Uma ovelha chamada Kiki circula rapidamente pelo quintal de um santuário de animais em uma cadeira de rodas motorizada. Ela se locomove sozinha, inclinando um joystick com a cabeça para se mover para frente e para trás, para a esquerda e para a direita.
“Ela é como uma adolescente louca; ela quer ir muito rápido”, disse Deb Devlin, presidente do santuário Don’t Forget Us, Pet Us (Não Nos Esqueça, Faça Carinho em Nós) em North Dartmouth, Massachusetts (EUA).
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Kiki nasceu com mobilidade limitada e não consegue andar. Sua mãe contraiu o vírus Cache Valley durante a gravidez, o que fez com que Kiki nascesse com articulações fundidas e problemas na coluna.
Ao nascer, a mãe de Kiki a rejeitou e se recusou a amamentá-la, o que não é incomum quando um cordeiro está doente ou com deficiência. A fazenda onde Kiki nasceu não tinha recursos para cuidar dela e entrou em contato com o Don’t Forget Us, Pet Us para ver se eles poderiam ajudar. Devlin foi imediatamente, em dezembro de 2021, ver o cordeiro de 11 dias de vida.
“Quando a vi pela primeira vez, senti tanta pena dela”, disse Devlin, que co-fundou o santuário sem fins lucrativos em 2016. “Ela estava no colo desse senhor, enrolada em um cobertor, e estava tremendo.”
Kiki consegue sentir sensações do pescoço para baixo, embora não consiga se mover. Durante os primeiros meses de Kiki no santuário, Devlin e outros voluntários tentaram fisioterapia, tratamentos quiropráticos, terapia a laser e até mesmo cirurgia de liberação de tendões. Nada funcionou.
Foi quando Devlin percebeu: “Ela não estava quebrada”, ela disse. “Ela era perfeita.”
Em vez de tentar melhorar a mobilidade de Kiki, Devlin começou a se concentrar no que Kiki já conseguia fazer. Ela decidiu experimentar brinquedos como forma de enriquecimento.
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“Ela não pode simplesmente ficar sentada o dia todo sem fazer nada”, disse Devlin. “Você não pode pegar um animal assim e colocá-lo num estábulo 24 horas por dia.”
Ela conseguiu brinquedos infantis interativos, do tipo “aperte e toque”, e rapidamente notou que Kiki era capaz de operá-los usando a cabeça.
“Quando ela pegou o jeito com o brinquedo, ela pressionava os botões até chegar à sua música favorita, ‘Brilha, Brilha, Estrelinha’ (Twinkle, Twinkle)”, disse Devlin. “Ela parava e encostava a cabeça nele, olhava para cima e ouvia a música.”
Então Kiki começou a dançar.
@dontforgetuspetus Go Kiki, Go Kiki!!! Dance your heart out! Who else has a dancing animal? #dancechallenge #farmanimalrescue #farmanimalsanctuary #extraspecial #dancingtothebeat ♬ original sound – dontforgetuspetus
“Ela está sempre tentando sentir a vibração”, disse Devlin. “Dava para perceber que ela realmente gostava e ficava mesmerizada por isso.”
Vendo como Kiki controlava os brinquedos com facilidade, Devlin suspeitou que ela também poderia ser capaz de usar um joystick para se locomover. Devlin descreveu Kiki como “muito inteligente”.
“Eu sempre soube que ela seria capaz de fazer isso porque sabia que, no minuto em que eu colocasse aquele joystick perto dela, ela iria ver o que ele fazia”, disse Devlin.
Devlin e sua equipe de cinco voluntários experimentaram adaptar o carrinho de Kiki em algo que ela pudesse manobrar sozinha, mas eles tiveram dificuldades para chegar a um design.
“Tive dificuldade em encontrar alguém que me ajudasse a fazer algo para ela”, disse Devlin.
Depois de entrar em grupos de e-bike nas redes sociais para pedir conselhos, Devlin experimentou uma cadeira de rodas motorizada. Ela entrou em contato com a *Mobility Equipment Recyclers of New England* — uma loja de cadeiras de rodas em North Kingston, Rhode Island — e conseguiu uma cadeira motorizada para Kiki com a ajuda de doações.
Devlin então amarrou com abraçadeiras o corpo de um carrinho de carga à base da cadeira de rodas e reposicionou o joystick para que Kiki pudesse alcançá-lo com a cabeça. O resultado foi um carrinho que Kiki podia mover sozinha.
“Nós lhe demos a cadeira no dia 1º de julho, para dar início ao Mês do Orgulho da Pessoa com Deficiência (Disability Pride Month). Nós realmente celebramos isso aqui com nossos animais”, disse Devlin.
O santuário abriga cerca de 40 animais, incluindo porcos, vacas, galinhas, cavalos, patos e pombos — vários dos quais têm deficiências.
“Muitas vezes, quando trazemos animais que foram órfãos, ela é a mãe deles”, disse Devlin sobre Kiki. “Kiki nunca está sozinha. Ela tem um rebanho maravilhoso de necessidades especiais.”
Quando Kiki assumiu o controle da cadeira de rodas pela primeira vez, todos ficaram pasmos.
“Ela levou segundos para começar a dirigir”, disse Devlin. “É a melhor sensação vê-la fazendo isso. Ela é incrível, e eu nunca duvidei dela.”
Devlin disse que ficou claro que Kiki sabia o que estava fazendo.
“Ela conhece a causa e o efeito daquele joystick e sabe que é ela que está se movendo”, disse ela. “Na verdade, requer um certo esforço.”
Um vídeo que o santuário compartilhou nas redes sociais de Kiki dirigindo pelo quintal tornou-se viral, atraindo milhares de comentários.
“Todo mundo online a acha tão inspiradora”, disse Devlin. “A única coisa que realmente faltava para a Kiki era mobilidade independente, e agora ela a tem.”
Dos mais de 7.000 comentários em uma postagem do Facebook com o vídeo, Devlin disse que a maioria é positiva.
“Obrigado por se importar!! Ela merece viver”, escreveu alguém.
“Isso é absolutamente lindo e tão maravilhoso ver animais usando a tecnologia para ajudar com suas deficiências”, acrescentou outro. “Ela é muito inteligente.”
Ainda assim, alguns comentaristas questionaram sua qualidade de vida.
“Para mim, essas reações foram muito difíceis”, disse Devlin, explicando que Kiki faz check-ups regulares de bem-estar para garantir que não está com dor ou desconforto. Seus veterinários não sabem se a condição dela afetará sua expectativa de vida.
Devlin e outros voluntários do santuário dizem que continuam a inventar maneiras de manter Kiki engajada.
“Começamos a construir um mundo para ela onde ela pudesse ter sucesso e pudesse fazer coisas”, disse Devlin.
Kiki come e bebe, pasta, toma sol, faz música com um conjunto de sinos, assiste a desenhos da Disney, ouve Taylor Swift e até anda de caiaque. Ela dança, visita escolas e encontra crianças com deficiências, ajudando-as a se sentirem menos sozinhas.
“Quando as crianças são tão conscientes de algo que pode ser diferente nelas mesmas, e veem um animal como a Kiki, que tem tantas adversidades físicas, mas ainda assim a personalidade dela simplesmente brilha, isso coloca as coisas em perspectiva”, disse Ebony McGlynn, assistente social e terapeuta familiar que é voluntária no santuário.
De acordo com Devlin, Kiki se comunica claramente quando algo está errado, enrolando o lábio ou abanando o rabo de uma certa maneira.
“Ela entende muito bem minhas palavras, e isso é o que mais me impressiona”, disse Devlin.
Agora que Kiki pode dirigir sozinha, os voluntários disseram que ela desenvolveu um lado atrevido.
“Você diz para ela que é hora de parar e ela olha para você e vai embora dirigindo”, disse a voluntária Jess Bullock. “É hilário.”
Bullock disse que, apesar de seus desafios de mobilidade, Kiki parece uma garota muito feliz.
“Todos os dias, ela é tão cheia de alegria… Ela é um absoluto raio de sol”, disse Bullock. “Ela adora movimento e agitação.”
Devlin disse que a história de Kiki é uma de resiliência e esperança.
“Ela teve um impacto tão grande em tantas pessoas”, disse ela. “Todos são simplesmente tão cativados por Kiki e sua jornada.”
Traduzido de The Washington Post.