O poodle Billy era um cão de 4 anos que, todos os dias, costumava dar uma volta pelo bairro onde morava e, meia hora depois, estava de volta em casa. No mês passado, ele saiu sozinho para um passeio e nunca mais foi visto, para desespero de seus tutores, o representante comercial Cláudio Lagrotta, 39 anos e Sílvia Lanza Lagrotta, 41 anos.
Ambos enfrentam uma situação que tem se tornado bastante comum em Bauru, deixando famílias inteiras em profunda tristeza. Embora não haja estatísticas oficiais, o número elevado de cachorros de raça desaparecidos assusta e tem levado até mesmo as organizações de proteção animal a acreditar em uma possível onda de furtos na cidade.
“É um movimento que a gente tem percebido com maior intensidade nos últimos cinco anos, com a popularização das raças importadas. E o pior é que muitos deles estão desaparecendo de dentro das casas. O tutor sai para trabalhar e, quando volta, já não encontra mais o animal no quintal ou na varanda”, observa José Hermann Schroeder, diretor jurídico da ONG Naturae Vitae.
Na maioria dos casos, os cães que somem são de pequeno porte, com maior incidência nas raças poodle, shitzu e beagle. “Os pequenos são mais fáceis de transportar e de passarem despercebidos. Quanto mais dócil for a personalidade do animal, mais vulnerável à aproximação de estranhos ele será”, analisa Damair Pereira de Almeida, delegada da Sociedade de Proteção Animal Mountarat.
Alguns destes cachorros de raça podem custar mais de R$ 3 mil, mas, segundo a suspeita das ONGs, são furtados para serem vendidos por muito menos do que isso. A hipótese considerada é de que estejam sendo levados por usuários de drogas ou proprietários de canis clandestinos para serem revendidos a conhecidos ou em feiras e estabelecimentos específicos.
“É possível também que, em alguns casos, a pessoa furte para ficar com o cachorro para si. Mas, qualquer que seja o motivo, é extremamente difícil o tutor conseguir reaver o animal”, considera Damair, que diz não existir regiões específicas em Bauru onde os animais desapareçam com maior frequência.
Na esperança de reencontrá-los, os tutores costumam afixar cartazes nos estabelecimentos da vizinhança, procurá-los nos bairros adjacentes ou no Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) e até anunciar o sumiço nos meios de comunicação da cidade. Cláudio e Sílvia, por exemplo, gastaram quase R$ 1 mil para tentar localizar Billy, sem sucesso até o momento.
“Acionamos a TV, as rádios e os jornais. Conversando com os vizinhos, ficamos sabendo que, no bairro (Higienópolis), vários moradores já perderam cachorros, a maioria poodles, porque haveria uma pessoa levando todos embora. Mas ainda estamos tentando descobrir”, conta Cláudio.
Meios próprios
Segundo Schroeder, a iniciativa de procurar cães perdidos por meios próprios é tradicional entre os tutres, que não costumam registrar boletim de ocorrência por não acreditar que a polícia poderia mobilizar equipes para investigar o sumiço. “E, de uma certa forma, as pessoas também imaginam que, se não tratarem do assunto como uma ocorrência policial, será mais fácil sensibilizar a pessoa que levou o animal a devolvê-lo. Mas isso só ocorre se houver oferta de uma recompensa em dinheiro”, afirma.
De fato, segundo confirma o delegado Dinair José da Silva, titular do Distrito Policial (DP) de Crimes Ambientais, o número de registros em Bauru é próximo do zero. “Extraoficialmente, sabemos que perda de animais ocorre muito, mas os tutores não registram queixa nem mesmo do desaparecimento. Boletim de ocorrência de furto é algo mais incomum ainda”, pontua. E, sem a reclamação, fica difícil a polícia atuar.
Para Damair, a subnotificação dos furtos também está atrelada à dificuldade dos proprietários em provar que o crime ocorreu. “Eles sabem que o animal desapareceu de dentro de casa, mas cachorro não tem identificação, então fica difícil configurar o furto. O ponto de partida e as pistas para são bastante restritos, então os donos nem pensam em chamar a polícia.”
Desova de animais
Em matéria publicada em setembro, o JC expôs o problema da destinação de animais mortos em Bauru, quando moradores da Quinta da Bela Olinda revelaram que muitas carcaças estavam sendo desovadas em terrenos baldios do bairro.
Mas, ao que parece, até mesmo animais doentes estão sendo abandonados no local, conforme relato do representante comercial Cláudio Lagrotta, 39 anos, que chegou a ir até bairro para tentar encontrar seu poodle Billy, desaparecido desde o mês passado. “Uma moradora me contou que, lá, são deixados cachorros com leishmaniose e outras doenças incuráveis, além de animais mortos serem descartados em um lixão. Eu mesmo vi muitos cães soltos pela rua, que pareciam sem dono. Certamente foram abandonados”, afirma.
Cão é achado em canil clandestino
Uma moradora de Bauru, que preferiu não se identificar, viveu uma situação extrema ao ter seu cão furtado por duas vezes seguidas. Ela chegou a descobrir a identidade da mulher que levou o animal, chamou a polícia, mas acabou desistindo de reavê-lo por medo de sofrer represálias.
Charlie era um lhasa apso de 3 anos. Na primeira vez em que desapareceu, há dois anos, havia saído para dar uma volta no bairro onde morava, a Vila Cardia. A tutora afixou cartazes em toda a vizinhança, mas, no dia seguinte, todos eles haviam sido retirados.
“Então, comecei a desconfiar que quem o tinha levado era alguém que morava muito próximo da minha casa. Poucos dias depois, uma pessoa disse que tinha visto um cachorro parecido na casa de uma mulher. Fui até lá com a polícia e era ele”, relembra.
Conforme lembra a proprietária de Charlie, o imóvel funcionava como um canil clandestino e a moradora já seria conhecida do meio policial. “Havia mais de 10 cachorros de raça na casa, que a mulher furtava e vendia. Quando chegamos, ela ficou muito brava, mas peguei o cachorro de volta e fui embora”, conta.
Poucos meses depois, Charlie desapareceu novamente, desta vez de dentro do quintal da casa de sua dona. Com medo de que sua família fosse ameaçada, a tutora decidiu desistir do animal. Nada aconteceu, até hoje, com a mulher que o furtou o cão.
Proteção dos animais vai de microchip até as coleiras com identificação
Segundo informações das ONGs consultadas pela reportagem, na maioria das vezes os cães são furtados de dentro dos quintais das residências. Portanto, o indicado é que a casa seja protegida com cercas e muros altos para dificultar a entrada de estranhos.
Já o animal deve possuir coleira de identificação e microchip, que custa de R$ 70,00 a R$ 100,00, já aplicado. “A coleira é um recurso simples, mas ajuda muito quando o cão se perde. Se alguém encontrá-lo, será mais fácil localizar o tutora. Já o microchip ajuda o tutor a provar que aquele animal é seu, caso o animal seja localizado com outra pessoa”, observa Beatriz Schuler, presidente da ONG Vida Digna.
De acordo com ela, com a aproximação das festas de final de ano, a presença da coleira se faz ainda mais necessária, já que a fuga de animais se torna mais frequente por conta do barulho dos rojões. Para tentar protegê-los dos fogos de artifício, ela orienta os proprietários a deixar os cães em local protegido de ruídos.
“A pessoa também deve se certificar de que o cachorro não tenha como fugir de casa, seja por uma fresta no portão ou por um muro baixo. O ideal é que, neste momento de estresse, o animal tenha a companhia de seu tutor”, recomenda.
Fonte: Jornal A Cidade