Um estudo publicado na revista Philosophical Transactions of the Royal Society B revelou que os melhores cantores de iodel do mundo não são originários da Áustria ou Suíça, mas sim das florestas tropicais da América Latina.
O iodel é uma técnica vocal que consiste em alternar rapidamente entre notas graves e agudas, produzindo um som característico que lembra uma quebra de voz. A pesquisa, conduzida por especialistas da Anglia Ruskin University (ARU) e da Universidade de Viena, apresenta novos insights sobre os sons vocais de primatas não humanos e revela pela primeira vez como certos chamados são produzidos.
Os macacos possuem estruturas anatômicas especiais na garganta chamadas membranas vocais, que desapareceram dos humanos ao longo da evolução para permitir uma fala mais estável. No entanto, o benefício exato dessas membranas para os primatas era até então desconhecido.
O estudo descobriu que essas membranas vocais extremamente finas, localizadas acima das pregas vocais na laringe, permitem que os macacos introduzam “quebras vocais” em seus chamados. Essas quebras ocorrem quando a produção de som passa das pregas vocais para as membranas vocais, gerando transições rápidas de frequência semelhantes às do iodel, mas cobrindo uma faixa muito mais ampla.
A pesquisa envolveu análise de tomografias computadorizadas, simulações em computador e trabalho de campo no Santuário de Vida Selvagem La Senda Verde, na Bolívia. Os pesquisadores gravaram e estudaram os chamados de diversas espécies de primatas, como o bugio-preto-e-dourado (Alouatta caraya), o macaco-prego-de-tufos (Sapajus apella), o macaco-de-cheiro-de-cabeça-preta (Saimiri boliviensis) e o macaco-aranha-preto (Ateles chamek).
Os macacos do Novo Mundo, que habitam regiões que vão do México à Argentina, evoluíram para ter as maiores membranas vocais entre os primatas, indicando que essas finas faixas de tecido desempenham um papel fundamental na produção e diversidade dos chamados.
Os “ultra-iodels” produzidos por esses macacos podem apresentar saltos de frequência até cinco vezes maiores do que as mudanças possíveis na voz humana. Enquanto o iodel humano geralmente abrange uma oitava ou menos, os macacos do Novo Mundo são capazes de ultrapassar três oitavas musicais.
Segundo o Dr. Jacob Dunn, professor associado de Biologia Evolutiva da ARU, os resultados mostram como os macacos aproveitam uma característica evolutiva da laringe— a membrana vocal—para produzir uma variedade maior de chamados, incluindo os ultra-iodels. Isso pode ser especialmente importante para primatas com vidas sociais complexas que precisam se comunicar de maneiras variadas.
O Dr. Christian T. Herbst, da Universidade de Viena, acrescenta que a produção desses padrões vocais complexos está mais relacionada à anatomia da laringe do que ao controle neural sofisticado. Já o professor Tecumseh Fitch, especialista em evolução vocal humana, destaca que as membranas vocais estendem a faixa de tom dos macacos, mas também tornam sua voz mais instável—um traço perdido na evolução humana para garantir estabilidade na fala e no canto.
A pesquisa contou com a colaboração de especialistas da Universidade de Osaka e da Universidade Ritsumeikan, no Japão, do Instituto Real de Tecnologia KTH, na Suécia, e do Santuário de Vida Selvagem La Senda Verde, na Bolívia.
Fonte: Um Só Planeta