Um projeto de lei que autoriza o sepultamento de animais domésticos no cemitério da cidade de Poá (SP) tem causado polêmica. A proposta, que já foi aprovada pela Câmara Municipal e segue para sanção do prefeito Francisco Pereira de Sousa, determina que animais, como cães e gatos, poderão ser enterrados nos mesmos jazigos que os tutores. O prefeito já disse que não pretende autorizar a medida com a alegação de que é preciso maior debate com a população. Autor do projeto, o vereador Deneval Dias do Nascimento (PRB) se defende. “Nossa preocupação é tentar solucionar problemas. Deixei o projeto durante 30 dias em todas as pet shops da cidade perguntando se as pessoas aprovam ou reprovam e consegui quase 300 assinaturas a favor da lei.”
Cumprindo seu sétimo mandato no Legislativo de Poá, Deneval diz que parte da inspiração veio das grandes manifestações de junho. “Estamos sempre procurando onde melhorar, mas depois das manifestações ficou evidente que é necessário inovar em todas as áreas”. O projeto entrou em votação na última terça (5) e foi aprovado com oito votos a favor, quatro contra e quatro abstenções.
O vereador argumenta que a cidade não oferece atualmente nenhum serviço do tipo. “Este é um assunto que também está sendo discutido na Câmara de São Paulo. A população não tem destino para dar para os animais aqui em Poá. O município tem 17 quilômetros quadrados e praticamente não tem zona rural. Conheço gente que saiu com enxada para enterrar o cachorro e não achou onde cavar. Não é obrigatório enterrar no cemitério e não vai ter custo nenhum”, afirma.
O principal argumento são os laços emocionais que o tutor cria com seus animais. “Eu conheço pessoas que choram quando o animal está doente, dá banho todo dia e diz ‘vem pro papai, vem pra mamãe’. Vai dar um suporte para esse pessoal dar um final digno para seu animalzinho”, conta o vereador, que diz também ser tutor de um cão que, quando chegar a hora, será sepultado conforme seu projeto de lei.
A dona de casa Waldicléa Costa da Cruz é tutora de uma pinscher chamada Mel que é a xodó da casa. “Eu e meu marido não temos filhos. Ela representa tudo pra gente. A gente brinca, leva no parque”, afirma. Ela diz ser a favor do sepultamento de animais, mas de uma maneira um pouco diferente. “Eu ia gostar de que ela fosse enterrada no cemitério, mas é bom ter um espaço próprio para eles.”
Dona de uma banca de jornal na região central de Poá, Ana Maria do Nascimento está sempre acompanhada da basset Nina é do cão sem raça definida Nininho, que tem até uma casinha ao lado da banca. “Todos os cachorros que eu já tive eu mandei cremar porque não tinha onde enterrar. Eu acho válido, mas é uma coisa a se pensar. Tem que ver se os outros membros da família vão concordar em ter o cachorro enterrado no jazigo. Eu acho que deveria ter um lugar só para eles”, afirma.
Alternativas
De acordo com o médico veterinário Marcos Massao Hossomi, a destinação dos animais domésticos ainda é um assunto pouco discutido. Na clínica particular onde Hossomi trabalha, em Mogi das Cruzes, os clientes são orientados a contratar um serviço especializado em sepultamento e cremação de animais. “Há cerca de cinco anos temos uma parceria com um cemitério de animais, em São Bernardo do Campo. Fora esse sei que existe também outro no Parque do Carmo. Porém, por não ser algo tão comum o serviço acaba sendo um pouco caro. Por isso, muitas pessoas acabam enterrando os animais em qualquer lugar.”
O veterinário alerta que o sepultamento inadequado de animais domésticos pode ser um risco tanto para a saúde quanto para o meio ambiente. “Não recomendo enterrar em qualquer lugar, pois todo corpo em decomposição libera substâncias que podem infiltrar no solo e contaminar água de poços e até o lençol freático”, explica. “Essa proliferação de bactérias pode causar nas pessoas, entre outras coisas, intoxicação e diarréia”, diz Hossomi.
O veterinário ainda explica que não existe uma legislação específica que fale sobre a destinação de animais domésticos e, por isso, as clínicas veterinárias não podem impedir que o tutor leve seu animal embora, mesmo morto. “Não temos como obrigá-lo a aderir ao serviço ou então segurarmos o animal. Não existe uma lei específica sobre isso. O que fazemos é orientar. Existem meios de destinação mais apropriados e seguros, mas quando o cachorro morre de alguma doença perigosa e contagiosa frisamos bem o risco. Nesses casos, 100% das pessoas optam pela cremação.”
A crescente relação afetiva com os animais domésticos, nos últimos tempos, segundo Hossomi, tem feito aumentar a procura por esse tipo de serviço. “Hoje em dia as pessoas tratam os animais como se fossem da família. E o sepultamento ou a cremação se tornam uma forma de prestar uma homenagem para aquele que sempre acompanhou a família”, conta.
Fonte: G1