Invadida por ativistas no último dia 18, a unidade de São Roque do Instituto Royal, no interior de São Paulo, passou em março deste ano pela vistoria de um biólogo, a pedido do Ministério Público, que investiga denúncias de maus-tratos a cães no local.
Um dos objetivos foi analisar as condições dos animais usados durante as pesquisas científicas. O Portal R7 teve acesso com exclusividade ao relatório produzido pelo professor Sérgio Greif, co-autor do livro “A verdadeira face da experimentação animal: A sua saúde em perigo” e autor de “Alternativas ao uso de animais vivos na educação: pela ciência responsável”.
De acordo com o documento, um dos pontos considerados críticos pelo profissional foi o chamado “canil estoque”, para onde os filhotes de beagle eram enviados após o desmame. É nesse lugar em que eles aguardavam sua utilização nos procedimentos experimentais, em uma espécie de “biotério de cães”.
Na avaliação de Greif, as condições dos cachorros nesse local especificamente se mostraram “bastante inferiores” às encontradas naqueles que estavam no “canil maternidade” e “canil experimental”. Apesar de contarem com uma área de recreação, os animais, após recolhidos, eram colocados em gaiolas suspensas de 2,15 x 1,97 m ou 1,80 x 1,30, com quatro a cinco beagles, cada uma. Segundo o relatório, o odor de fezes e os latidos criavam “uma condição estressante e insalubre”.
“As gaiolas são colocadas a uma distância do chão, de modo a facilitar a limpeza, no entanto, por ocasião da inspeção, verificou-se que na sala onde estavam abrigados os machos o piso das gaiolas já se encontrava sujo de fezes e pisoteado pelos animais, e seria naquele local que os cães passariam a noite, ou seja, os cães necessariamente teriam de dormir sobre as próprias fezes”.
Ainda de acordo com o relatório, os beagles permaneciam no canil estoque entre três e quatro meses, dependendo do estágio de desenvolvimento dos filhotes exigido em protocolo experimental.
Apesar do problema, a instalação, de acordo com o biólogo, atendia às exigências da legislação vigente.
“Exceto pela ausência de dispositivos que evitem a propagação de ruídos incômodos e exalação de odores o canil estoque atende ao disposto nas alíneas VIII e XIII do artigo 6º do Decreto 40.400/95, no entanto, cabe aqui uma crítica à própria legislação, pois não há uma definição sobre quais dimensões são compatíveis com a espécie ou se as preocupações com os incômodos por ruídos e exalação de odores se aplicam ao bem-estar animal ou aos seres humanos que se encontrem além dos limites do empreendimento”.
Ainda sobre o canil estoque, nas considerações finais, Greif enfatizou que não havia “justificativa científica” para conter os cães em gaiolas suspensas por aquele período, uma vez que os cachorros não estavam sendo utilizados em procedimentos e não havia porque mantê-los com aquelas restrições.
“Considerando a impossibilidade de suspender permanentemente as atividades da instalação, uma medida imediata que deveria ser adotada visando ao menos amenizar o sofrimento dos animais seria a substituição do sistema adotado pelo canil estoque por um sistema semelhante ao adotado no canil experimental, onde os animais permanecem em baias mais espaçosas e em baixa densidade de indivíduos”.
Visita agendada
A vistoria realizada em 18 de março de 2013 se deu especificamente nos setores denominados pelo instituto como “canil maternidade”, “canil de estoque” e “canil experimental”. Foi elaborado um roteiro de visita fundamentado na Lei 11.794/08, no Decreto 40.400/95 e nas resoluções normativas aprovadas no Concea (Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal). Quarenta e seis perguntas foram feitas a funcionários do laboratório e o parecer técnico foi montado com base nas respostas fornecidas por eles e nas constatações visuais de Greif. Ele criticou o fato de a vistoria ter ocorrido após agendamento prévio “sendo portanto factível inferir que, dependendo da natureza da denúncia impetrada junto ao Ministério Público, a produção de prova material poderia ter sido prejudicada”.
Em entrevista, o biólogo Sérgio Greif comentou o relatório e ressaltou que, durante a vistoria, não acompanhou qualquer procedimento de pesquisa, o que, segundo ele, permitiu uma avaliação limitada e longe do ideal.
” Nesta vistoria em específico, é óbvio, eu não acompanhei procedimentos. Eu verifiquei a instalação. Esta pequena inserção que fiz é muito limitada”.
Greif, que no parecer técnico sugeriu que o instituto, quando não estivesse sendo vistoriado, “registrasse em vídeos o momento em que as inoculações são feitas, bem como o acompanhamento posterior dos animais em suas baias” e colocasse as imagens à disposição da sociedade, diz que, na verdade, o problema é inerente à própria experimentação.
” O problema que eu encontro ali [Instituto Royal] não é diferente de qualquer lugar onde há experimentos em animais. O problema é inerente à experimentação. Então, dentro do que ele se propõe a fazer e dentro da lei que nós temos, não consigo perceber nessa inspeção pontual alguma coisa errada que contrarie a lei que existe hoje. Mas moralmente, eticamente, vejo muitas coisas erradas. Você está forçando o animal a inalar, a ingerir ou injetando nele produtos que são sabidamente tóxicos, que vão prejudicá-lo”.
Fonte: R7