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SANTA CATARINA

Políticos tentam reduzir a Área de Proteção Ambiental da Baleia Franca; medida coloca diferentes espécies em risco

O enfraquecimento da proteção abre portas para especulação imobiliária, aumentando a poluição sonora e química que afeta diretamente a sobrevivência das baleias e de toda a fauna local.

25 de agosto de 2025
Júlia Zanluchi
4 min. de leitura
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Foto: Divulgação

Políticos de Santa Catarina querem retroceder e acabar com parte da Área de Proteção Ambiental da Baleia Franca (APA-BF), região protegida há 25 anos e principal habitat da baleia-franca-austral no país.

Com 156 mil hectares distribuídos ao longo de 130 quilômetros do litoral catarinense, a área protegida abrange nove municípios entre Florianópolis e Balneário Rincão. A porção terrestre ocupa 34 mil hectares, englobando lagoas, praias, planícies, costões rochosos e morros de Mata Atlântica, importantes para a sobrevivência de diversas espécies.

Entretanto, as deputadas federais Geovania de Sá, do PSDB, e Julia Zanatta, do PL, os senadores Esperidião Amin, do PP, Ivete da Silveira,  do MDB, e Jorge Seif, do PL, e o deputado estadual Volnei Weber, do MDB, querem diminuir a área de proteção. Três projetos de lei sobre a APA-BF apresentados por eles estão em tramitação no Congresso, sendo dois na Câmara e um no Senado.

Weber, por sua vez, é um dos líderes de uma comissão na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), que visa acabar com a área terrestre da APA-BF.

A justificativa dada pelos políticos é de que as restrições ambientais da área protegida impedem a regularização fundiária de famílias de baixa renda e comunidades tradicionais, mas, na realidade, os projetos não passam de uma manobra que pode liberar a área para especulação imobiliária, blindar empreendimentos de luxo e enfraquecer o poder de fiscalização ambiental.

Caso eles consigam acabar com a parte terrestre da área de proteção, nenhuma ação, construção ou atividade precisará da autorização do ICMBio, apenas do licenciamento do Instituto do Meio Ambiente do Estado de SC, o IMA-SC, e dos municípios. A medida também abre portas para a construção de prédios na região, que atualmente só permite construções de baixa densidade.

De acordo com Stéphano Diniz Ridolfi, chefe da APA da Baleia Franca e analista ambiental do ICMBio, ocupações antigas, como no caso das moradias de comunidades tradicionais e famílias de baixa renda locais, podem ser regularizadas. Apenas as casas de veraneio construídas recentemente na Área de Proteção Permanente (APP), caso de muitos imóveis de luxo na região, não podem ser regularizadas, mesmo se estiverem fora dos limites da APA-BF.

Rodrigo Freitas, professor e membro do conselho gestor da APA, o Conapa-BF, pela Universidade do Sul de Santa Catarina, a Unisul, diz que a redução da área protegida geraria riscos urbanísticos. “Enquanto existir a APA-BF, só se pode erguer construções de baixa densidade. Mas o plano é transformar tudo em grandes cidades, como Balneário Camboriú. E é contra isso que a gente se opõe. Sem a APA-BF, vamos ter um processo de verticalização em pouquíssimo tempo”, afirma Freitas.

Risco para os animais

A possível revogação da parte terrestre da APA da Baleia Franca é uma ameaça direta e imediata à sobrevivência da baleia-franca-austral. O aumento descontrolado da urbanização, com a consequente poluição sonora, química e luminosa, pode perturbar esses animais. O ruído subaquático, em particular, interfere na comunicação entre as baleias, essencial para a coesão social e a reprodução.

“O projeto de lei configura um grande retrocesso socioambiental, não somente pela recuperação da espécie Baleia-franca-austral nos últimos anos, mas também por descartar a relevância de uma área protegida que há 25 anos vem cumprindo uma Política do Estado Brasileiro na proteção e recuperação dos biomas Marinho-costeiro e da Mata Atlântica”, ressalta Ridolfi.

Todo o ecossistema marinho-costeiro sofreria um impacto catastrófico. A APA protege um mosaico de habitats interconectados que são refúgios indispensáveis para uma infinidade de espécies. A flexibilização das regras abriria caminho para a destruição destes berçários naturais.

Diversas espécies de aves migratórias e residentes, que dependem dos ambientes preservados para alimentação e repouso, perderiam seu santuário, assim como populações de golfinhos, que veriam seu território invadido por um tráfego marinho intensivo, aumentando o potencial para colisões.

A especulação imobiliária e a verticalização levam inevitavelmente à maior impermeabilização do solo, ao assoreamento de corpos d’água e à contaminação do mar por esgoto e resíduos. Isso degradaria rapidamente as áreas de alimentação das baleias, que se nutrem de krill e pequenos peixes, organismos extremamente sensíveis à qualidade da água.

O fim da autorização prévia do ICMBio, órgão especializado, significa que empreendimentos potencialmente devastadores poderiam ser aprovados por instâncias estaduais e municipais sob pressão econômica, sem uma análise técnica aprofundada do impacto cumulativo sobre a vida selvagem.

A medida é uma sentença para toda a biodiversidade que depende da faixa de costa protegida.

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