As queimadas estão afetando o habitat de aves e pássaros que ainda encontram nas áreas de mangue de Icapuí, no Ceará, o espaço para viver ou se “hospedarem”, em suas longas viagens. Três conhecidos pássaros nessa parte do litoral cearense correm o risco de desaparecer, e a população realiza a campanha aleatória e informal “Solte, não prenda o passarinho”, ou ninguém mais vai ver pelas bandas de cá graúna, cabeça-vermelha e corrupião.
Por sua composição de mangues, floresta, falésias e uma praia rica em matéria orgânica trazida da própria natureza pelas marés, Icapuí é reconhecido berçário de várias espécies de árvores e pássaros. Ainda. Mas o aumento da degradação ambiental tem causado a diminuição desses seres vivos, e ao menos por enquanto, o maçarico (Limosa lapponica) vindo do Ártico em direção à Patagônia, ainda escolhe esse pedaço da costa cearense (a única no Brasil) para pousar com maestria e elegância, com seu grande bico levemente curvado para cima. A cada nova viagem, as notícias não são nada boas para o maçarico.
E o que era comum gradualmente se revela raro na natureza icapuiense. Cadê corrupião? Cadê graúna? Pássaros comuns, mas sumidos do cenário, não sendo vistos nem ouvidos. Os motivos principais: a natureza alterada pelo homem está afastando esses animais e, num acesso de posse, os pássaros são apreendidos em gaiolas, sequestrados dos ninhos para ficar entre paredes das casas, sítios, pousadas. A falta de senso de preservação está ameaçando a beleza de se ver e ouvir ao pôr do sol o grito rouco das garças no ninhal da Praia de Requenguela, localizada em Icapuí.
Nos blogs e escolas do município, tem início a campanha “solte, não prenda o passarinho”. O estímulo foi dado pelo vereador Marcos Nunes, da Câmara Municipal de Icapuí, que em seu blog e no plenário da Casa Legislativa, esbravejou que “a natureza de Icapuí pede socorro!”. Desmatamento, queimadas e captura desenfreada fazem as populações de graúna, galo-de-campina e corrupião diminuírem passo a passo na região.
Crianças e jovens
“É necessário que a população tome consciência do que estes danos poderão acarretar a esses animais da nossa fauna. É imprescindível conscientizar as crianças e jovens que utilizam alçapão para aprisionar estes bichinhos, quando não são sequestrados ainda nos ninhos de suas mães. É necessário coibir a sua comercialização e sobretudo é preciso fazer um trabalho de conscientização nas escolas, igrejas, associações, principalmente nos Sindicatos Rurais, ou em todos os lugares onde o povo esteja. O mais importante é que todos se envolvam na preservação e manutenção dessas espécies”, alerta Marcos Nunes.
O município de Icapuí apresenta vários ambientes costeiros, como manguezais e lagos, e até áreas florestadas sobre falésias, dunas vegetadas e praias arenosas com planícies de maré, e cada local tem suas aves típicas. Essa á e principal região das aves migratórias no Ceará. As principais áreas para observação de aves costeiras no município são Ponta Grossa, Matas de Tabuleiro, Banco dos Cajuais, Manguezal da Barra Grande e Córrego do Sal. A conformação geomorfológica das praias, aliada à dinâmica das marés, possibilita que se acumulem materiais trazidos pelas ondas, notadamente resto de algas e cascalhos, que abrigam invertebrados e, por sua vez, servem de alimento para as aves.
Sem preservação não há mangue, sem mangue não há tamatião, espécie de ave que se alimenta de caranguejos e peixes. Vive oculto nos mangues, mas em Barra Grande, Icapuí, pode ser avistado, com esforço. Mais facilmente, nem por isso de forma despreocupada, ainda se vê e ouve o cabeça-vermelha (Paroaria dominicana), corrupião (Icterus jamacaii) e a graúna (Gnorimopsar chopi), “ave preta” (em tupi), considerado um dos pássaros de voz mais melodiosa do Brasil.
Fonte: Diário do Nordeste