará foi montada em Almofala, praia do Litoral Oeste localizada a cerca de 240 quilômetros de Fortaleza. Apesar de as áreas de desova costumarem ter maior visibilidade por conta da soltura dos filhotes promovidas anualmente pelo Tamar, as áreas de alimentação e desenvolvimento são de extrema importância no ciclo de vida seguido por essas espécies marinhas.
A região cearense é considerada pelos pesquisadores uma importante área de alimentação, descanso e corredor migratório para as espécies de tartarugas marinhas que passam pelo litoral brasileiro.
As cinco espécies encontradas no País utilizam o litoral cearense como área de alimentação e desenvolvimento. São elas: a tartaruga aruanã ou verde (Chelonia mydas), a cabeçuda ou mestiça (Caretta caretta), a tartaruga de couro ou gigante (Dermochelys coriacea), a tartaruga de pente (Eretmochelys imbricata) e a tartaruga oliva (Lepidochelys olivacea).
Em Almofala, a função do Tamar é garantir e monitorar o desenvolvimento das tartarugas adultas que aqui aportam, promover a proteção das tartarugas em parceria com a comunidade e atender casos de tartarugas encalhadas ou feridas no litoral cearense. “Quando uma tartaruga é encontrada, é transportada para a base do Tamar em Almofala. Aqui é realizada uma avaliação e, a partir desse momento, o animal recebe o tratamento indicado para o problema que ele apresenta, com acompanhamento de veterinário”, explica o coordenador regional do Tamar, Eduardo Lima. Enquanto não podem ser devolvidas ao mar, as tartarugas são mantidas em tanques e, quando se recuperam, costumam ser expostas no Centro de Educação Ambiental mantido pelo Tamar em Almofala.
O contato com os exemplares em recuperação permite sensibilização da comunidade e ajuda a ampliar a preservação das tartarugas. “O apoio da comunidade é essencial para que possamos garantir a sobrevivência das tartarugas marinhas”, ressalta ele.
Desafio
O principal desafio da base cearense do Tamar é proteger os animais capturados incidentalmente em currais de pesca, redes de espera para peixes e caçoeira para lagostas, utilizados tradicionalmente pelas comunidades que trabalham com a pesca artesanal. Antes da instalação da base do Tamar, todas as tartarugas marinhas aprisionadas acidentalmente eram mortas. Hoje, são devolvidas ao mar, pela equipe do projeto, com a ajuda dos pescadores, que são diretamente envolvidos na preservação.
Mais informações
Base do Projeto Tamar no Ceará
Praia de Almofala, Itarema
(88) 3667.2020
www.tamar.org.br
Fonte: Diário do Nordeste