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Pablo Neruda: Cinco Cosas e Nada Más

10 de dezembro de 2009
4 min. de leitura
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O poeta chileno PABLO NERUDA nasceu Ricardo Neftali Reyes Basoalto, aos 12 de julho de 1904. Depois de vencer um concurso literário, ainda adolescente, adota o pseudônimo pelo qual se tornou conhecido vida afora. O restante de sua história está nos versos de: Crepusculario, Veinte Poemas de Amor e Una Canción Desesperada, Canto General, Estravagario, Cien Sonetos de Amor, Memorial de Isla Negra etc. Sua militância política, marcada pelo exílio voluntário na Europa, fez brotar nele a poesia social. Mas a trajetória de Neruda já estava toda ela impregnada pelo lirismo amoroso nascido junto ao mar:

“Amo o amor que se reparte em beijos, leito e pão.
Amor que pode ser eterno e pode ser fugaz.
Amor que quer se libertar para tornar a amar.”

A poesia de Pablo Neruda vem das forças da terra, uma presença única debruçada sobre o oceano de suas inquietações. Não se preocupava com a cultura ou a estética, porque seu conhecimento do mundo era, assim por dizer, intuitivo. Dizia-se um homem tranquilo, inimigo das leis, dos governos e das instituições estabelecidas. Sua verdadeira paixão era a natureza, que elegeu companheira desde a infância:

“A natureza me dava uma espécie de embriaguez. Eu teria uns dez anos, mas já era poeta. Não escrevia versos, mas me atraíam os pássaros, os escaravelhos, os ovos de perdiz. (…). Flores deslumbrantes, folhagens sombrias, misterioso silêncio, sons celestiais, mas também a vida dos homens além dos montes, além dos fetos, além da chuva.”

Dentre os animais, despertou-lhe especial interesse o gato. No livro Navegaciones y Regressos, Neruda dedica aos bichanos um singular poema, comparando-os a criaturas que já nasceram completas. Esta homenagem está na “Oda al Gato”:

“Não há unidade como ele,
Não tem a lua nem a flor tal contextura:
É uma coisa só como o sol ou o topázio,
E a elástica linha de seu contorno firme e sutil
É como a linha da proa de uma nave (…)
Oh pequeno imperador sem orbe, conquistador sem pátria,
Mínimo tigre de salão, nupcial sultão do céu de telhas eróticas,
O vento do amor na intempérie reclamas
Quando passas e pousas quatro pés delicados no solo
Cheirando,  desconfiando de todo o terrestre…”

E o quão difícil é eleger os versos mais belos de Pablo Neruda. Isso porque Neruda confunde-se com a própria poesia. Neruda é o poema em pessoa. Ele cantou o mar, a terra, o vento, a chuva, as estações, o amor despedaçado, ele cantou as estrelas e o infinito, as águas e os pássaros,  a fruta e a flor.  Cantou a alegria de viver e também a noite definitiva:

“Vejo as plantas, as pessoas vivas
As ramagens da lembrança, o cumprimento das coisas, a cauda de meu cão.
Vejo o silêncio da minha casa, aberto à minha voz
E não rompo as paredes com um grito de pedra ou de pistola:
Ando pelo terreno que conhece os meus pés,
Toco a trepadeira que subiu pelos arcos escuros de granito e resvalo nas coisas,
No ar, porque continua a minha sombra em outra parte,
Ou sou a sombra de um teimoso ausente.”

Talvez o poema que melhor traduza os sentimentos mais profundos do poeta  seja “Pido Silencio”. Se eu pudesse traduzi-lo livremente, recorrendo a algumas licenças poéticas – a começar pelo título –, ficaria assim:

CINCO COSAS

Quando um dia eu for embora
Quando então me despedir
Pedirei apenas silêncio
E mais cinco coisas
Minhas cinco verdades perfeitas
Cinco coisas e nada mais.

A primeira é o amor sem fim
Amor pelas pessoas
Pelas árvores pelas flores
Amor pelos animais.

A segunda é rever o outono
Com suas folhas sopradas
Sobre a terra à qual voltaremos.

A terceira é o inverno rigoroso
A chuva que amei, o calor do fogo
A aquecer nossas noites eternas.

Em quarto lugar, o verão ardente
Redonda fruta vermelha
Pairando sobre o meu paladar.

A última coisa que eu peço
São teus olhos, meu amor,
Não quero dormir sem os olhos teus
Não posso viver sem o teu olhar
Eu trocaria o sol da primavera
Para que continuasses me olhando.

Isso, enfim, o que mais quero
É quase nada e quase tudo.

Pablo Neruda faleceu em 1973, dois anos depois de receber o Prêmio Nobel de Literatura. Mas sua poesia jamais morrerá.

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