Até então, acreditava-se que os peixes mesopelágicos (de águas profundas) tinham pouca ou nenhuma contribuição no ciclo do carbono. Entretanto, um novo estudo lançou luz sobre essa teoria e provou que, na verdade, esses animais não só colaboram, como são cruciais para esse processo.
Os cientistas sabiam, até então, que os peixes de águas rasas excretam minerais carbonáticos — cristais de carbonato de cálcio. Esse processo, chamado de ictiocarbonato, ajuda os animais a equilibrar água e sal em seus corpos e, ao mesmo tempo, contribui para o ciclo do carbono no oceano.
Entretanto, nada se sabia sobre a contrinuição dos peixes de água profunda nesse processo — até agora. De acordo com o estudo, realizado por cientistas da Universidade de Miami e publicado no Journal of Experimental Biology, esses animais também expelem carbonato em quantidades semelhantes aos de águas rasas.
Para chegar a esse resultado, os cientistas focaram num tipo específico de peixe de águas profundas: o peixe-rosa de barriga preta (Helicolenus dactylopterus), que vive entre 350 e 430 metros de profundidade.
A espécie foi a escolhida pela sua capacidade de se adaptar ao clima de laboratório e por não possui bexiga natatória, fator que contribui para sua sobrevivência mesmo com a mudança brusca de pressão até a superfície.
Durante o experimento, os pesquisadores mantiveram os espécimes em um ambiente que replicava seu habitat natural. Logo, eles observaram que cada quilo de peixe liberava aproximadamente 5 miligramas de carbonato por hora — quantia muito semelhante à registrada nos animais de águas rasas.
Para Amanda Oehlert, coautora e professora assistente do Departamento de Geociências Marinhas, a pesquisa preenche uma lacuna fundamental na compreensão da química oceânica e do ciclo do carbono.
“Com os peixes mesopelágicos desempenhando um papel tão significativo, sua contribuição para o fluxo de carbonato — e como ele pode mudar com o aquecimento dos oceanos — merece maior atenção”, destacou Oehlert.
Ecos do experimento
O teste concluiu que nem a profundidade nem a pressão inibem a formação de ictiocarbonato. Além disso, os resultados reforçam as estimativas globais da produção de carbonato derivada de peixes, com os mesopelágicos sendo parte fundamental dessa cadeia.
Os cientistas também concluíram que a composição do ictiocarbonato expelido é semelhante, independentemente da profundidade em que se forma — o que influencia como e onde ele é armazenado ou dissolvido no oceano.
Os peixes que vivem na “zona crepuscular” do oceano — como o “cobaia” do estudo — (entre 200 e 1000 metros de profundidade) representam até 94% da biomassa global desses animais. Logo, se todos os peixes contribuem com a produção de carbonato, o impacto deles na química do oceano é gigantesco.
“Peixes mesopelágicos não são apenas presas; são engenheiros químicos do oceano”,apontou Martin Grosell, principal autor do estudo.
Além disso, os peixes profundos contribuem de forma tão significativa com o ciclo do carbono que ajudam os cientistas a aprimorar os modelos do sistema terrestre (uma espécie de programa de computador que simula interações complexas para prever o clima e entender como ele muda).
O que é o ciclo do carbono?
Por ironia do destino, os animais que eram negligenciados, na realidade, trabalham em prol do ciclo do carbono. Este processo, por sua vez, ocorre de maneira natural e descreve como o carbono — elemento essencial para a vida — se move entre a atmosfera, os oceanos, a terra e os seres vivos.
Trata-se de um ciclo biogeoquímico. Ou seja: um processo que garante a reciclagem do carbono, possibilitando que esse elemento interaja com o meio e com os seres vivos. Logo, o processo possibilita verificar como o carbono se movimenta pela atmosfera, litosfera, hidrosfera e biosfera.
No oceano, parte desse carbono é convertido em carbonatos, que são importantes para a formação de conchas e esqueletos de muitos animais marinhos.
Isso significa que a contribuição desses peixes para o estoque de carbono nos oceanos é muito maior do que se imaginava, e essa informação é vital para entender como nossos oceanos e o clima do planeta funcionam.
Fonte: Náutica