Cada vez mais pessoas estão aderindo ao veganismo, e isso é uma ótima notícia para os animais não humanos. Mas penso que, junto com a população vegana, não tem crescido a plena consciência dos valores e ideais da libertação animal. Digo isso porque é notável o número de vegans que, por meio de seu ódio e preconceito a muitos seres humanos e sua rejeição enfática e agressiva a causas de libertação humana, têm jogado no lixo os princípios dos próprios Direitos Animais.
Têm sido muitos os vegans defensores de ideias de direita marcantes pela hierarquização, discriminação e dominação violenta contra bilhões de humanos e pela manutenção dos privilégios sociais de uma pequena parcela da humanidade. Muitas dessas mesmas pessoas têm apoiado também políticos e “pensadores” que se empenham na desvalorização dos Direitos Humanos, na restrição de direitos para minorias políticas e na conversão daquilo que deveria ser direito universal em privilégio de poucos.
Além disso, são muitos aqueles que insistem em promover misantropia, racismo, xenofobia (principalmente contra o povo chinês), machismo e misoginia, heterossexismo, transfobia, intolerância religiosa, capacitismo, etarismo e gerontofobia, elitismo e pauperofobia etc. e/ou admiram personalidades veganas, vegetarianas ou protovegetarianas que promovem abertamente um ou mais desses ódios (como Gary Yourofsky, Morrissey e Brigitte Bardot).
Também tem sido comum promoverem meios de “conscientizar” e “divulgar o veganismo” recheados de algum ou alguns desses preconceitos e ódios, como panfletos misóginos, propagandas veganas elitistas e discursos insensíveis às vulnerabilidades sociais de muitas pessoas.
Isso sem falar em gente do próprio meio vegano que chama manifestantes de rua de “vagabundos” e “baderneiros” esquecendo que têm sido cada vez mais comuns no mundo os protestos contra o especismo, se opõe a lutas sociais que contrariam os interesses dos grandes exploradores de animais (principalmente ruralistas da pecuária e capitalistas da indústria lacto-frigorífica), rejeita políticas públicas de inclusão social ignorando que elas podem ser essenciais para o próprio crescimento do veganismo, entre outras posturas que dão tiros de fuzil no pé da causa vegana.
São dignos de menção honrosa também os que declaram oposição explícita – o que muitas vezes inclui ódio – a bandeiras e movimentos de equidade e justiça ética e social, como o feminismo, o movimento negro, os militantes não heterossexuais, o movimento das pessoas trans, os movimentos anticapitalistas, o socioambientalismo, o campesinato, o defensor dos Direitos Humanos etc.
Alguns desses também utilizam falácias do espantalho (que consistem em atribuir ao lado criticado falsos defeitos e criticá-lo com base nos mesmos) contra quem defende a intersecção do abolicionismo animal com essas outras causas, na tentativa de justificar que pessoas que se dizem veganas tenham o “direito” de continuar odiando outros seres humanos e sendo reacionárias.
As pessoas que se enquadram nessas categorias não percebem, mas estão violando com severidade diversos dos princípios éticos do próprio veganismo abolicionista. Entre eles, estão:
– a oposição a hierarquias morais que dividam os seres sencientes em dominantes privilegiados e dominados sem direitos;
– o fomento de uma cultura de paz e igualdade moral;
– o combate a preconceitos que “justificam” desigualdades morais, entre eles o especismo;
– a oposição à manutenção de uma ordem desigual e injusta por meio da violência e de ideologias conservadoras;
– o ativismo por justiça, por direitos fundamentais iguais a todos os seres sencientes na medida do que cada um deles pode desfrutar;
– a rejeição a uma ordem baseada em dominar, aprisionar, explorar e assassinar;
– a oposição explícita a preconceitos “justificados” por arbitrariedades;
– a adoção da ética do respeito aos seres sencientes e aos seu interesses individuais vitais como princípio de vida.
E não notam também que estão obstaculizando o crescimento do próprio veganismo. Fazem isso ao propagar um veganismo socialmente excludente, rejeitar a educação dos não vegans em favor do ódio aos mesmos, desprezar a capacidade do ser humano de mudar de uma postura antiética a uma ética, desprezar (com ódio e preconceito) pessoas que poderiam estar sendo conscientizadas e ensinadas a aderir ao veganismo etc.
Quando conhecemos a postura dessas pessoas, percebemos o quanto é estritamente necessário se importar com as causas humanas, ou no mínimo respeitá-las e lhes aceitar a existência, caso queiramos levar a sério a libertação animal em seus ideais e princípios éticos. Sem preocupação ou respeito à libertação humana, nunca haverá libertação animal – e mesmo saber disso é essencial para que a abolição da exploração animal seja viabilizada no futuro. E não é preciso se obrigar a aderir aos movimentos sociais para se prestar esse respeito ao ideal da emancipação humana.