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TECNOLOGIA

Pesquisadores testam protetor solar que protege a pele e o meio ambiente

Buscam por matérias-primas naturais para desenvolver bloqueador solar evitando prejuízo ao meio ambiente

31 de maio de 2022
Vilhena Soares
7 min. de leitura
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Foto: Pexels

O protetor solar é indicado para pessoas de todas as faixas etárias, com a recomendação de que seja usado diariamente para evitar o câncer de pele, uma das doenças mais incidentes na população. Apesar dos benefícios à saúde, estudos científicos mostram que esse produto gera prejuízos ao meio ambiente, principalmente à fauna marinha. Na tentativa de equilibrar esses efeitos, pesquisadores internacionais buscam matérias-primas naturais que possam ser usadas em novas formulações desses tópicos. Os futuros bloqueadores poderão, inclusive, evitar outras complicações humanas, como o envelhecimento da pele.

A maioria dos produtos comercializados utiliza um bloqueador químico de raios ultravioleta (UV) chamado oxibenzona. Estudos recentes, porém, mostram que essa substância acelera a destruição de recifes de coral. “Vários estados e países já proibiram o uso desse químico e seus derivados para impedir os efeitos devastadores sobre o ecossistema marinho do mundo”, relata, em comunicado à imprensa, Kan Cao, professora do Departamento de Biologia Celular e Genética Molecular da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos.

Para evitar esses prejuízos ambientais, Cao e colegas resolveram testar o uso de um medicamento conhecido como um possível substituto do oxibenzona: o azul de metileno. Em experimentos laboratoriais, essa droga não tóxica, utilizada para tratar problemas médicos diversos, como envenenamentos e malária, foi aplicada em células de pele humanas de doadores jovens e idosos. Os pesquisadores constataram que o azul de metileno absorve os raios UVA e UVB como os filtros solares tradicionais e também ajuda a reparar os danos no DNA causados pela exposição ao Sol.

“Ficamos extremamente animados ao ver que os fibroblastos da pele derivados de indivíduos jovens e idosos foram protegidos do estresse celular com o auxílio do azul de metileno”, enfatiza Cao. “O mais surpreendente é que também descobrimos que a combinação de azul de metileno e vitamina C gera efeitos antienvelhecimento surpreendentes, particularmente em células da pele de doadores mais velhos, sugerindo uma forte relação sinérgica entre essas substâncias.”

Em uma segunda etapa, a equipe expôs as mesmas quantidades de azul de metileno e de oxibenzona a uma espécie de coral flexível: o Xenia umbellata. Os corais estavam em tanques isolados e tiveram o crescimento e as respostas à exposição a esses produtos químicos monitorados. Em menos de uma semana, os que estavam nos recipientes com oxibenzona sofreram um branqueamento (desgaste) drástico. Já os que tiveram contato com o azul de metileno não tiveram o mesmo prejuízo, mesmo com alta concentração da substância. Detalhes dos resultados foram apresentados em um artigo publicado na revista Scientific Reports.

Melissa Deuner, coordenadora do curso de farmácia da Faculdade Anhanguera, em Brasília, conta que o azul de metileno vem sendo estudado em várias pesquisas da área médica, obtendo bons resultados. “Esse artigo, agora, demonstra a eficiência como um fotoprotetor. E o mais importante é que ele torna o produto mais biodegradável. Em alguns países, já vem sendo reduzido o uso da oxibenzona e também de outro elemento químico usado nesses cosméticos, o dimetil PABA, devido aos vários prejuízos que eles causam à fauna e à flora aquática”, detalha. “Sem falar que eles podem ser um potencial cancerígeno para nossas células e até causar desequilíbrios hormonais.”

Deuner acredita que a busca por produtos farmacêuticos menos agressivos ao planeta vai se tornar ainda mais forte nos próximos anos. “Cada dia mais, empresas vêm se preocupando em produzir esses produtos. Estatisticamente, percebe-se que eles são mais bem vistos e aceitos pela população. Sem falar que, se todos contribuírem de forma positiva nessa questão, estaremos auxiliando a preservar a nossa sobrevivência”, explica. “Desejamos que esses estudos sejam ampliados e que desenvolvam fotoprotetores também orais. Assim, estaríamos dando um excelente salto ao auxílio ambiental.”

Do lixo

Uma oleaginosa muito consumida no Brasil também pode ser usada como matéria-prima de protetores solares, mostram pesquisadores sul-africanos. “Com as preocupações atuais sobre os absorvedores de raios UV em protetores solares e o seu impacto no ecossistema, buscamos encontrar uma maneira de produzir uma alternativa menos agressiva a partir do líquido da casca da castanha-de-caju, um recurso biorrenovável”, relata, em comunicado, Charles de Koning, pesquisador da Universidade de Witwatersrand e um dos autores do estudo, publicado na revista European Journal of Organic Chemistry.

Em experimentos com células de pele humana, a equipe testou várias versões de filtros solares com fenóis, substâncias presentes no líquido retirado da casca da castanha-de-caju. As moléculas mostraram uma alta absorção dos raios UVA e UVB, mas falta, segundo os cientistas, ajustar a quantidade de fenóis presentes na solução para gerar a proteção necessária à pele.

Koning também chama a atenção para o fato de a inovação médica usar produtos cujo destino nem sempre é ambientalmente sustentável. “Essas cascas são um resíduo descartado nas comunidades que produzem esse alimento, especialmente na Tanzânia. Então, encontrar uma maneira útil e sustentável de usar esse material é algo que pode ser muito vantajoso para nós e para o planeta”, enfatiza.

Solução que vem do mar

Foto: Pexels

Especialistas britânicos resolveram procurar candidatos a uma nova classe de protetor solar em compostos de algas marinhas. Após uma série de análises feitas com essas plantas, eles extraíram o aminoácido palitina, que é semelhante à micosporina (MAA), um elemento químico responsável pela fotoproteção de diversos organismos aquáticos.

“Os MAAs são compostos naturais produzidos em organismos que vivem em ambientes de águas rasas”, detalha Karl Lawrence, pesquisador do Instituto de Dermatologia do King’s College London e um dos autores do estudo, publicado no periódico British Journal of Dermatology.

Usando células da pele humana, os pesquisadores mostraram que, mesmo em concentrações muito baixas, a palitina pode absorver os raios nocivos do Sol e proteger a pele da radiação. Também mostraram, em laboratório, que esse aminoácido proveniente de algas marinhas é um poderoso antioxidante, podendo oferecer proteção à pele contra o estresse oxidativo. Essa reação química é responsável por danos celulares e pelo fotoenvelhecimento.

Segundo Lawrence, a exposição à radiação solar induz a altos níveis de estresse oxidativo, e os protetores atuais não oferecem esse tipo de proteção. “Nossos dados mostram que, com mais pesquisa e desenvolvimento, os protetores solares de origem marinha podem ser uma possível solução com impacto positivo significativo na saúde dos habitats marinhos e da vida selvagem, ao mesmo tempo em que fornecem uma blindagem ainda mais eficaz aos danos solares causados à pele humana”, enfatiza Antony Young, também autor do estudo.

Segundo Keila Pati, dermatologista do Hospital Santa Marta, em Brasília, a substância em teste pode inclusive facilitar os cuidados rotineiros com a pele. “Existem diversos antioxidantes derivados de produtos naturais que, se usados associados aos protetores solares, potencializam a ação anti-UV. Eles existem tanto na forma oral quanto na tópica. Mas, infelizmente, ainda não são usados como substitutos dos filtros solares habituais. Acredito que esse seja o caminho, como esse artigo propõe”, explica.

Para a médica, também é importante desenvolver protetores que beneficiem o maior número de pessoas possível. “É de suma importância o desenvolvimento desse tipo de produto, já que todas as formas de vida no nosso planeta estão interligadas, e algum desequilíbrio desses ecossistemas acaba afetando, mesmo que indiretamente, a nossa saúde e o nosso bem-estar. Além do desenvolvimento desses novos recursos, devemos buscar que eles venham ao consumidor a um valor acessível, além de conscientizar a população sobre a importância dessas novas ações, para que haja uma maior aderência de todos.” (VS)

Por uma transição segura

“A pele assume um papel primordial em nossa saúde, tanto por ser o maior órgão do corpo humano quanto por desempenhar funções cruciais, como a síntese de vitamina D, agir como uma barreira física e química para impedir a entrada de patógenos, além de regular a nossa temperatura. A condição de ser o órgão mais externo, a torna susceptível a agressões ambientais tanto da poluição quanto das radiações solares, da luz visível e do infravermelho, que culminam na piora do envelhecimento precoce. Os filtros solares antiultravioleta começaram a ser produzidos em escala industrial na década de 1970. Mas, com a clara mudança atual do mercado consumidor, que passou a preferir ingredientes naturais aos sintéticos, são imprescindíveis novos estudos sobre a efetividade clínica e as funções biológicas dos extratos naturais para que consigamos, de forma segura e científica, transitar para a fotoproteção tópica e oral com ativos naturais.” Patrícia Castro, dermatologista.

Fonte: Estado de Minas

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