Por iniciativa do Sr. José Truda Palazzo Jr., do Centro de Conservação Cetácea – Brasil, 31 organizações da sociedade civil (relacionadas abaixo), nas quais se inclui o Instituto Ecológico Aqualung, divulgaram ontem uma Carta Aberta ao representante do Brasil junto à Comissão Internacional da Baleia (CIB), o diplomata Fábio Vaz Pitaluga, exigindo um posicionamento forte contra a continuidade da matança de baleias na Antártida, que apesar da moratória estabelecida pela Comissão em 1986 e da declaração de um Santuário Antártico de Baleias em 1994, está em franca escalada sob o pretexto de “captura científica”.
Apesar da frequente condenação da maioria dos países da CIB, o Japão recusa-se a parar com a matança. O Brasil integra um pequeno grupo de negociação que tem se reunido há varios meses a portas fechadas e que, em tese, busca uma saída para acabar com a matança (mas informações obtidas pelos ambientalistas dão conta de que, frente à intransigência do Japão, a Comissão poderia aceitar a continuidade da caça antártica).
Segundo José Truda Palazzo Jr, ex-vice-comissário do Brasil à CIB e atual presidente do Conselho Superior da Rede Marinho-Costeira e Hídrica do Brasil, “isso é um absurdo total”.
Truda, que é o brasileiro com mais longa participação nas atividades da Comissão, afirmou que “aceitar os termos do Japão e legitimar a continuidade da caça na Antártida vai contra tudo o que o Brasil sempre defendeu na conservação dos cetáceos, em particular o direito dos países do hemisfério sul ao uso não letal destes animais por meio do turismo de observação, que pode ser seriamente afetado pelo roubo de nossas baleias pela indústria baleeira japonesa. Precisamos pôr um fim a esse crime e esperamos que nossos diplomatas mantenham a posição firme que fez do Brasil uma liderança positiva na CIB”.
Truda acrescentou também que a atividade baleeira do Japão não atende nem a verdadeiros interesses científicos nem a alguma necessidade alimentar da população daquele país, mas sim ao interesse político da JFA, a agência de pesca japonesa, em manobrar subsídios da ordem de milhões de dólares que mantêm as atividades baleeiras mesmo na ausência de um mercado interessado na carne.
O “grupo secreto” de negociação da CIB do qual o Brasil participa deverá se reunir novamente no final de janeiro no Havaí para mais uma rodada de negociação com o Japão.
Abaixo, o texto da Carta Aberta das ONGs ao Comissário do Brasil na CIB, Ministro Fábio Vaz Pitaluga.
MD. Comissário do Brasil à Comissão Internacional da Baleia
13 de janeiro de 2010
Senhor Comissário,
Cumprimentando-o, as 31 instituições signatárias da presente Carta Aberta desejam expressar sua preocupação com a situação corrente da caça à baleia no hemisfério sul e oferecer considerações referentes ao posicionamento do Brasil enquanto membro ativo das negociações a portas fechadas com o Japão e outros países ora em curso, e que deverão ter continuidade ainda este mês.
A continuação, de parte do Japão, do abuso flagrante do Artigo VIII da Convenção Baleeira de 1946 (que cria a brecha da famigerada caça “científica”) e a continuada violação do Santuário de Baleias do Oceano Austral estão levando não apenas aos atos de violência desmedida como os recentemente registrados na Antártida, com grave ameaça à vida humana e ao ambiente antártico, mas também ao crescente descrédito tanto da CIB como do próprio processo negocial. Cada vez mais se evidencia não apenas o desinteresse do Japão por uma solução diplomática, mas ainda sua atuação firme no sentido de consolidar a inaceitável apropriação dos recursos representados pelos cetáceos do hemisfério sul de maneira unilateral e arbitrária.
O Brasil, que ao longo das últimas duas décadas, construiu uma política de liderança internacional na conservação dos cetáceos, tanto na CIB como em outros foros, teve também participação proativa e de boa fé em todo o curso do processo de negociação visando encontrar um futuro comum para a CIB, no qual, como condição sine qua non para a acomodação de posições, a truculência dos atos unilaterais, em especial no que tange à caça dita “científica” e à violação de Santuários, fosse abandonada. Para tanto, foram oferecidas ao Japão e demais interessados condições extraordinárias de tolerância para com esses atos deploráveis. A tolerância, o diálogo e a distensão, que levaram inter alia a um enfraquecimento da posição brasileira e regional, ao não se condenar aberta e firmemente a caça antártica nesta temporada, não estão produzindo quaisquer resultados que se possam considerar aceitáveis. É absolutamente inconcebível que o investimento diplomático feito pelo Brasil e demais países pró-conservação resulte em um acordo que legitime, sob qualquer pretexto, a continuidade da matança de baleias no hemisfério sul.
Uma suposta “redução global” do número de baleias caçadas no presente, sem a garantia do fim da matança antártica e de salvaguardas legais e obrigatórias que restrinjam efetivamente a caça em águas de outras regiões, consiste tão somente em arreglo político que não interessa nem às baleias, nem aos países como o Brasil, onde as garantias para o uso não-letal dos cetáceos no futuro são a chave da gestão adequada do “recurso cetáceos”. Permitir a continuidade da matança pelágica agora é abrir as portas para ameaças diretas a nossos interesses regionais no futuro, e a oferta de um “santuário temporário” no Atlântico Sul como atualmente em negociação, ao mesmo tempo em que o Japão segue violando o Santuário Antártico, não serve como compensação aceitável.
Solicitamos, portanto, a Vossa Senhoria, consoante a política brasileira consolidada a favor da conservação dos cetáceos na CIB, NÃO APOIAR, já seja nas negociações secretas nas próximas semanas, na reunião do “Small Working Group” em março próximo ou na próxima Reunião Anual da CIB, quaisquer propostas e/ou iniciativas que não contemplem a CESSAÇÃO DAS ATIVIDADES DE CAÇA À BALEIA NO HEMISFÉRIO SUL.
Da mesma forma, solicitamos que o Brasil se posicione contrário à continuação de um processo secreto de negociação, que viola de forma flagrante os princípios de transparência e “accountability” esperados tanto de um organismo multilateral como dos funcionários de governo que ao mesmo assistem. O Brasil não pode correr o risco de transformar-se, por ação ou omissão, em cúmplice da legitimação da continuidade da matança de baleias em águas internacionais. Confiamos em que a delegação brasileira levará em consideração os comentários supra e atuará de forma a honrar nosso histórico, duramente construído, de liderança conservacionista nesta Comissão que clama por modernidade e não por retrocesso.
Atenciosamente,
Agência Costeira
Associação Brasileira de Proteção Ambiental
Associação Caatinga
Centro de Conservação Cetácea – Brasil
Centro de Estudos do Mar Onda Azul
Centro Golfinho Rotador
Conservação Internacional
Ecosul
Fundação Brasil Cidadão
Global Garbage – Projeto Lixo Marinho
Greenpeace
Grupo Ambientalista da Bahia
Instituto Amigos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica
Instituto Ecológico Aqualung
Instituto Baía de Guanabara
Instituto Baleia Jubarte
Instituto Justiça Ambiental
Instituto Mamíferos Aquáticos
Instituto Maramar
Instituto Peabiru
Instituto Sea Shepherd Brasil – Guardiões Do Mar
Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais
Rede de ONGs da Mata Atlântica
Movimento Ambiental Os Verdes de Tapes
Organização Sócio-Ambiental Pró-Mar
Projeto Mira-Serra
Rede Brasileira De Informação Ambiental – Rebia
Rede Costeiro-Marinha e Hídrica do Brasil
Sociedade Mundial de Proteção Animal – WSPA
Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – SPVS
Sócios da Natureza