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Os animais nos programas de auditório e variedades – parte 2

7 de abril de 2011
6 min. de leitura
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Continuando a postagem passagem, esta também aborda a forma como os animais são retratados nos programas de auditório e variedades. A melhor forma de ilustrar é apresentando vídeos que exemplificam o tema estudado.

Vejamos o vídeo divulgado no dia 21 de outubro de 2010 no Caldeirão do Huck, no quadro Lata Velha, da Rede Globo de Televisão. Neste quadro é reformado o carro de alguém (que sempre possui uma história de superação, que ajudou outras pessoas etc.) e a pessoa tem que dançar ou cantar para recuperar o veículo.

No dia 21  foi mostrada a história de João, morador de Pirassununga, interior de São Paulo, que administra a ONG Todo Bicho. João possui uma Belina 1980 onde transporta diversos cães abandonados e ajuda outros do município. Ao todo são mais de 100 cachorros que são cuidados com o salário de vigilante de João e com a ajuda de amigos. Para recuperar o carro, o vigilante teve de cantar a música Maluco Beleza, de Raul Seixas.

Vale lembrar que o programa Caldeirão do Huck vai ao ar todos os sábados e possui atrações musicais, quadros de reconstrução de casas, de carros e também conta com plateia e as dançarinas. Todo esse conjunto de elementos ajuda no contexto emotivo explorado pelo programa.

No quadro Lata Velha não é diferente. Para começar o quadro, sempre é forjada uma história para assustar o participante. O apelo emotivo é conseguido, neste caso, com a invenção de que a força aérea precisaria dos cães que o João cuida para serem enviados ao espaço e consequentemente serem mortos. Obviamente depois de alguns instantes aparece Luciano Huck falando que é tudo mentira e a música We are the Champions ecoa pelo vídeo.

João se emociona, chora contando as dificuldades que enfrenta como protetor dos animais. Este apelo é muito utilizado já que as pessoas que se identificaram com João também vão se emocionar e continuar assistindo ao programa. A parte a ser analisada começa no momento em que o carro é desmontado para a reforma. Alguns estereótipos são utilizados neste momento. Primeiro é a escolha da música e quem canta: eu não sou cachorro não, por Falcão (obs.: cantada em inglês). A música começa com as frases: “eu não sou cachorro, não pra viver tão humilhado. Eu não sou cachorro, não para ser tão desprezado”. Enquanto a cantoria continua, o desmanche do carro segue em frente e os funcionários que realizam a desmontagem entram no ritmo e realizam coreografias como se fossem cães indo atrás das mulheres que estão com o cantor.

Existem outras músicas que poderiam ser escolhidas. Esta música faz referência a que os cães são humilhados e desprezados. No caso dos animais abandonados isso pode ser verdade, mas no caso específico dos animais que são cuidados pela ONG estes são bem tratados. Como o programa faz parte da categoria entretenimento ele deve possuir elementos que criem essa diversão para o público. No entanto, essa diversão poderia se dar pela escolha de outros itens. As mensagens são passadas novamente de maneira despercebida.

Outro momento a ser destacado é na entrega do carro após João interpretar Raul Seixas. A iniciativa do programa foi de suma importância para a ONG e para as ONGs do país já que deu maior visibilidade a esse trabalho. Um pequeno detalhe na montagem do carro é interessante comentar. O estofado é branco e de pelúcia. Quem montou o automóvel não se deu conta que é um carro de ONG e que a cor branca não é uma boa opção de estofado já que diversos cães passarão diariamente pelo carro. Além disso, os recursos utilizados para divulgar esse trabalho também caem no senso comum, como por exemplo, o apresentador falar, já no final do programa, que no país existem diversas ONGs que recolhem animais. Com este mesmo conceito, diversas pessoas abandonam animais em frente à sede de ONGs ou na casa de protetores. Vale lembrar que este não é o objetivo das ONGs, mas sim o de ajudar e tentar melhorar a situação dos animais enquanto o poder público (que seria função dele) não o faz.

No final do quadro alguns animais para a adoção são trazidos para o palco. Atitude muito importante por parte do programa, no entanto alguns itens deveriam ser modificados como a altura do som, o efeito de fumaça e as luzes que o próprio apresentador comenta sobre os cães estarem assustados.

Neste momento, outro fator chama a atenção: as dançarinas seminuas estão segurando os cães. O que chama mais a atenção: as mulheres ou a atitude de trazer ao palco animais para serem adotados? Isso depende do telespectador que está assistindo, como foi mostrado anteriormente o telespectador não é uma tabula rasa e não recebe as mensagens de forma igual. Ferrés (1998) afirma que quem decifra as mensagens é o inconsciente que também analisa as informações pelo pensamento primário. O pensamento primário reage com a sedução. Por sua vez a sedução domina as emoções adormecendo a realidade e ativa o pensamento primário que vai organizar as percepções daquela realidade que foi criada.

Novamente esta análise ressalta que a divulgação no quadro do trabalho de um protetor foi de suma importância, no entanto, existem itens que precisam ser melhor detalhados para compreender onde há as mensagens despercebidas neste quadro. É necessário compreender estas informações, pois elas passam de forma discreta e podem também influenciar a opinião dos telespectadores com informações equivocadas. Não são todos que assistem à televisão e acreditam fielmente no que o veículo divulga. No entanto, há uma parte da sociedade que, por não possuir opinião formada sobre determinado assunto, absorve aquela informação e afirma ser verdade porque a televisão mostrou.

Todo o conjunto: mulheres seminuas dançando, a utilização de apelo emocional, a escolha da música cantada por Falcão e a constante repetição do apresentador de que ONG recolhe animais aparecem no vídeo em pequenos instantes, mas possuem grande significado quando estes elementos são analisados de forma conjunta. Os estereótipos utilizados e o apelo emocional utilizado resultam na forma como os animais são vistos pela sociedade. Grande parte das pessoas veem os animais como seres inferiores e, por isso, os diversos problemas (como já citado anteriormente) de abandono e maus-tratos.

Outro vídeo postado no site do Caldeirão do Huck mostra a entrega da Belina e a repercussão que o aparecimento no programa rendeu à ONG: todos os animais que estiveram no palco foram doados e os telefones não paravam de tocar em busca de animais para adotar.

Além dos diversos benefícios que João ganhou participando do quadro Lata Velha (como a reforma do veículo, seguro para o carro, doação em dinheiro…) a ONG também ganhou mais divulgação e o trabalho foi transmitido para todo o país. A televisão tem esse poder: ela fascina pela proximidade que traz entre os diversos locais do globo e o telespectador. Além disso, o meio televisivo não tem o objetivo de questionar as atitudes do telespectador para com as informações que estão sendo divulgadas, mas apenas de fazer o público sonhar e viver aquele sonho que está sendo veiculado.

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